|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTIGO
Não devemos queimar etapas
DOMINIQUE DE VILLEPIN
ESPECIAL PARA O ""LE MONDE"
Confrontada com a crise iraquiana, a comunidade internacional vive um momento decisivo de sua história. Cada país deve assumir suas responsabilidades. Mais
do que nunca, a França está decidida a manter um rumo claro.
Sim, o Iraque constitui uma
ameaça potencial à segurança regional e internacional. Sim, a luta
contra a proliferação das armas
de destruição em massa é essencial para nosso futuro. Sim, o Iraque desafiou a comunidade internacional ao dissimular os programas ligados a essas armas.
Diante disso, nosso dever é aliar
firmeza a lucidez. A mobilização
na luta contra o terrorismo já permitiu obter resultados. Com relação ao Iraque, devemos renovar
essa unidade em torno de uma
vontade comum: a luta contra a
proliferação das armas de destruição em massa. É essa a prioridade.
A França não nutre complacência
por Bagdá, mas uma ação que tivesse por objetivo uma mudança
de regime contradiria todas as regras do direito internacional.
Após discurso do presidente
George W. Bush em que ele reconheceu o papel primordial da
ONU, a discussão pôde ser retomada nesse âmbito, onde se chegou a um consenso amplo.
Diante de tal unidade, Bagdá
anunciou que aceitaria o retorno
incondicional dos inspetores internacionais. Seu trabalho deve
levar à eliminação de todas as armas de destruição em massa e impedir qualquer rearmamento futuro. Não nos esqueçamos de que
um número maior dessas armas
foi destruído pelas inspeções realizadas entre 1991 e 1998 do que
durante a Guerra do Golfo.
O perigo representado pelo Iraque ameaça todos os povos, sobretudo os do Oriente Médio. É
com eles que poderemos achar
uma solução durável. Esses países
avisaram que apoiarão uma ação
que for decidida pela ONU. Devemos ouvir a mensagem.
Hoje todas as atenções estão
voltadas às discussões que terão
lugar no Conselho de Segurança
(CS). O processo proposto pelo
presidente Jacques Chirac permite preservar a unidade da comunidade internacional, determinar
a legitimidade da ação e satisfazer
a nossa exigência de eficácia. O
Iraque deve respeitar as normas
da ONU; se se recusar a fazê-lo,
então será o caso de levar o fato às
últimas consequências.
Assim, é preciso chegar a um
entendimento, dentro do CS, sobre um regime de inspeções que
garanta que os inspetores possam
exercer sua missão integralmente.
Na hipótese de o regime iraquiano violar essas obrigações, caberia
ao CS agir. Não devemos queimar
etapas. Não queremos dar carta
branca a uma ação militar porque
queremos assumir nossa responsabilidade até o fim.
A França compartilha o desejo
dos EUA de resolver a crise. Mas
ela rejeita o risco de uma intervenção que não leve plenamente
em conta todas as exigências da
segurança coletiva. Além da crise,
são os princípios fundamentais
da comunidade internacional que
estão em jogo: estabilidade, equidade, responsabilidade.
A estabilidade continua a ser
uma exigência estratégica. Se o
desarmamento iraquiano constitui um imperativo, ele deve ser
feito em condições que reforcem a
ordem internacional, sem somar
novos fatores de desordem a uma
região que já os tem demais.
A equidade é o segundo pilar da
paz. No contexto da urgência e da
interdependência que marcam
nossa época, a injustiça criou a revolta, a revolta da desordem, e a
desordem gerou a violência, segundo um ciclo infernal que repercute de país em país, região
após região, continente após continente. No momento em que a
comunidade internacional quer
resolver o problema do desarmamento iraquiano, ela deve voltar
o mesmo olhar para crise do
Oriente Médio para poder encontrar o caminho da solução.
A responsabilidade coletiva
constitui, enfim, uma necessidade moral e política. Moral, porque as democracias perdem o
sentido se não respeitam no exterior os princípios nos quais se baseiam em seus próprios países.
Política, porque apenas decisões
tomadas de maneira coletiva possuem a legitimidade necessária a
uma ação em profundidade, coerente e eficaz. A força só pode
constituir um último recurso.
Dominique de Villepin é chanceler da
França
Tradução de Clara Allain
Texto Anterior: Rússia critica ações na zona de exclusão aérea Próximo Texto: Oriente Médio: Lei nos EUA vincula Jerusalém a Israel Índice
|