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PONTO DE FUGA
Maria, a sanguinária
JORGE COLI
em Nova York
A "Fosca", de Carlos Gomes
(1836-1896), na sua estréia, teve um público indiferente e
uma crítica que reconhecia os
grandes méritos dessa música
notável. "Salvator Rosa" atingiu um triunfo unânime, estrepitoso, em todos os jornais e
platéias da Itália. "Maria Tudor" obteve uma outra, triste,
unanimidade: um completo
fracasso. Os críticos da época
interrogavam-se, perplexos,
sobre o que teria levado o compositor brasileiro a enganar-se
tanto nessa nova obra. Eles sabiam do que falavam: "Maria
Tudor" inicia-se de modo
muito elevado e termina esplendidamente. Mas, entre esses dois extremos, há muita
travessia de árido deserto, em
que a inspiração falha, as fórmulas banais predominam e o
resultado é laborioso. Deve-se
saudar, por isso, a coragem do
projeto Carlos Gomes, levado
adiante pelo banco Sudameris,
em escolher, depois de "Il
Guarany" e de "Fosca", esta
malsinada "Maria Tudor",
para ser montada, gravada em
vídeo e em CD. Com seus defeitos, a ópera traz um fortíssimo
papel feminino, interpretado
de modo eletrizante por Eliane
Coelho, e, com suas falhas,
muita excelente música. A regência de Luiz Fernando Malheiro é iluminadora, ardente,
sabendo evitar os escolhos
mais graves, dominando as
nuanças e o sentido geral, e
afirmando-o naquilo que ele é,
um grande maestro, de primeira água. "Maria Tudor" faz
esperar, com mais ansiedade, a
sequência do projeto, que deverá trazer a música maior de
"Salvator Rosa" e do "Schiavo".
SENÕES - O projeto Carlos
Gomes, do banco Sudameris,
ao qual veio se atrelar a Funarte, é inestimável. Ele está permitindo que a obra de Carlos
Gomes seja dignamente registrada no som e na imagem. É
um fato essencial para sair das
louvações supérfluas e inúteis,
que sempre cercaram o compositor, e ir ao que interessa:
sua música. A parceria com a
Funarte permite que instituições públicas tenham acesso a
esse material, uma evidente
boa coisa. Mas o projeto foi
concebido como fazem as
grandes empresas: um brinde,
de qualidade cultural elevada,
para seus clientes melhores. Isso exclui a grande maioria dos
realmente interessados pela
música de Gomes. Mais ainda,
como os CD não vão para o comércio, eles também não são
distribuídos no exterior, o que
é lamentável para a divulgação
dessa obra. Um outro ponto:
com o CD, vem o libreto italiano de "Maria Tudor", acompanhado por uma "tradução"
que conhece pouco de italiano
e ignora bastante o português.
Há também versões em inglês e
em espanhol que não partiram
do original, mas do "português" disparatado. Um pouco
de cuidado poderia evitar essa
nota desafinada.
TÉDIO - A "Metropolitan Opera House", de Nova York, quase
todos os dias oferece um espetáculo. O nível é alto, está claro, mas
há, por vezes, um inevitável tom
de rotina. Regências sem empenho, cantores que perderam a voz,
e a música mais exaltada se transforma em bocejo. A atual "Aida",
cuja produção é imensamente
kitsch, reuniu um elenco da mais
espantosa mediocridade. Salvou-se Placido Domingo, como
maestro, ao recuperar, como pôde, as grandiosas belezas criadas
por Verdi.
ASCENSÃO - Rebecca Evans
nasceu no País de Gales. Jovem
soprano, veio a Nova York
cantar o pequeno papel de Sophie no atual "Werther",
apresentado na "Met". Deu
também um recital de melodias, em que interpretou Purcell, Mozart, Ravel, Respighi e
canções de seu país. Terminou
de gravar um CD. No recital,
sua voz revelou-se plenamente, matizada, mas poderosa,
dominada por emotiva musicalidade. Faz pensar em Bidú
Sayão, com um timbre mais
dourado e mais mordente.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli20@hotmail.com
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