São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

A Bolsa vem em ondas como o mar


Bolsas caem, sobem; ontem "otimista", hoje "pessimista", mas nada mudou no estado grave da economia


IMAGINE-SE que nossa única fonte de informação sobre o rumo da economia fosse um indicador do mercado financeiro -a Bolsa, por exemplo. Imagine-se que, nessa fé, os índices da Bolsa expressam os caminhos e descaminhos do crescimento econômico, por exemplo. Por fim, suponhamos que os comentários de financistas e agregados a respeito desse indicador financeiro e sobre o destino do PIB sejam as opiniões econômicas predominantes.
Bom, não precisamos imaginar muito. As coisas são mesmo assim. Em meados de julho passado, o povo do mercado fazia festinha, em particular devido a "resultados melhores que os esperados" nos lucros das empresas americanas. "Diminuem os temores de nova recessão", dizia-se por aí. Anteontem, tombo nas Bolsas. "Volta o pessimismo."
Considere-se: em menos de um mês, o que poderia ter acontecido de fundamental e diferente na economia do mundo ou em qualquer economia, na dos EUA ou na de Pirapora das Palombetas: NADA.
Quando faz dinheiro, o povo do mercado fica feliz. A mídia emprenha pelo ouvido e difunde a ficção temporária. Na salada de indicadores econômicos e financeiros, escolhem-se os menos incompreensíveis ou os mais alardeados pelos povos dos mercados. Exemplos a seguir.
Os resultados das empresas americanos têm sido "melhores do que os esperados" em parte porque demitiram ou não contrataram mais gente. Resultados como esses são bons no curto prazo. Como é óbvio, se o desemprego continuar alto, não há como crescer de novo, assim como não é possível sair do chão puxando os cabelos para cima.
O Congresso dos EUA arruma empréstimos para o Estados americanos a fim de evitar ainda mais cortes de gastos ou aumento de impostos. Os Estados americanos estão demitindo professores e bombeiros. Os pedidos de seguro-desemprego nos EUA continuam na casa dos 450 mil por semana, ao contrário do que alardeavam os numerólogos das finanças no início do ano. Os salários continuam na lama. Salário não dá manchete.
A crise de 2008-09 foi muito grave. Não passa de hora para outra. Os governos do mundo rico estão meio quebrados, pois gastaram para limpar a porcaria estrambótica deixada pelo mercado financeiro. Nesta semana, o banco central dos EUA, o Fed, disse que vai ter de dançar ainda mais miudinho para manter os juros baixos nos EUA. Não pode mais baixar os juros nominais de curto prazo, que estão a zero. Mas vai comprar papéis da dívida pública americana a fim de baixar os juros de longo prazo e, assim, induzir os bancos a saírem da retranca.
Note-se que o Fed vai fazer tal coisa usando rendimentos de papéis imobiliários que comprou -a nota é para lembrar que o mais importante dos BCs tornou-se, em última análise, a maior financeira imobiliária do planeta, pois o mercado derreteu. É um escândalo, mas inevitável, dada a lambança homérica da finança.
Da China à Grécia, passando pelo Reino Unido, há previsões de PIB menor. A Grécia está em recessão grave. Como vai pagar sua montanha de dívida, que está onde sempre esteve desde o faniquito do mercado com a crise da dívida europeia? O risco percebido de calote dos bancos europeus voltou a crescer.
Vai haver catástrofe? Improvável. Mas a crise deve durar uma década.

vinit@uol.com.br


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