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+(L)ivros
Armação ilimitada
"Histórias
de Vodu"
discute
as teorias
conspiratórias,
como
a morte de JFK
AMOL RAJAN
Amaioria dos estudiosos de história
sabe que o futuro
não existe; existem
futuros, no plural, e
a tarefa do historiador é estudar o ontem, compará-lo ao hoje e, assim, chegar a uma descrição plausível do amanhã.
Os acontecimentos nem
sempre são determinados, no
sentido mais amplo do termo.
As coisas acontecem, simplesmente. A vida é aleatória e
injusta, e ninguém controla seu
destino por inteiro. Não apenas
você pode ser atropelado por
um ônibus amanhã como o fato
pode ser essa coisa tão pouco
em voga: um acidente.
Essa perspectiva é inaceitável, não apenas para algumas
pessoas, mas para a maioria de
nós, fato que ajuda a explicar a
força duradoura das crenças
religiosas em sociedades cada
vez mais dependentes do conhecimento científico.
O anseio por sentido nos domina, e por isso inventamos relações entre fatos que, na realidade, não estão interligados.
É essa, pelo menos, a abordagem adotada pelo teórico da
conspiração. As teorias conspiratórias são presença constante na cultura ocidental há séculos, mas no século 20 elas floresceram como nunca.
O maior dos méritos de
"Voodoo Histories", de David
Aaronovitch [Histórias de Vodu, Jonathan Cape, 368 págs.,
17,99, R$ 57], baseado em argumentos forenses e tendo como subtítulo "O Papel da Teoria da Conspiração na Moldagem da História Moderna", é o
fato de o material que emprega
como fonte ser tão fascinante.
O problema é que a verdade
continua a ser verdadeira, mesmo quando é entediante.
Tome-se o caso do assassinato do presidente John Kennedy, em 22 de novembro de
1963. Teóricos conspiratórios
indagam como Lee Harvey Oswald poderia ter disparado dois
de três tiros sobre seu alvo em
5,6 segundos.
Eles olham as posições controversas assumidas por Kennedy em relação a Cuba e ao
Vietnã e para as ditas diferenças entre a CIA e o Salão Oval.
Verdade maçante
Observam que Robert Kennedy, outro democrata jovem e
belo, também morreu assassinado. Consideram peculiar que
Oswald tenha morrido antes de
chegar ao tribunal. Tudo isso
deve ter uma explicação.
Exceto pela verdade maçante. Na realidade, Oswald teve
7,1 segundos (não 5,6) para
acertar um alvo que se movia ao
longo de sua linha de visão telescópica, não através dela. E
era um atirador experiente. Esses fatos, por si sós, derrubam
dois dos argumentos centrais
da "indústria" conspiratória
que cresceu e floresceu após a
morte de JFK.
Outras teorias conspiratórias
também se chocam com objeções práticas enfadonhas.
Diana não estava grávida de
um feto muçulmano, e seu motorista estava embriagado.
George W. Bush realmente
não fez um pacto com o Taleban para criar um pretexto para
a tomada do petróleo iraquiano, passando pelos ataques terroristas do 11 de Setembro. De
maneira semelhante, Robert
Kennedy não "mandou inserir
um supositório envenenado
em Marilyn Monroe".
Aaronovitch deveria ter tido
a coragem de admitir que, como defensor da Guerra do Iraque mais recente, também ele
se deixou convencer por uma
teoria conspiratória, relativa à
existência de armas de destruição em massa.
Ilusão
Mesmo assim, ele prestou
um serviço público admirável.
Constatamos que a história não
acontece por algum motivo. O
destino é fantasia. Acontecimentos sem sentido podem
nos entristecer, mas "c'est la
vie". Não poderemos nos preparar para o amanhã se, às custas da paranoia, tentarmos reconstruir o ontem como ilusão.
A íntegra deste texto saiu no "Independent".
Tradução de Clara Allain.
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