São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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LITERATURA

por Moacyr Scliar

1. Mais do que nunca a síntese é bem-vinda: vivemos uma época de tempo escasso, na qual a atenção das pessoas é disputada por todos que têm algo a dizer ou a mostrar, e que não são poucos. Numa época assim, o romance-rio do passado, aquele catatau de mil páginas, não está com nada.

2. A chatice é crime, punível com a pena capital. É pior ser chato que ser medíocre, ainda que as duas condições não raro se combinem, para desgraça do leitor.

3. Humor é ótimo. Passou a época em que sisudez era sinônimo de qualidade. O sorriso do leitor equivale a um aplauso. A uma premiação.

4. Diferente do cinema, a literatura é uma coisa antiga, onde quase tudo já foi tentado. Experimentalismo é, portanto, uma faca de dois gumes. Não basta ser experimental, é preciso ser muito bom no que se está experimentando. Na literatura, como no laboratório, a maioria das experiências não dá em nada.

5. Certos estilos estavam demasiadamente ligados a uma determinada conjuntura para poderem sobreviver. Foi o caso do realismo socialista, do "nouveau roman" e até mesmo do realismo mágico. Inevitavelmente datados. Também foi o caso, mas em outro contexto, da ficção científica. Uma das vantagens das viagens espaciais (talvez a única) foi acabar com os homenzinhos verdes.

6. A época é de narcisismo desvairado, mas a palavra "eu" continua sendo das mais perigosas em literatura. Usa-se cada vez mais, e nada impede que seja usada, mas esse "eu" tem de, ao longo do texto, mostrar seu valor.

7. Outros gêneros estão disputando lugar com a ficção. No passado, o "roman à clef", inspirado em alguma figura da vida real, era muito prestigiado. Hoje, há biografias que os leitores lêem salivando: são titilantes, não hesitam em escandalizar ou em chocar e, como é o seu propósito, fazem sucesso.

8. Os séculos passam, mas a regra se consolida: boa ficção é aquela que conta, com arte, com emoção e com sabedoria, uma boa história.

Moacyr Scliar é escritor, autor de, entre outros, "A Majestade do Xingu" (Companhia das Letras).



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