São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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CONEXÃO AMERICANA
Ex-adido militar diz que EUA não precisavam ensinar brasileiros a dar golpes
"Não ouvi falar em OPS"

especial para a Folha

"Os americanos não têm experiência em golpes militares. Seria ridículo eu procurar generais brasileiros para dar um golpe, quando eles tinham derrotado o Getúlio Vargas. Eles não precisavam dos meus conselhos", afirma o general Vernon Walters, que foi adido militar da embaixada norte-americana durante o período militar no Brasil.
Veterano da Segunda Guerra e amigo de Castelo Branco, Walters era considerado um especialista em combater o comunismo. Ele trabalhou no Brasil entre 1962 e 1967. Também foi adido militar do Chile, pouco antes da queda de Allende, em 1973. Chegou ao posto de vice-diretor da CIA durante a administração Richard Nixon (1969-1974), presidente norte-americano que renunciou após o escândalo Watergate.
Considerado pelo historiador Moniz Bandeira como o coordenador das ações da CIA no Brasil, Vernon Walters afirmou na entrevista a seguir, feita por telefone de sua residência em Washington, que não sabe o que é a OPS e que não teve relações com a CIA quando era adido militar no país. Segundo ele, a CIA fazia no Brasil à época o mesmo que o SNI nos Estados Unidos: "Procurava saber coisas interessantes sobre o país".

Folha - Como foi sua participação no movimento militar de 64?
Vernon Walters -
Seu jornal sempre diz que eu estava envolvido, mas não estava. Os telegramas que enviei do Brasil para os Estados Unidos estão disponíveis nos arquivos. Desafio a imprensa a achar uma mensagem que prove a minha intervenção. Eu era apenas uma testemunha bem informada.
Folha - Qual era o seu papel na embaixada?
Walters -
Era um coronel americano sem experiência em golpes, se comparado com generais brasileiros, que tinham derrotado dois presidentes em 25 anos.
Folha - Como a CIA operava no Brasil?
Walters -
Naquela época, eu não era da CIA. Só depois, em 1972, que vim a trabalhar na agência.
Folha - Quando estava no Brasil, o sr. tinha algum contato com a CIA?
Walters -
Não.
Folha - O coronel Erasmo Dias nos informou que todos os adidos militares que estiveram no Brasil eram da CIA.
Walters -
Os oficiais militares não eram, nem nunca são.
Folha - O que a CIA fazia no Brasil?
Walters -
Fazia o mesmo que o SNI fazia aqui, nos Estados Unidos, procurava saber coisas interessantes sobre o país.
Folha - O sr. chegou a influenciar nas decisões dos militares brasileiros?
Walters -
Que eu saiba, não. Nunca procurei influir na decisão dos militares brasileiros. Eram perfeitamente capazes de tomar suas próprias decisões.
Folha - Onde a CIA tinha escritórios no Brasil?
Walters -
Não sei. Ela não me dizia. Tive contato de vez em quando, nas reuniões da embaixada, com o chefe da seção.
Folha - Qual sua relação com o Ibad (Instituto Brasileiro de Ação Democrática)?
Walters -
Não sei o que é. Minha função era militar. Minhas conexões eram militares, não policiais. O que o senhor quer saber, afinal? Naturalmente, eu informava sobre o estado de espírito dos militares. Era o meu dever como adido militar.
Folha - Por que seu nome está sempre associado ao movimento militar de 64?
Walters -
Não sei. Tudo é sempre culpa dos americanos. Os americanos não têm experiência em golpes militares. Seria ridículo eu procurar generais brasileiros para dar um golpe, quando eles tinham derrotado o Getúlio (Vargas, em 1945). Eles não precisavam dos meus conselhos.
Folha - O sr. conhece a OPS?
Vernon -
Nunca ouvi falar.
Folha - Era um programa de intercâmbio para treinar policiais do mundo inteiro.
Walters -
Era um vasto projeto.
Folha - O sr. conheceu Theodore Brown (chefe da OPS no Brasil)?
Walters -
Não. O senhor está tentando pescar informações para ver se descobre algo. Nunca participei de planejamento ou de investigação ligados ao Brasil. O senhor está com uma montanha de informações antiamericanas e está procurando confirmar comigo.



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