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No Pólo Norte, jogo do Kremlin é pesado
Em Murmansk, eleitores sofrem pressão de empresas e governantes indicados por Putin para votar amanhã em Medvedev
Às vésperas do pleito, preço dos serviços como luz e aquecimento foi reduzido; apesar de apoio grande ao governo, assédio incomoda
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A MURMANSK (RÚSSIA)
A sutileza governamental no
desempenho da tarefa de assegurar uma vitória expressiva
para o candidato do Kremlin à
Presidência da Rússia, Dmitri
Medvedev, parece diminuir de
forma diretamente proporcional à distância dos grandes centros urbanos. Foi o que a Folha
constatou no extremo norte do
país, em Murmansk.
"Capital do Pólo Norte",
maior cidade acima do Círculo
Polar Ártico, a gelada Murmansk apresenta ao observador toda sorte de desvios de
conduta de seus governantes.
Tanto o município quanto a região administrativa homônima
nele baseada são governados
por políticos pró-Kremlin.
"Um dia chegou uma carta
pedindo, nominalmente, o
meu comparecimento e o de
minha mulher às urnas. Três
semanas depois, chegou essa
aqui", disse Sacha Volodin, motorista de caminhão de 45 anos.
Enquanto ele mostrava a segunda convocação, seu celular
anunciou a chegada de uma
mensagem mostrando o engajamento dos empresários: a
operadora de telefonia MTS
chama "os russos a cumprir seu
dever" em um torpedo.
A alta abstenção é o pesadelo
do Kremlin, interessado em
dar legitimidade a Medvedev,
ungido pelo presidente Vladimir Putin como seu sucessor
escolhido. Mas perto do Pólo
Norte há sinais de manipulação do eleitorado, muito mais
evidentes do que em Moscou.
Preços reduzidos
Em Murmansk, as autoridades diminuíram pela primeira
vez na história o preço da taxa
que é cobrada pelos serviços
municipais: aquecimento, luz,
água e coleta de lixo. Um apartamento de um quarto é cobrado em R$ 170 mensais, e agora
paga a metade disso.
Detalhe: apenas em fevereiro. Segundo o prefeito Mikhail
Savchenko e o governador Iuri
Ievdokimov, ambos do partido
governista Rússia Unida, "a
medida não tem a ver com as
eleições, e sim é uma homenagem aos tempos excepcionais
pelos quais nosso país passa".
A prefeitura foi procurada,
mas não respondeu aos pedidos
de entrevista da reportagem.
Savchenko é considerado por
moradores da cidade como um
bom administrador, mas é acusado por adversários de integrar a chamada máfia nórdica,
que controla o porto da cidade e
o comércio com cidades da Noruega e Finlândia, países com
os quais a região de Murmansk
faz borda, na península de Kola.
Frota Norte
A cidade, com 320 mil habitantes, serve de base para a outrora poderosa Frota Norte da
Marinha Russa -ainda detentora de 42 submarinos, a maioria nuclear e oito deles capazes
de lançar mísseis intercontinentais, navios de combate e o
único porta-aviões do país, o
"Almirante Kuznetsov".
Assim, a presença de oficiais
e marinheiros é uma constante
em suas ruas. Gente como Alexander, um suboficial da frota
de submarinos que pede para
não ter seu sobrenome divulgado. Ele conta que uma prática
comum dos tempos soviéticos
foi revivida: os comandantes
dão "ordens" sobre em quem os
subalternos devem votar.
"Eu até acho que não há alternativa a Medvedev, mas é
muito estranha a forma como
as coisas acontecem", afirmou ele num café da avenida
Lênin, a principal da cidade e
que ainda ostenta uma estátua
do pai do comunismo soviético.
É uma forma de repetir aquele que é considerado por observadores internacionais o jeito
mais fácil de manipular a votação na Rússia, o uso de votos fora do domicílio eleitoral. Usando uma cédula de eleitor ausente, o cidadão é, digamos, estimulado a votar num local -como um centro comercial ou
uma estação de trem. Lá, membros dos partidos dão a "orientação" necessária.
Mas há outros fatores garantindo o apoio ao governo em
Murmansk, de resto os mesmos que dão ao governo de Vladimir Putin sua excepcional
aprovação de 70% junto à população: a economia. Em 2000,
Murmansk tinha cerca de 60%
de sua população ganhando
menos que 5.000 rublos (R$
354), segundo dados do governo. Agora, são menos de 20%, e
o PIB regional subiu no período
de aproximadamente 0,2% para 0,4% do total nacional.
"A vida de todo mundo melhorou. A gente vendia uns cinco celulares por dia há três
anos. Agora, são pelo menos
15", conta Andre Nikitschki, 24,
chefe de vendas da filial da rede
Evroset ao lado da estação de
trem de Murmansk.
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