São Paulo, quinta-feira, 01 de julho de 2004

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NA REDE

Os Jarrars mostram o outro lado do conflito em seus diários on-line

Família de Bagdá "bloga" unida

SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL

"Bom dia. Hoje é feriado, dia de ficar em casa e fazer faxina. A situação em Bagdá está tensa, explosões se tornaram acontecimento cotidiano. Noite e dia eu peço a Alá para mandar sua vingança sobre os responsáveis."
Esta é a mãe, Faiza.
"A transição do governo aconteceu num pequeno abrigo num dos porões da Zona Verde. Bremer, o novo e feio "presidente" iraquiano, o "primeiro-ministro" agente da CIA e alguns poucos outros perdedores..."
Este é o filho mais velho, Raed.
"Estou finalmente em Amã. Uma viagem longa, 1.000 km, e tivemos de parar na alfândega jordaniana por seis horas..."
Este é o filho do meio, Khalid.
"Como você se sente quando sabe que sua vida está prestes a sofrer uma grande mudança? Fiz esta pergunta hoje, quando terminei a prova de química."
Este é o caçula, Majid.
Desde que o uso de internet foi liberado no Iraque, em maio de 2003, houve um pequeno boom de blogueiros escrevendo seus diários on-line, os web logs (blogs na abreviação), a partir principalmente de Bagdá. Apenas a família Jarrar responde por 10% dos que estão no ar.
A mãe assina "A Family in Baghdad", que ela escreve do PC de sua casa, num dos bairros classe média da capital. Xiita, Faiza é casada com o engenheiro Azzam, responsável pelo serviço de abastecimento de água em Bagdá. Como disse à Folha, "meu marido é o único da família não-interessado na rede".
O primogênito, 26, assina o "Raed in the Middle" e é o que goza de mais prestígio, por ser o interlocutor do mais famoso blogueiro de Bagdá, Salam Pax, pseudônimo de um arquiteto iraquiano que a certa altura da guerra viu seu diário virar a única fonte autóctone de notícias.
Fecham a lista Khalid (autor de "Secrets in Baghdad"), 21, que é sunita, fato raro entre famílias de pais xiitas, e o caçula Majid, 17, que atualiza diariamente o seu "Me Vs. Myself" e gosta de assinar "thE MajiTriX" ("já percebeu que sou fã, né?").
Ao colocarem as agruras e alegrias de seu cotidiano disponível on-line para o mundo inteiro ler, os Jarrars mostram uma outra face do conflito iraquiano, que a imprensa ocidental falha em capturar. A de uma família de classe média que, como outras, entre carros-bomba e retaliações, só quer viver em paz.
Assim, Faiza gosta de entremear suas entradas diárias com fotos banais como uma vitrine de loja de roupas femininas, um estande de celulares novos à venda e mesmo o gerador particular da família -amarelo.
Hoje, há cerca de 20 cibercafés em Bagdá, que cobram 1.500 dinares iraquianos (ou US$ 1) pela hora de uso. Os Jarrars recebem 50 e-mails cada um por dia -com uma média de 3.000 visitantes diários.
No começo da semana, Majid respondia a uma das perguntas mais comuns, sobre Saddam: "Pelo menos, ele era um ditador nacional. É melhor do que um fantoche iraquiano controlado por um ditador americano".


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