São Paulo, sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

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Morar Rio

Invasão bandeirante

Empreendedores paulistas apostam em áreas do Rio inexploradas pelos cariocas e mudam o eixo dos investimentos imobiliários na cidade

por LUISA BELCHIOR, do Rio

Com o trunfo do crescimento do crédito em mãos, os empresários do mercado imobiliário paulista decidiram apostar em áreas do Rio esquecidas pelas próprias empresas cariocas. E acertaram: hoje, segundo dados da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), empresas de São Paulo estão liderando os investimentos no centro do Rio e em áreas ainda desvalorizadas na cidade, que acabaram virando tendência no mercado local.

Não é só a associação que diz isso. Para o prefeito do Rio, Cesar Maia, o centro da cidade é alvo de um "boom" de investimentos do que chama de "capital imobiliário paulista", fenômeno que ele atribui à combinação do crescimento do crédito com a revitalização de áreas menos visadas pelo mercado imobiliário carioca. Tanto assim, diz ele, que a prefeitura começou a dar mais atenção a esses locais. "A urbanização das regiões [bairros do centro e da zona norte do Rio] é exemplo disso", diz.

Atualmente, nomes como Camargo Corrêa, Klabin Segall, WTorre e Latour assinam os principais lançamentos imobi-liários do centro da cidade, que, por dez anos, teve investimento zero, segundo levantamento da Ademi.

O ponto de partida da tendência ocorreu em novembro de 2005, com o lançamento de um condomínio residencial da Klabin Segall na Lapa (centro), região que não via um novo empreendimento do tipo havia uma década. Munida de pesquisas e com a experiência de já ter apostado certo em áreas de São Paulo como a Chácara Klabin e a Barra Funda, a empresa decidiu investir em um terreno que havia abrigado a fábrica de uma cervejaria e passara despercebido por empresas cariocas.

"O fato de olhar de fora pode ter influenciado. Nós inovamos, decidimos levar para o centro o 'algo mais' que a Barra [da Tijuca, bairro com o maior número de lançamentos imobi-liários dos últimos dez anos] já vinha oferecendo, mas com um preço em torno de R$ 2.400 o m2 em valores atualizados [para dois ou três quartos]", afirma o diretor de novos negócios da Klabin Segall, Flávio Ramos. Na Barra, a média de preço em setembro foi de R$ 3.534 (dois quartos) e R$ 3.734 (três quartos), segundo levantamento mensal da Ademi.

No lançamento, todos os 688 apartamentos do empreendimento, batizado de Cores da Lapa, foram vendidos em menos de duas horas. A expectativa da empreendedora era comercializar não mais do que 40% de unidades.

"No mesmo dia, havia cerca de 300 pessoas com o cheque na mão, frustradas por não conseguirem comprar", conta Ramos. "Isso mudou o eixo de investimento imobiliário; fez com que as empresas começassem a olhar para o centro."

De acordo com dados da Ademi, até o lançamento da Klabin, a região central do Rio, na qual a Lapa está insertida, não recebia nenhum lançamento pelo menos desde 2000 -há quem recue ainda mais e diga que é desde 1995. Às 688 unidades de 2005 foram somadas outras 178 no ano seguinte, com o empreendimento Viva Lapa, da carioca Schipper Engenharia.

Os bons resultados impulsionaram as grandes imobiliárias paulistas a investir no centro, enquanto as cariocas ainda não "enxergavam a tendência", afirma o consultor da Ademi Rodolpho Vasconcellos.

As empresas paulistas descobriram ainda um filão antigo do centro do Rio: o de prédios comerciais, que até então estavam migrando para a Barra da Tijuca (zona oeste). WTorre, Camargo Corrêa e Latour foram pioneiras nesse tipo de investimento.

"Quando analisamos com mais profundidade o crescimento do mercado de escritórios da Barra, vimos que ele não era impulsionado por uma preferência pelo bairro, mas por falta de novos terrenos no centro. Cerca de 75% das empresas ca-riocas ainda ficam no centro, onde há âncoras como a Petrobras", diz Roberto Perroni, diretor-superintendente da Camargo Corrêa, que, juntamente com a Tishman Speyer, investiu R$ 450 milhões no Ventura Tower, duas torres comerciais de 36 andares cada, com o apelo do selo "green building".

Localizadas na avenida Chile, uma das principais do centro do Rio, a primeira delas será entregue em fevereiro; a segunda teve as obras antecipadas pela procura, segundo Perroni. "Foi uma aposta forte, mas não tivemos dúvidas. Sentimos o crescimento do Rio a partir das condições do petróleo e da demanda por novos escritórios. Nem financiamos. Acho que quem vê de fora tem uma análise mais fria", afirma.

Também na vizinhança
As recentes "descobertas" dos paulistas no Rio não se limitam ao centro da capital. Na carona da revitalização de bairros cariocas e até em municípios vizinhos menos valorizados, as construtoras descobriram novos nichos no território fluminense.

Bairros da zona norte do Rio como a Tijuca e São Cristóvão e os municípios vizinhos de Niterói, Nova Iguaçu e Duque de Caxias, todos na região metropolitana, concentram a atenção de São Paulo, segundo o conselheiro da Ademi Rodolpho Vasconcellos. "Hoje as empresas estão não só mais atentas a essas áreas, mas também focando seus investimentos nesses lugares."

A Gafisa aproveitou uma alteração no plano urbanístico de São Cristóvão, bairro próximo ao centro, que flexibilizou a construção de residenciais na área, e foi a primeira do mercado imobiliário a comprar um terreno lá. Investiu R$ 22,6 milhões no Quinta Imperial, um re-sidencial com 150 unidades a partir de R$ 103 mil.

Com a boa aceitação que diz ter encontrado, a incorporadora expandiu os investimentos a Niterói (a 14 km do Rio), onde já fez dois lançamentos neste ano. Outra que está no município é a Klabin, que, assim como a Método e a WTorre, também fez lançamentos na Tijuca, tradicional bairro carioca onde o mercado imobiliário do Rio parou de investir por causa do crescimento das favelas no entorno.

Pesquisas da Gafisa constataram que os investimentos em áreas com menor renda são diretamente influenciados pelo aumento do crédito e do poder de compra. "Até três anos atrás, financiava-se em, no máximo, 70 parcelas. Hoje há financiamento de até 30 anos. Conseguimos descer no nível da pirâmide e abrir mercados", afirma o diretor da Gafisa Rio, Luiz Henrique Rimes.

O foco dessa tendência, segundo empresários e especialistas ouvidos pela Morar, é o município de Nova Iguaçu. "Hoje, todas as grandes [empresas] têm terreno lá", diz Luiz Henrique Rimes, da Gafisa Rio, que já lançou empreendimentos no município, assim como a Klabin Segall. "Estamos apostando bastante no Rio", certifica Ricardo Perroni, da Camargo Corrêa.


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