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O czar de terno de risca de giz
"A Rússia de Putin" enfoca a ascensão da criminalidade, da burocracia e do terror no país, nos dias atuais
CATHERINE MERRIDALE
DO "THE INDEPENDENT"
Anna Politkovskaya é provavelmente a mais conhecida e mais destemida das
jornalistas radicais da Rússia. Em "Putin's Russia" [A Rússia
de Putin], ela relata a corrupção e
as conexões criminosas da nova
elite, a hipocrisia dos burocratas e
principalmente o horror interminável da Guerra na Tchetchênia.
Neste novo livro, seu alvo é o próprio Vladimir Putin, o ex-agente
secreta de rosto cinzento que governa a Rússia como um czar de
terno de risca de giz. A reportagem
é corajosa, o estilo, cru.
Politkovskaya não ataca Putin
discutindo suas políticas em ordem cronológica, mas escolhe
uma série de temas relacionados,
começando pelo Exército. Constrói seu caso como um advogado,
citando evidências e apresentando
uma série de documentos.
Putin, o homem da KGB, cercou-se de comparsas do passado soviético. Essas pessoas não mudaram
seus hábitos autoritários. Elas deveriam ter sido expostas quando o
comunismo caiu, afirma Politkovskaya; deveria ter havido um
debate público. A única maneira
de lidar com a tirania incipiente é
denunciá-la, antes que seja tarde
demais. Esse, juntamente com seu
apelo por justiça internacional, é o
credo de Politkovskaya.
O problema é que outros legados
do comunismo enchem de lixo o
caminho da liberdade. A pobreza é
um deles. Por trás do glamour da
capital, a maioria dos russos continua muito pobre. Politkovskaya
visitou uma base de submarinos
em Kamchatka. Lá, engenheiros e
especialistas -até um almirante- passam fome enquanto sua
frota de submarinos se decompõe
sob a ferrugem. O investimento
nesse ramo da defesa russa deixou
de ser prioridade. Assim como a
preservação das florestas, o futuro do ambiente ou a saúde e a segurança no emprego dos cidadãos.
Politkovskaya sugere como a
economia é dirigida. Seu retrato
da "máfia dos Urais" e seu domínio sobre a indústria e a saúde
são as partes mais chocantes do
livro.
Mas o mais revelador é seu relato
do destino dos tchetchenos na
Rússia de hoje. Depois da invasão
de um teatro, em outubro de 2002,
a polícia vasculhou os tchetchenos
de Moscou em busca de "instigadores" e "conspiradores". Ela precisava de algumas prisões. Um truque comum era incriminar uma
vítima com um pequeno pacote de
heroína.
A narrativa lembra a escuridão
do passado soviético. Mas deveria
tocar alarmes no presente. A maioria dos russos não é corrupta nem
viciada. É sua negligência, seu fatalismo, sua falta de poder individual
que permitem que os abusos continuem. Politkovskaya quer que
vejamos claramente, não para encolher os ombros e resmungar que
está tudo uma bagunça. A Guerra
da Tchetchênia continua porque
as pessoas encolhem os ombros. O
tom deste livro pode ser irritante.
Mas o que a autora tem a dizer sobre hipocrisia, racismo e a guerra
ao terror deveria ter ressonâncias.
Catherine Merridale é professora de história contemporânea no Queen Mary College, da Universidade de Londres.
Tradução: Luiz Roberto M. Gonçalves.
Putin's Russia
296 págs., 8,99 libras
de Anna Politkovskaya. Trad. de
Arch Tait. Harvill Press (Inglaterra).
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