|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OS ANOS REBELDES
A PARTIR DE 1970,
OCIDENTE
PRESENCIOU
A MAIS ESPETACULAR
REVOLUÇÃO DE
COMPORTAMENTO
SOCIAL E PESSOAL
DE TODA A HISTÓRIA,
A QUAL DEVE
SE ACENTUAR
AINDA MAIS COM
O AVANÇO NAS
PESQUISAS GENÉTICAS
por Eric Hobsbawm
A
família é um tema sobre o
qual, por motivos óbvios,
não faltam opiniões, públicas ou privadas. O Google
registra 368 milhões de artigos com
a palavra "família" e apenas 170 milhões com "guerra". Todos os governos tentaram encorajar ou desencorajar a procriação e aprovaram leis
sobre uniões e desuniões humanas.
Todas as religiões do mundo (com
a possível exceção do budismo) e todas as ideologias do século 20 têm
fortes convicções sobre o assunto.
O mesmo ocorre com massas de
cidadãos que, de outro modo, são
politicamente inativos, como indica
o aumento do apoio eleitoral aos
fundamentalistas religiosos. Afirmou-se de maneira plausível que
"questões morais" (isto é, o aborto e
o casamento homossexual) conquistaram para George W. Bush seu
segundo mandato de presidente.
A paixão com que essas opiniões
são defendidas é quase sempre inversamente proporcional ao conhecimento dos fatos, mesmo no próprio país do defensor: a maior parte
do discurso público sobre as relações entre homens, mulheres e sua
prole é ao mesmo tempo anti-histórica e profundamente provinciana.
A pesquisa comparativa de Göran
Therborn sobre os sistemas familiares do mundo e as maneiras como
eles mudaram (ou deixaram de mudar) ao longo do último século
-em "Sexo e Poder", resultado de
oito anos de intenso pensamento e
pesquisa- é uma correção necessária em ambos os aspectos.
Graças a sua perspectiva global e
compilação única de dados, deveria
de hoje em diante ser o guia padrão
sobre o assunto. Além disso, oferece
os resultados às vezes surpreendentes de uma geração de pesquisas demográficas, etnográficas e sociológicas registradas em uma bibliografia
de mais de 40 páginas.
Quantas pessoas sabiam, por
exemplo, que até meados do século
20 o maior índice de divórcios -até
50%- se verificou entre malaios
que se declaram muçulmanos; que
hoje existe menos preconceito de gênero no trabalho doméstico nas cidades chinesas do que nos EUA; que
o maior índice de divórcios na segunda metade do século 20 se registrou entre os principais protagonistas da Guerra Fria, EUA e Rússia; ou
que a população ocidental mais sexualmente ativa é a finlandesa?
Está longe do conhecimento comum que as duas ou três décadas da
metade do século 20 "foram a grande era do casamento e da sexualidade intramarital na história moderna
ocidental" -em 1960, 70% das mulheres norte-americanas entre 20 e
24 anos eram casadas, contra 23%
em 2000.
O não-casamento
Therborn, cujos livros anteriores
incluem "European Modernity and
Beyond - The Trajectory of European Societies, 1945-2000" [Modernidade Européia e Além - A Trajetória das Sociedades Européias, 1945-2000], de 1994, se ocupa aqui particularmente de três temas, todos envolvendo mudanças nos valores familiares e na prática real, embora o
texto nem sempre torne fácil acompanhá-las (o empenho escandinavo
de Therborn a pôr fim à "longa noite
patriarcal da humanidade" não é
um recurso analítico).
Dois desses temas -o declínio do
patriarcalismo e o aumento do controle de natalidade- não apresentam problemas, ao contrário do terceiro, canhestramente descrito como "o papel do casamento e do não-casamento na regulação do comportamento sexual e das ligações sexuais em particular".
Apesar de alguns desenvolvimentos globais comuns, notadamente a
disseminação do controle de natalidade, os padrões familiares mundiais não convergiram; o processo
de "mudança familiar (...) não foi
evolucionário nem unilinear".
O mundo em 1900 estava dividido
a grosso modo em cinco sistemas familiares -o europeu (incluindo os
assentamentos no Novo Mundo), o
africano subsaariano, o asiático
oriental, o asiático meridional e o
asiático ocidental/norte-africano-
pertencentes aos dois ramos principais que o antropólogo social Jack
Goody nos ensinou a identificar: o
africano e o eurasiático.
Therborn prefere uma divisão
"geocultural" a uma baseada na religião, já que, no seu entender, a geocultura geralmente prevalece.
As práticas hinduístas e muçulmanas no norte da Índia são semelhantes, mas marcadamente distintas das
práticas hinduístas no sul da Índia, e
o cristianismo africano teve de fazer
concessões práticas substanciais à
poliginia africana. Os sistemas do
Sudeste Asiático e mestiço americano ("creole") são "intersticiais".
No primeiro, "os rígidos patriarcalismos do confucionismo, do islamismo e do catolicismo foram atenuados pela indiferença budista por
questões familiares"; e, no segundo,
a conquista européia criou a curiosa
combinação de patriarcalismo rígido entre os governantes, miscigenação das massas e um padrão familiar
não-marital desenraizado entre os
indígenas conquistados e as populações escravas importadas. A conquista imperial do Hemisfério Ocidental, sugere Therborn, produziu a
primeira transformação súbita da
estrutura familiar antes do século 20.
Entre os mestiços americanos, o
poder masculino era machista, mais
que institucional, mas a grande
maioria dos sistemas familiares até o
século 20 foi patriarcal, mesmo na
minoria de sistemas matrilineares.
Ele repousava no poder dos homens
mais velhos sobre os jovens de ambos os sexos e na superioridade institucionalizada dos homens sobre as
mulheres, embora a Europa, o Sudeste Asiático e a África fossem menos desfavoráveis às mulheres que
outros locais.
A família européia-ocidental, lembra-nos o autor, "era de longe a menos patriarcal em um mundo muito
patriarcal". Inesperadamente, as
mulheres também se beneficiaram
na única região de poligamia sistemática, o sul do Saara, talvez graças
ao fato de a família africana ser essencialmente não-nuclear ("os parentes eram sempre mais importantes que o cônjuge") e ao reconhecimento público precoce de que o sexo é um prazer humano legítimo.
O patriarcalismo também repousava na predominância do casamento, não necessariamente indissolúvel, mesmo no Sudeste Asiático e na
África, onde os matrimônios não
são ritos de passagem centrais.
Therborn afirma plausivelmente
que, à diferença das estruturas sociais de poder e produção, "os sistemas familiares não parecem possuir
uma dinâmica intrínseca -suas
mudanças são exógenas", isto é, na
ausência de um estímulo externo,
eles se reproduzirão.
A Cortina de Ferro
Os primeiros demógrafos do século 18 consideravam quase axiomático que em qualquer ano o número
de casamentos variasse inversamente ao preço do milho. De modo mais
geral, o "sistema de casamento europeu-ocidental" há muito estabelecido, que prevaleceu a oeste da linha
histórica de Trieste a São Petersburgo, a "Cortina de Ferro" original, supunha que os casamentos levariam a
novos lares ("neolocalidade"), o que
exigia que o novo casal tivesse recursos -nas sociedades agrárias, acesso à terra.
Mas, afirma Therborn, em regiões
estabelecidas, como a Europa Ocidental medieval e do início da era
moderna, isso exigia sistemas de
transferência de terra entre gerações, por meio da herança. Foi o que,
ele sugere, levou ao sistema de casamento "ocidental" característico
(depois exportado para as sociedades de outros continentes): casamentos tardios em idades variáveis,
uma grande proporção de não-casados e "uma combinação de (...) informalidade sexual não-hierárquica
(...) com uma ordem sexual fortemente normativa".
Por outro lado, na África, onde a
maior parte da agricultura de subsistência, sem mencionar o comércio
em certas partes, era desempenhada
pelas mulheres, o casamento, mais
que em outros lugares, foi uma forma crucial de oferta de trabalho.
Quais são os impulsos externos
que provocam mudanças na família
com uma rapidez histórica sem paralelo? Um tanto inesperadamente,
o que Therborn se sente obrigado a
explicar é a longa demora nos séculos 18 e 19 antes do rápido declínio e
queda do patriarcalismo ocidental
no século 20.
Capital e patriarcalismo
Não seria de esperar que a industrialização o enfraquecesse, ao separar o local de trabalho do local de residência, que a proletarização privasse os pais de poder, tanto por não
terem propriedade a transmitir
quanto por serem agora claramente
dependentes dos donos da terra ou
do capital? A urbanização não enfraqueceu a autoridade como tal? De fato, o predomínio masculino não pareceu recuar, pelo menos entre os
pobres, na era da "proto-industrialização" (o que costumava ser chamado de "putting-out system" ou de
produção por encomenda)?
Na verdade, a ascensão da sociedade capitalista industrial protegeu e
reproduziu o patriarcalismo, no mínimo porque até a ascensão da empresa corporativa ele não foi, e ainda
não poderia ser, um sistema operando basicamente, e muito menos unicamente, pela racionalidade do mercado (como ainda é o caso em muitos países). A família patriarcal não
era apenas "uma pesada âncora social", mas um mecanismo essencial
de empreendimento econômico.
Além disso, como demonstra a industrialização britânica no século 19,
um capitalismo industrial próspero
transformaria seus proletários em
uma classe trabalhadora manufatureira, muito provavelmente com
consciência de classe mas também
cada vez mais composta de homens
funcionando como provedores básicos de suas famílias. Essa se tornou
"a aspiração normativa das classes
trabalhadoras européias".
Talvez a surpresa de Therborn se
deva em parte ao que ele considera a
prioridade do argumento antipatriarcal sobre as mudanças no comportamento real, embora ele mostre
que as idéias não se traduziram em
ação do Estado nacional antes do século 20. Ele situa a discussão no surgimento, no Iluminismo escocês do
século 18, da idéia de que a posição
das mulheres na sociedade era um
indicador de progresso social, embora isso ainda não significasse direitos iguais para os sexos.
Possivelmente, tinha ligações com
o protestantismo radical que, com o
socialismo (ateu), Therborn considera os principais desafiadores do
patriarcalismo no século 19. Enquanto as revoluções Americana e
Francesa não se preocuparam com a
liberação das mulheres, esse seria
um elemento central nas revoluções
socialista e comunista.
Assim, ele vê no século 21 as principais "correntes ideológicas amplas
por trás dos ataques decididos à fortaleza do patriarcalismo", como, em
ordem de importância: o movimento revolucionário socialista/comunista (sobretudo por meio dos vastos efeitos e influências da Revolução Russa); os "desenvolvimentistas
nacionalistas" não-ocidentais (sobretudo na Turquia); os movimentos feministas, que para ele não tiveram grande significado fora das regiões anglo-saxãs; e "um liberalismo
secularizado principalmente de proveniência cristã-protestante e judia
-raramente católica".
De um ponto de vista global, evidentemente faz sentido insistir, juntamente com Therborn, que "o comunismo internacional teve um papel crucial, senão predominante"
em todos os grandes saltos à frente
no recuo do patriarcalismo no século 20 -a Primeira Guerra, o pós-Segunda Guerra e a grande virada de
meados dos anos 60 para os 80.
O peso da classe média
No Ocidente, o declínio e a queda
do patriarcalismo, muito maiores do
que em outros lugares até o último
terço do século, basearam-se na dinâmica indígena. O impacto da
ideologia organizada e do poder estatal -este principalmente preocupado em incentivar os nascimentos,
até o inesperado "baby boom" pós-1945- foi portanto menos importante e menos necessário.
A educação primária estatal compulsória para meninas e meninos e a
proibição do trabalho infantil, os
quais aumentaram o custo dos filhos
para os pais, foram as principais maneiras como a ação do Estado afetou
diretamente a família.
O padrão ocidental geral parece
ser de que as idéias que favorecem a
modernidade se disseminam no interior das sociedades a partir das elites secularizadas e educadas (classe
média) e de movimentos políticos
"progressistas" e -para fora- pela
imitação de modelos influentes de
modernidade no exterior.
Na verdade, o último terço do século 20 viu a mudança global mais
rápida e radical na história do gênero humano e nas relações entre gerações, embora ainda não tenha penetrado muito profundamente no resto do mundo.
Therborn é melhor ao registrar e
monitorar essa revolução sem precedente do comportamento humano nos países capitalistas desenvolvidos -e as rebeliões correspondentes nas regiões pós-comunistas- do que em analisar suas causas
e sua relação com a extraordinária
aceleração do crescimento socioeconômico e da transformação de que
faz parte.
Um tanto inesperadamente, suas
conclusões sobre a situação da família no final do último quarto de século de revolução comportamental são
insossas, para não dizer banais.
A humanidade provavelmente
continuará apresentando variações
da família antiga ("o padrão modal
de parceria heterossexual duradoura
e institucionalizada"), mas -ao menos no Ocidente pós-1968- de uma
forma burguesa menos padronizada. Alguns desenvolvimentos recentes são preocupantes, como a "mercantilização" das relações sexuais e
pessoais, mas nenhum é "necessariamente fatal ou ameaçador para o
esquema institucional existente".
"Eles indicam somente que o futuro também terá seus problemas."
Essas declarações são surpreendentes, porque divergem tanto da própria análise de Therborn quanto de
certas evidências para as quais ele
chama a atenção incidentalmente.
Ele mesmo formulou o problema
com lucidez: os sistemas familiares
são mantidos em equilíbrio. Quando são perturbados por contradições internas ou -nesse caso-
exógenas, um determinado conjunto de arranjos social é desestabilizado. A ruptura pode ou não ser administrada por mecanismos de reequilíbrio ou reestabilização. Caso contrário, "surge a necessidade de uma
segunda fase de mudança (...), uma
fase em que se define uma direção
para mudar e organizar novamente
a instituição". Mas, se isso não acontecer, "haverá um período mais curto ou mais longo de anarquia, depois
do qual a instituição em questão
mudará (inclusive desaparecendo)
ou retornará a sua forma anterior".
É difícil negar que os desenvolvimentos pesquisados por Therborn
representam uma ruptura historicamente repentina e espetacular das
antigas normas e arranjos pelos
quais os gêneros e as gerações se ligaram nas sociedades, pelo menos
desde a invenção da agricultura.
Quando o número de nascimentos
extramaritais nos países desenvolvidos aumenta em 40 anos de 1,6% para 31,8% (Irlanda), de 1,4% para
quase 25% (Holanda), de 3,7% para
49% (Noruega) ou quando, como
no Canadá, a média de filhos por
mulher cai de 3,77 para 2,33 somente na década de 1960, estamos claramente diante de uma revolução do
comportamento social e pessoal.
Ruptura extraordinária
Poderíamos esperar uma investigação menos superficial das conseqüências dessa ruptura extraordinária. O único aspecto que Therborn
considera seriamente é o estritamente demográfico, que deverá reduzir a população européia de um
quarto da população mundial em
1900 para 1/ 15 em 2050.
Aqui, a própria identificação forte
de Therborn com os ideais escandinavos de progressiva emancipação
de gênero e sexo interfere em sua
análise, determinando sua visão das
funções sociais históricas da família.
Talvez não seja por acaso que o índice do livro contenha mais referências a "divórcio" do que a "filhos", a
"sexualidade" do que a "herança",
muito mais a "casamento" do que a
todas essas juntas e nenhuma a qualquer forma de "adoção" ou outros
modos de parentesco construídos.
Seu livro considera o casamento
basicamente como uma ordem sexual, separada, mas entrelaçada com
a ordem social, o que incidentalmente lhe permite abri-la a parcerias
entre o mesmo sexo. Para ele, essa
função vem antes das outras ("uma
opção derivada da experiência do
início do século 21"): como um arranjo para a procriação e educação
de filhos, como um mecanismo de
intercâmbio social e integração em
comunidades maiores e como um
definidor de status social de grupos
etários e lares.
Ainda é adequado desde os anos
70 -na medida em que a desigualdade econômica aumenta acentuadamente nas sociedades capitalistas
desenvolvidas- ver o declínio da
"família dona-de-casa" de seu apogeu em meados do século 20 como
totalmente "conduzida não pela pobreza -como ocorreria mais tarde
em muitos países pobres-, mas por
uma nova prioridade de rumo de vida, de renda independente e de uma
carreira"?
Incidentalmente, as próprias conclusões de Therborn sugerem que o
casamento como ordem sexual é
historicamente uma norma ou um
ideal social, mais que uma descrição
da realidade, exceto em alguns sistemas, que ele força todas as mulheres
ao casamento formal ainda virgens e
torna o sexo (heterossexual) virtualmente impossível fora dele.
Os próprios dados de Therborn
sugerem uma visão menos complacente da situação criada no início do
século 21 pelo terremoto que abala a
família tradicional.
Provavelmente a tendência básica
do século 20 -essencialmente, a
emancipação das mulheres de sua
antiga posição de inferioridade social e institucional em relação aos
homens- ainda prevalece, mas ele
também observa que, "onde os pais
e maridos não dominam, a falocracia ou o poder sexual masculino assimétrico pode dominar a ordem sociossexual, como nas sociedades populares mestiças ou nas favelas inchadas da África".
No próprio período do colapso
mais dramático dos padrões tradicionais da moral e do comportamento sexuais, a família dominada
pelo homem foi reforçada pelo renascimento religioso, "muitas vezes
com intensas preocupações patriarcais". Embora isso seja mais forte no
islã, está longe de ser claro que as vitórias do fundamentalismo cristão
nos EUA sejam tão "relativas" quanto Therborn sugere. Na verdade,
atualmente parece que sob George
W. Bush ele está prestes a marcar
novas vitórias "no primeiro e até
agora único país a ver uma reação
antifeminista de sucesso na área do
sistema familiar europeu".
Therborn também reconhece que
a supremacia do ideal compartilhado entre a emancipação liberal e o
capitalismo de consumo -qual seja, a satisfação dos desejos individuais, incluindo o sexual- tem algumas conseqüências aberrantes:
não apenas a queda da fertilidade
ocidental muito além dos índices de
substituição mas o nascimento de
menos filhos do que as mulheres
realmente desejam.
Futuro perturbador
Ele não menciona as conseqüências, especialmente em uma sociedade de mercado, da nova e rapidamente crescente capacidade humana de manipular a genética de nossa
espécie (clonagem etc.). Elas serão
quase inevitavelmente substanciais,
imprevisíveis e quase certamente
perturbadoras. Os problemas criados nas sociedades de preferência
masculina nos anos 90, pela combinação do controle natal com a capacidade de os pais conhecerem o sexo
dos embriões, já são evidentes.
Esse é um livro profundamente
impressionante de um importante
sociólogo, original e principalmente
convincente em sua análise histórica
e notável em sua pesquisa do cenário
marital e sexual global. Mas subestima o efeito real e potencial das recentes mudanças evolucionárias na
família, sem precedentes em escala e
velocidade, tanto globalmente quanto nas sociedades ocidentais em que
elas mais avançaram.
Na minha opinião, também subestima a relação entre as conseqüências para a família da revolução cultural ocidental do último terço do século 20 e seu equivalente econômico: a crença em um capitalismo teoricamente libertário que pensa poder funcionar sem a herança que lhe
deu grande força no passado -a saber: regras de obrigação e lealdade
dentro e fora da família tradicional e
outras inclinações que não tinham
conexão intrínseca com a busca da
vantagem individual que abasteceu
seu motor.
Enquanto o neoliberalismo triunfou na economia, sua inadequação
não poderia mais ser ocultada. À luz
do conteúdo deste livro, pode-se sugerir que também estamos atingindo esse ponto na ideologia do libertarismo cultural.
Eric Hobsbawm (1917) é historiador inglês,
autor de "Era dos Extremos" (Cia. das Letras), "Era das Revoluções" e "História Social
do Jazz" (ambos pela ed. Paz e Terra). A íntegra deste texto foi publicada no "London
Review of Books" (www.lrb.co.uk).
Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves.
Texto Anterior: A queda do patriarca Próximo Texto: Ode ao patriarca Índice
|