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Clóvis Rossi

A tentação do modelo chinês

Após a morte do ditador, a Coreia do Norte pode ser forçada a ampliar cada vez mais os mercados privados

É prudente começar como Victor Cha terminou sua análise para o on-line do "Financial Times": "Nós não sabemos o futuro da Coreia do Norte após Kim Jong-il [o ditador morto]", escreveu esse conselheiro-sênior do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais e professor da Georgetown University, com a experiência de três anos como diretor de assuntos asiáticos da Casa Branca.

Cautela indispensável em se tratando de um país tão fechado, assim descrito por Ramón Lobo, de "El País", jornalista de larga experiência em conflitos: "A Coreia do Norte não é um Estado nem o último regime stalinista nem a primeira ditadura comunista hereditária [rótulos usualmente aplicados ao país]. A Coreia do Norte é uma gigantesca seita com armas nucleares, um país isolado, empobrecido e submetido a anos de lavagem cerebral".

Estabelecidas essas premissas cautelares, pode-se olhar um pouco para o futuro.

A quase totalidade dos analistas aponta para um risco assim resumido por Max Fisher, editor-associado de "The Atlantic": "A grande ameaça que Kim Jong-il coloca com a sua morte, assim como em vida, não é que o Estado vá cometer um ato de agressão não provocado, mas se ele entrará em colapso".

Risco acentuado pelos rumores de que o sucessor, Kim Jong-un não é exatamente o queridinho dos militares, especialmente por ter sido designado general sem jamais ter servido o Exército.

Que os militares são fonte de instabilidade ou estabilidade decorre não só da força intrínseca das armas mas também do fato de que 20% dos 24 milhões de norte-coreanos são da ativa ou da reserva e de que o equivalente a 25% da economia foi torrada em gastos militares (dados de 2002, compilados pelo Congressional Research Service, serviço de pesquisas do Congresso norte-americano).

Torna-se razoável nesse cenário a expectativa de Phillipe Pons, especialista do "Monde", para quem, "num primeiro momento ao menos, a direção do país será colegiada" entre a Comissão de Defesa Nacional, organismo supremo do país, os militares de alta patente e o tio do sucessor, Jang Song-taek.

Se a sucessão do ditador não desestabilizar o país, o razoável é especular com uma migração da Coreia do Norte para um modelo parecido com o da China e o do Vietnã: rígido controle pelo partido único convivendo com uma economia crescentemente orientada para e pelo mercado.

Por muito fechado que seja o país, o fato é que uma reforma constitucional em 1998 introduziu o conceito de economia privada, o que levou "à abertura de 4.500 mercados de consumo nos quais se vende livremente todo tipo de produtos importados da China, além de excedentes de cultivos e produtos locais", informa Georgina Higueras em "El País", uma das raras jornalistas autorizadas a visitar o país.

Recuar nessa abertura seria revisitar um passado em que a fome matou mais de 1 milhão de pessoas, porque, "com a exceção parcial da indústria militar, as únicas partes da economia norte-coreana que funcionam são os mercados privados não oficiais", escreveu para "Foreign Affairs" Andrei Lankov (Kookmin University de Seul).

crossi@uol.com.br

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