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NO BRASIL
Iraquianos dizem que voltariam com paz e a economia em ordem
Violência adia plano de retorno
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Mahir Saleh Hussein, 59, é
professor titular no Instituto de
Física da USP e o mais graduado
dos 150 a 250 iraquianos -as
estimativas divergem- que
imigraram nas últimas três décadas para o Brasil, época da ditadura de Saddam Hussein.
A instalação de um governo
provisório em Bagdá é a seu ver
um episódio irrelevante. "A
transição está sendo feita para
favorecer a reeleição de George
W. Bush e será politicamente
inócua e artificial", diz ele.
Outro iraquiano, Issan Mehan, 41, também de São Paulo,
diz que "não vai acontecer nada,
porque os americanos têm interesse em sugar ao máximo o petróleo", por meio de regimes
com autonomia de fachada.
Faisal Hussein, 57, irmão de
Mahir e engenheiro numa empresa paulistana, diz que 50% a
60% de seus compatriotas voltariam hoje ao Iraque, caso houvesse um mínimo de segurança.
Não daria esse passo com a mulher e os dois filhos sem o fim
dos atentados que tornam a vida no mínimo incerta para seus
outros familiares -tem muitos
primos e três irmãs em Bagdá.
Ayade al Samari, 42, que mora
no interior do Paraná, pensa do
mesmo jeito. "Só volto se a situação por lá melhorar. É um
país destruído, e por lá a economia não funciona."
Samari diz que o problema
não está apenas nos atentados
dos insurgentes. Há também as
ondas de prisão efetuadas pelos
americanos. Um parente seu,
relata, foi preso há mais de um
ano e até hoje a família não sabe
se haverá julgamento.
"As pessoas ficam presas três,
seis ou oito meses. Depois são
soltas sem que saibam as razões
da suspeita", afirma. Adversário
da ditadura deposta de Saddam,
ele não acredita que a queda do
antigo regime seja sinônimo no
Iraque de mais liberdade.
Mahir Saleh Hussein não pensa em voltar. Chegou ao Brasil
em 1972. Naturalizou-se brasileiro. Ele hoje integra um grupo
de expatriados que pressiona
para que o ensino superior de
seu país de origem volte a funcionar. Aceitaria passar um longo período em Bagdá, mas como professor convidado.
A ditadura acabou, mas a segurança interna está pior, diz
ele. Exemplifica com o caso de
uma de suas irmãs. Ela trabalhava como engenheira numa instituição de pesquisa sobre energia
solar. Perdeu o emprego nos
anos 80, depois da prisão do
marido, suspeito de simpatias
pelo Irã, com o qual o Iraque estava na época em guerra.
Emigrou para a Líbia. Quando
os americanos invadiram seu
país, tomou fôlego e voltou. Encontrou um emprego de secretária, distante de sua casa. Pediu
demissão por causa dos atentados cometidos nas regiões de
Bagdá obrigada a atravessar.
"Prefiro morrer de fome a
continuar a arriscar a minha vida", desabafou ela a familiares.
O professor da USP doutorou-se nos EUA e, depois de mudar
para São Paulo, voltou ao Iraque
quatro vezes para visitar familiares, a última delas ainda durante a ditadura.
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