São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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CONEXÃO AMERICANA
Coronel Erasmo Dias diz que EUA não atuaram na polícia
"É uma bobagem"

especial para a Folha
e do "Notícias Populares"

"Dizer que os norte-americanos tinham agentes na polícia e no Exército é uma bobagem", afirma o deputado estadual (PPS-SP) e coronel do Exército Erasmo Dias.
Secretário de Segurança Pública de São Paulo de 1974 a 1979, Dias se notabilizou como um dos mais ferrenhos oponentes das esquerdas e do movimento estudantil. Para ele, dizer que a CIA atuava ostensivamente no Brasil é "dar um atestado de burrice". Dias, no entanto, declarou que todo oficial que servia na embaixada norte-americana era ligado à CIA. Afirmou também que recebeu um fuzil AR-15 de presente de um agente da CIA.
Ao ler um dos relatórios enviados pela OPS do Brasil para os EUA, citado por Martha Huggins e que indica que o agente Lauren Mullins tivera acesso a informações internas da polícia de São Paulo, Dias contestou: "Isso aqui é uma besteira".

Folha- O sr. poderia comentar o relatório feito pelo agente da OPS Lauren Mullins, comunicando a Washington atividades da polícia em São Paulo?
Erasmo Dias -
Nunca ouvi falar nesse agente. É uma mentira o que ele diz aqui: que, em São Paulo, o prefeito Faria Lima efetivou uma Guarda Municipal com recrutamento inicial de mil pessoas... É de um analfabetismo crucial. Ele fala em uso de computador... Que computador? Não havia. É uma xaropada.
Folha - O agente parece ter tido acesso a informações da Secretaria de Segurança Pública.
Dias -
Ele diz que se encontrou com um secretário de Segurança Pública de São Paulo em março de 1969, mas nunca ouvi falar nesse agente. Pelo relatório dá para ver que ele não sabia de nada. Os norte-americanos eram mal informados, e esse relatório não representa nem um quinto do que se conhecia na época.
Folha - As autoridades brasileiras abriram as portas para agentes norte-americanos?
Dias -
Lógico. Outro dia o xerife de Nova York veio aqui e eu o levei aos pontos de crack e ao diabo que o carregue... Mas, naquela época, quando eu estava no Exército, nunca fui procurado por norte-americanos. Como secretário da Segurança Pública de São Paulo, sim. Mandei cinco ou seis delegados para fazer cursos na Swat, nos EUA. Mandei também oficiais para Tóquio. Ganhei um fuzil AR-15 da CIA.
Folha - A Oban teve envolvimento de norte-americanos?
Erasmo Dias -
A Oban surgiu com o AI-5. Quando apareceu a guerrilha da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária) e da ALN (Ação Libertadora Nacional), o troço todo começou a engrossar. A segurança interna do Exército não tinha nada, só centros de informações. Ninguém estava preparado para a guerrilha. Então, formamos aqui em São Paulo a Segunda Seção do Estado-Maior do Segundo Exército. Surgiram uma seção de informações e outra de operações, que iriam combater esses movimentos novos. Foi tudo improvisado. Pegamos uma equipe da Polícia Civil, que era do Dops, uma da Polícia Militar, sempre gente ligada à informação. Não tinha nada a ver com CIA. Dizer que tinha é um atestado de incapacidade.
Folha - O livro mostra que a estrutura da Oban foi copiada depois no Projeto Phoenix, adotado no Vietnã. O criador do Projeto Phoenix, Theodore Brown, veio para o Brasil quando se criou a Oban.
Dias -
Vou fazer uma pergunta de advogado do diabo. Vocês acham que, se existisse toda essa estrutura montada com ajuda dos norte-americanos, nós teríamos tanta dificuldade para combater? Os guerrilheiros tinham curso em Cuba, mas aqui não tinha americano nenhum.
Folha - E a CIA?
Dias -
Olha, Vernon Walters era amigo do Brasil. Mas uma coisa é certa: todo mundo que serve na embaixada é ligado à CIA, sem exceção. Antes de vir, eles passam um período na agência. Na época, eles tinham um especial desvelo pelo Brasil.
Folha - E Charles Chandler, capitão norte-americano morto em São Paulo em 1968 por guerrilheiros brasileiros, ele era da CIA?
Dias -
Era do consulado, mas eu já disse: todos esses camaradas eram. O Chandler nos ajudava. A CIA aproveita muito essa gente.



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