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Grupo sírio faz sátira de ditadura com fantoches

DIOGO BERCITO
DE SÃO PAULO

Pistolas, rifles, metralhadoras. Nas mãos brutas do regime de Bashar Assad, nas mãos brutas dos insurgentes do Exército Livre da Síria.

Também nas mãozinhas dos fantoches do grupo Masasit Mati, coletivo de artistas sírios que escolheu, com a série "Top Goon" (grande valentão, em inglês), uma revolução pacífica, voltada ao diálogo sobre o país por vir.

"As vozes armadas podem falar mais alto, mas essa não é a sociedade que queremos criar", diz via Skype à Folha Jamil, diretor do grupo. Por questão de segurança, não revela sobrenome e localização.

"Não estamos fazendo a revolução em nome da morte. Estamos tentando ser pessoas melhores", afirma Jamil.

Na série, disponível no YouTube em árabe e com legendas em inglês, um ditador bobalhão chamado Beeshu ("Basharzinho") manda e desmanda em um país, em sátira clara do ditador sírio.

Com o boneco pouco sagaz, o grupo quer passar a ideia de que a "aura de Deus" em torno do ditador foi criada pelo próprio regime e é, assim, permitido rir dela.

"Queremos destruir o símbolo desse regime que está nos destruindo", diz Jamil.

Não que a série seja engraçadíssima -os episódios, com iluminação forte, contra um plano escuro, são em geral considerações irônicas a respeito do regime sírio.

Em um dos episódios, Assad tenta fugir da revolução. Arruma as malinhas, mas é detido por um de seus generais. "Depois de tudo o que fizemos, os massacres, as bombas, você está indo embora?"

"Somente os espertos sobrevivem", conclui Assad, após longa consideração sobre a ditadura. E vai embora.

CHÁ

Um item é constante no cenário frugal de "Top Goon": chá mate. "Masasit mati" é o canudo usado para beber a erva -típica nos Pampas e também no deserto sírio.

É a bebida, diz o diretor Jamil, que "une o povo sírio", já que é sorvida em grupo, durante conversas longas.

O grupo de artistas dirigido por ele tem sido apontado, ao lado do cartunista Ali Ferzat -espancado pelo regime de Assad, em 2011-, como uma das principais vozes pacíficas da insurgência.

"Queremos desmascarar o que está por trás do regime, além de dar a oportunidade para as pessoas tirarem folga das notícias terríveis", diz.

A primeira temporada de "Top Goon" foi financiada pelos próprios atores, filmada em esconderijos, com fantoches fofos sendo contrabandeados de um canto ao outro do país, fugindo da censura.

A segunda parte tem apoio de duas instituições holandesas, o Hivos e o Claus Fund.

DRAMA

Financiamento é uma das principais dificuldades para artistas na Síria. Especialmente para teatro, afirma Jamil.

Afinal, em um país em que o financiamento externo é escasso e o interno depende da aprovação do Estado, o dinheiro costuma estar atrelado a fugir da censura oficial.

"É muito trabalhoso. É preciso ser muito esperto para disfarçar o texto", diz Jamil.

A expectativa do diretor é, após a queda do regime, manter o grupo e, com menos obstáculos para a produção artística, lançar outros projetos.

O Masasit Mati reúne cerca de dez membros, além tradutores, entusiastas de mídias sociais, editores etc. A maioria está hoje na Síria.

A trilha sonora da segunda temporada foi composta por um grupo de fãs que moram nas Colinas de Golã.

"Fizemos a terra tremer com nossas vozes. Vá, chega de humilhação", diz a canção.

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