São Paulo, domingo, 10 de setembro de 2000

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trecho

Manuel Bandeira dizia que, se fizessem no Brasil, como fizeram na França, um concurso para apurar o mais belo verso da nossa língua, talvez votasse naquele em que diz Orestes Barbosa: "Tu pisavas os astros distraída".
Andou por aqui um diplomata panamenho, Roque Javier Laurenza, que cultuava religiosamente a poesia universal. Sérgio Porto contava que ia com ele pela avenida Atlântica, rumo a uma média com pão e manteiga, distraído e feliz, cantarolando o "Chão de Estrelas". Em dado momento, o panamenho o agarrou pelo braço: "Por Dios! Repite lo que cantaste. Repete o que cantaste para eu saber se é mesmo verdade o que ouvi". Sérgio repetiu: "Tu pisavas os astros distraída". Ali mesmo Roque Laurenza jurou que acabara de ouvir o verso mais lindo da poesia brasileira.
As quatro sextilhas de "Chão de Estrelas" talvez contenham pelo menos 23 dos versos mais bonitos do nosso cancioneiro popular. Pois infelizmente o 24º decassílabo desse poema desafina bastante dos outros. "É a cabrocha, o luar e o violão" é um anticlímax depois do palco iluminado, dos guizos falsos da alegria, do chão salpicado de estrelas e das cintilações poéticas do poema de Orestes. Até a melodia se ressente e perde o embalo no verso final. Mas, sem dúvida nenhuma, Orestes Barbosa e Noel Rosa são os mais altos poetas da nossa música popular.


Trecho de "Os Mais Belos Versos da MPB", crônica de Paulo Mendes Campos incluída em "Brasil Brasileiro".


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