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PONTO DE FUGA
A claridade e a cegueira
JORGE COLI
especial para a Folha, na Provença
Há o "grande" festival, criado
por Jean Vilar em 1947. Há o
festival "off" e o "off" do "off".
Há as representações de rua,
em todos os cantos e praças: pequenas peças, mímicos, saltimbancos, que não cessam, até
muito tarde, na noite. Fortes
vibrações no ar e um levíssimo
perfume neo-hippie. Avignon é
uma cidade mesmo muito divertida durante o mês de julho,
quando volta o mais célebre de
todos os festivais de teatro.
Uma sensação de desnorteamento diante de tantos espetáculos; algumas exaltações:
"Giulio Cesare", a partir de
Shakespeare, trazido de Bolonha por Romeo Castellucci; "Le
Cid", de Corneille, dirigido pelo inglês Donnellan. Tudo isso
à volta da principal produção,
que ocorre no pátio solene do
Palácio dos Papas, cujo princípio é o de retomar textos fundadores por meio de grandes
intérpretes. Neste 1998, o escolhido foi "Édipo Tirano", na
versão feita por Hölderlin da
tragédia de Sófocles. Montagem não muito inspirada, que
deixou o público indiferente,
porém atores fortes, e a descoberta de um Édipo vencedor da
Esfinge, mas levado à cegueira
por ter tentado tudo saber.
Consciência difícil, incômoda, de uma ignorância essencial, da noite definitiva a que
somos condenados. São os
opostos às irrisórias tentativas
de tomar o mito edipiano como
explicações para atos, sentimentos e comportamentos humanos, às teorias que buscam
analisar a alma. Hölderlin,
desconfiado das ambições da
ciência iluminista, inventou
um Édipo emblemático, que
respondeu demais, perguntou
demais e que, tarde demais,
descobriu a cegueira que sempre carregara em si.
PROSTITUTAS E BURGUESES - "Expressionismo", "Nova
Objetividade": o pintor Otto
Dix é classificado em rubricas
que mais ocultam do que desvendam. De modo geral, sabe-se pouco dele. Alguns manuais reproduzem o retrato
que fez da jornalista Sylvia von
Harden, espécie de símbolo visual da Berlim dos anos de
1920, e assinalam a presença de
suas obras na exposição "Arte
Degenerada", que os nazistas
organizaram em 1933.
Uma retrospectiva reveladora ocorre agora, na Fundação
Maeght, em St. Paul de Vence,
com cerca de 200 obras. Dix enfrenta a feiúra do mundo tratando-a por uma técnica muito
controlada e por uma cultura
visual muito alemã, que vai
buscar na arte dos séculos 15 e
16 as suas origens. Essa feiúra
mórbida é nutrida pela energia
de uma violência física e sexual, cujo apogeu criador chega com o contorno cortante e as
superfícies lisas que emprega
nos anos de 1920 e 1930.
BIQUÍNI - Bem antes de Brigitte Bardot ou dos iates milionários, quando ainda era uma
isolada aldeia de pescadores,
St. Tropez atraiu Signac, Matisse, Bonnard. O museu de
l'Annonciade, no porto da cidadezinha, abriga atualmente
uma retrospectiva Bonnard:
não há pintor que tenha feito
melhor e com tanta felicidade
as cores sustentarem-se entre si
e por si só. Rothko foi um profundo admirador de Bonnard.
TOURADA - O teatro romano de Orange, construído há
2.000 anos, foi o que melhor
chegou até nós, com seu imenso
muro de cena. Lugar impressionante, ideal para montagens de grandes óperas, onde
9.000 espectadores nada perdem, graças à maravilhosa
acústica. Este ano, foi apresentada "Carmen", segura e contida, sob a direção de Michel
Plasson.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli20@hotmail.com
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