São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2004

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filosofia

POR VLADIMIR SAFATLE

Música silenciosa

Após 70 anos de implantação universitária da filosofia em solo nacional, é evidente a consolidação bem-sucedida de múltiplas linhas de pesquisa. No entanto não é possível deixar de lembrar uma ausência. Ela diz respeito a um programa rico em questões ao longo da história das idéias: a filosofia da música. Basta ver a pobreza bibliográfica disponível ao leitor brasileiro.
Quase toda a imensa obra de Adorno dedicada à música continua sem tradução. O mesmo destino recebeu o "Dicionário de Música", de Rousseau, o "Compêndio Musical", de Descartes, os textos de Tieck, E.T.A. Hoffmann, Schlegel e livros centrais de Carl Dahlhaus como "A Idéia da Música Absoluta".
Tal ausência é importante, já que a história das formas musicais é, na verdade, um setor privilegiado, mas quase esquecido, da história da razão. É isso que a filosofia da música busca nos mostrar, ou seja, como os problemas internos ao desenvolvimento da forma musical são fundamentalmente problemas de critérios de racionalidade e de processos de racionalização.
Ela nos indica como a forma musical visa a resolver questões ligadas à relação entre o pensamento e a natureza, à determinação do estatuto do acaso e da necessidade, aos modos de intuição do tempo, entre outros.
Como se a filosofia nos lembrasse que a razão sempre encontra, na música, traços de um caminho que ela mesma construiu.


Vladimir Safatle é professor de filosofia na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e organizador de "Um Limite Tenso - Lacan entre a Filosofia e a Psicanálise" (ed. Unesp).


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