São Paulo, domingo, 10 de maio de 2009

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DETECTOR DE LIXO

17 de abril de 2009
Prezado Steven,

Que tal olharmos mais de perto o seu negócio, o Outside.in, e ver se funciona como substituto do jornalismo profissional.
Vejo que, quando você lançou o Outside.in, em outubro de 2006, empregou o mesmo exemplo do projeto Atlantic Yards. Dois anos e meio já se passaram, e tenho certeza de que você já deve ter outro. Mas qualquer pessoa que navegue por seu site verá que ele não faz reportagem investigativa.
Pelo que pude apreender, ele não faz nenhum trabalho de reportagem próprio. Ele agrega o que aparece em outros lugares.
Não parece haver nenhum critério de relevância ou importância. E, se o que aparece em outros lugares é lixo, o site ajuda a difundir esse lixo, pois, por sua própria natureza, um site de notícias automatizado não possui o que tem todo bom editor: um detector de lixo.
Você se refere a um blog chamado Atlantic Yards Report como uma das fontes chaves das notícias sobre o Brooklyn publicadas no Outside.in.
Chequei essa informação com o editor do Report, Norman Oder. Eis o que ele disse em resposta à pergunta de se o Outside.in faz qualquer trabalho de reportagem ou exerce qualquer seleção editorial:
"O Outside.in não "cobre" o Atlantic Yards e, a meu ver, não exerce virtualmente nenhum impacto sobre a discussão local. Ele apenas agrega uma multidão de cobertura noticiosa e de blogs, pegando carona especialmente no meu blog e no portal NoLandGrab.org."
É claro que você não paga Oder ou qualquer outra pessoa pelo uso de seu trabalho. Isso pode ser um bom modelo econômico. Mas, se é um modelo para resolver os problemas do jornalismo, já é outra história.
Você diz que eu "quero agir para preservar um modelo de jornalismo impresso".
Mas, como deixei claro num artigo recente, "Adeus à Era dos Jornais" [publicado em 4/3 na "New Republic"], precisamos buscar novas formas de jornalismo adaptadas às exigências de um ambiente digital, aproveitando plenamente as vantagens deste.
O problema é que o tipo de inovação que você está promovendo não responde com eficácia ao problema triplo que mencionei: financiar o jornalismo de serviço público, engajar o público e gerar responsabilidade política.

Desinformação
Sites como o seu, que tiram notícias, comentários -e lucros- da web, dependem inteiramente de que outros paguem pelo trabalho original de reportagem. Alguns blogueiros podem dar furos ocasionais, mas fazer de conta que possuem a capacidade de um grande jornal metropolitano é enganoso.
Um site que tira notícias de outros lugares pode ampliar o público do material que coleta, mas, se engaja o público, isso acontece porque outros estão fazendo o trabalho.
Engajar o público requer que se identifiquem os acontecimentos e apontem seu sentido, e não apenas que se reproduzam informações (e desinformações) isoladas.
Enfim, criar responsabilidade política efetiva requer um poder compensatório da imprensa que um site que tira notícias de outras fontes não terá.
Para resolver esse problema serão necessários novos investimentos em jornalismo por parte de organizações sem fins lucrativos, novos modelos econômicos que financiem o jornalismo e novas políticas públicas que permitam a organizações noticiosas captar uma parte maior da receita do bem público que produzem.
E, já que estamos falando em receita, que tal pagar a Norman Oder e outros pelo trabalho que você vem divulgando como se fosse a contribuição de seu próprio site ao debate público?
Paul


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