São Paulo, domingo, 01 de maio de 2005 |
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ARTIGO Asilo não é arma política
LUIZ ALBERTO MONIZ BANDEIRA
Alguns jornais, em São Paulo e em Buenos Aires, publicaram que o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, irritou-se
com o "protagonismo" do presidente Lula na crise do Equador e
desaprovou a "oferta de asilo" feita ao ex-presidente Lucio Gutiérrez. Constou que no governo argentino considerou-se que esse tipo de decisão "deveria ter sido antes analisado em conjunto pelos
países da região", especialmente
com a Argentina. E o chanceler
Rafael Bielsa teria dito que "o problema do Equador é que todos os
atores são pecadores", e que a Argentina estava tratando do assunto na OEA, "que é o âmbito mais
adequado".
O Brasil não tem a prática de reconhecer formalmente cada governo que se instala em um país. As relações diplomáticas são estabelecidas e mantidas entre Estados. Caso o Brasil não queira reconhecer um governo, retira seu embaixador e toma as medidas que julgar necessárias. Também o Brasil, ao contrário do que escreveu o jornalista argentino Horácio Verbitsky, não "pretende conduzir qualquer coisa que aconteça na América do Sul", nem busca estabelecer qualquer hegemonia. Entretanto, queira ou não, o Brasil é uma potência regional, dada a sua enorme dimensão territorial, população e economia, e ademais tem fronteiras com todos os países da América do Sul, exceto Chile e Equador, com o qual, porém, partilha a estratégica região da Amazônia, para cuja defesa volta cada vez mais a atenção. Queira ou não, o Brasil é envolvido em qualquer acontecimento nos sete países (Bolívia, Equador, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana e Suriname), com os quais partilha a Amazônia, e tem a preocupação de contribuir para manter a estabilidade do subcontinente, com sua ação diplomática. Esse não é o caso da Argentina. O que sobretudo parece envenenar as suas relações com o Brasil é seu desejo de uma vaga como futuro membro permanente no Conselho de Segurança da ONU. Uma ilusão. Se houver reforma, ela provavelmente será pela fórmula que aumenta o número de membros permanentes e o Brasil é o candidato óbvio, apoiado já por quatro dos atuais permanentes, além da maioria significativa de membros das Nações Unidas. Dificilmente se escolherá o sistema de rotatividade, como a Argentina defende. E mesmo que fosse adotado, caberia ao Brasil rotatividade não com a Argentina, mas, embora muito remotamente, com o México, que possui quase três vezes a população e mais que o dobro do PIB argentinos. E, embora longe de Deus, está perto dos Estados Unidos. O cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira é professor emérito da Universidade de Brasília e autor de "As Relações Perigosas: Brasil-Estados Unidos de Collor a Lula, 1990-2004", "Brasil, Argentina e Estados Unidos" e "De Martí a Fidel: a Revolução Cubana e a América Latina". Texto Anterior: América Latina: Amorim e OEA concluem visitas a Quito Próximo Texto: Reino Unido: Desgastado, Blair caminha para reeleição Índice |
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