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Religiosos de orientação liberal buscam se contrapor aos cristãos conservadores, que apóiam a reeleição
Cristãos liberais ensaiam oposição a Bush
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Os cristãos de orientação liberal
tentam se organizar nos EUA para se contrapor a seus adversários
do cristianismo conservador, que
se fortaleceram politicamente durante o governo George W. Bush.
Mas os religiosos liberais não
têm uma liderança forte e estão
sem uma bandeira que mobilize o
eleitorado contra a reeleição do
atual presidente. É o diagnóstico
transmitido à Folha por quatro
estudiosos do núcleo de pesquisas
sobre religião e política da Apsa,
sigla em inglês da Associação
Americana de Ciência Política.
Uma primeira ressalva sobre as
estreitas relações entre Bush e esses grupos designados no meio
acadêmico como nova direita
cristã: o presidente praticamente
deve a eles sua eleição, já que, dos
votos dos cristãos conservadores,
88% foram para Bush nas primárias republicanas de 2000. É o que
nota Franklyn Niles, da Universidade John Brown, no Arizona.
Bush retribuiu ao se opor ao casamento entre homossexuais e ao
obter do Congresso uma lei que limitou o direito ao aborto, diz Andrew Murphy, da Universidade
de Valparaiso, em Indiana.
Mesmo assim, o presidente, diz
Niles, foi cuidadoso ao evitar ligar
a religião à sua política externa.
"No Oriente Médio seria desastroso falar em cristianismo", diz.
Outra maneira de relativizar a
aparente osmose entre política e
cristianismo de direita está nos
efeitos práticos da decisão que
Bush tomou nas primeiras semanas de governo, ao transferir para
entidades ligadas a igrejas parte
dos programas sociais financiados com verbas federais.
"O Congresso não liberou todas
as verbas desejadas pelo presidente", diz Paul Djupe, da Universidade Denison, em Ohio. Além
disso parte do dinheiro foi entregue a comunidades religiosas negras, que em geral não votam no
Partido Republicano, diz David
Campbell, da Universidade Notre
Dame, também em Indiana.
Mas a nova direita cristã sente-se bem representada pelo governo Bush e tentará reelegê-lo.
Já os cristãos adversários de
Bush estão desarmados, por mais
que façam barulho em seus sites
-há os Americanos Unidos pela
Separação da Igreja e do Estado e
a Rede de Liderança Clerical, que,
além de pastores, também reúne
padres, rabinos e imãs.
"A comunidade de fé tende a
reagir politicamente quando há
uma ameaça definida", diz
Franklyn Niles. Foi o caso da luta
pelos direitos civis nos anos 60.
Agora, no entanto, por mais que
haja uma percepção de que Bush
favorece bem mais os ricos que os
pobres, foram mantidos programas para famílias de baixa renda,
e o presidente se colocou a favor
da ação afirmativa. Ele foi moderado no conservadorismo.
Ou, conforme Paul Djupe, há
um paralelismo entre George W.
Bush e Ronald Reagan, nos anos
80. Ambos utilizaram grupos cristãos de direita para se eleger, sem
no entanto satisfazê-los plenamente nas mudanças institucionais que eles desejavam.
O que pode agora se tornar uma
bandeira conjunta para os cristãos liberais são os efeitos da
Guerra do Iraque, devido à morte
de centenas de soldados americanos. Antes que a guerra começasse, diz Andrew Murphy, ela despertava uma oposição quase unânime entre os ministros protestantes de orientação liberal.
É problemático, no entanto,
afirmar que a objeção à guerra foi
compartilhada pelas congregações. Em 1991, Murphy diz que
um estudo que ele conduziu mostrou que as congregações não
acompanharam seus pastores,
que se opunham ao projeto do
presidente George Bush (o pai) de
expulsar o então ditador iraquiano, Saddam Hussein, do Kuait.
Agora, diz ainda Murphy, "não
há certeza sobre o quanto esses
cristãos liberais têm influência ou
se estruturarão" para influir de
forma decisiva nas eleições. Mesmo porque o peso deles no Partido Democrata "nem chega perto
do peso que os cristãos conservadores têm com os republicanos".
Há ainda a questão da forma diferenciada com que conservadores e liberais intervêm no debate
político. Campbell diz que os liberais são mais reflexivos, menos
categóricos que os conservadores
(sobretudo pentecostais), que exprimem com um grau quase ingênuo de certeza aquilo que acreditam ser o bem ou o mal.
Essa forma de agir no campo
teológico ou político dá a eles uma
eficiência que os liberais dificilmente conseguem acompanhar.
Paralelamente, o pensamento
conservador é sempre mais religioso, enquanto o pensamento liberal está bem mais ligado a formas laicas de atuação social.
A laicidade está na base de uma
das novidades políticas que apareceram nos EUA há pouco mais
de um ano. Trata-se do Move-on,
articulação por meio da internet
que levou multidões a passeatas
contra a Guerra do Iraque desde o
final de 2002.
Foi uma demonstração de força
que hoje pode se tornar uma fraqueza para os cristãos liberais. O
Move-on é essencialmente laico e
é também formado por agnósticos, feministas e minorias sexuais,
aos quais os protestantes hesitariam em somar suas forças.
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