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UCRÂNIA
Apesar da popularidade internacional, Yushchenko enfrenta sérios problemas internos nove meses após eleição
Revolução Laranja ganha sabor amargo
ANDREW OSBORNE
DO "FINANCIAL TIMES"
O presidente ucraniano Viktor
Yushchenko será recebido com
festa pela rainha Elizabeth 2ª em
Londres, no mês que vem. Por seu
papel na Revolução Laranja, em
2004, que pôs fim a uma década
de autoritarismo, receberá do
Real Instituto de Assuntos Internacionais o Chatham House, prêmio pela "mais significativa contribuição para a melhora das relações internacionais".
O político veterano acostumou-se a aplausos internacionais desde
dezembro, quando reverteu uma
eleição manipulada ao levar milhares de manifestantes às ruas e
derrotou depois o rival em novo
pleito. A revista "Time" o pôs na
lista de cem pessoas mais influentes do mundo e ele teve substancial reconhecimento nos EUA.
Poucos dos líderes de antigas repúblicas soviéticas têm a chance
de disputar o Nobel da Paz, como
ele este ano. No entanto, Yushchenko parece ser vítima do mesmo problema que atingiu um passado vencedor do Nobel da Paz,
Mikhail Gorbatchov, admirado
no Ocidente por pôr fim ao comunismo de maneira pacífica
mas desprezado em seu país.
Na Ucrânia, muitos já começam
a acusar Yushchenko de trair os
ideais da revolução que liderou.
Alega-se que ele deixou de prestar
atenção aos problemas nacionais
e simplesmente substituiu uma
elite corrupta por outra. Diz-se
que ele fez amizade com as pessoas que combatia e não se distanciou o bastante dos métodos soviéticos do predecessor Leonid
Kuchma. Os críticos acham que a
revolução não dá sinais de que vá
cumprir as promessas iniciais.
A Anistia Internacional entrou
ontem na lista de críticos, com relatório que o acusa de não fazer o
suficiente para impedir a tortura e
a brutalidade policial.
Mais que as conclusões da Anistia, o que deve preocupar Yushchenko é o desencanto que aflige
muitos de seus partidários. O
principal problema é que o "governo laranja" deixou de existir.
Na primeira semana de setembro,
o presidente demitiu o ministério
inteiro, depois que membros de
seu gabinete começaram a se acusar mutuamente de corrupção.
A vítima mais notória foi a carismática mas controversa primeira-ministra Julia Tymoshenko. Os analistas argumentam que
a decisão de Yushchenko de demitir Tymoshenko, conhecida como "princesa laranja" pela aparência elegante e pelo papel decisivo em mobilizar multidões em
2004, custou apoio ao presidente.
Yushchenko continuou ontem
a nomeação de membros do novo
governo. O tecnocrata Yuri Yekhanurov, nascido na Rússia, assumiu como primeiro-ministro, e
Yushchenko agora terá de enfrentar a perspectiva de encontrar
Tymoshenko como adversária
nas eleições do final de março.
No passado aliados, os dois se
transformaram em amargos inimigos, e Tymoshenko não esconde que deseja o poder. No esforço
pelo terreno perdido, o presidente
assinou um acordo que parece
negar, de um só golpe, todo o propósito da revolução laranja.
Em essência, o objetivo da revolução era reverter a vitória propiciada por fraude eleitoral ao pró-russo Viktor Yanukovych. Muitos
dos que se reuniram na praça da
Independência, em Kiev, queriam
a detenção de Yanukovych por
fraude eleitoral e outros crimes.
Na semana passada, a TV ucraniana mostrou Yushchenko apertando a mão do antigo rival, depois de assinar com ele um acordo que lhe garantia 50 votos adicionais, a fim de obter a aprovação pelo Parlamento do novo primeiro-ministro. Aos olhos de
seus partidários decepcionados, o
preço que ele pagou pelos votos
foi alto demais, pois deu anistia legal a Yanukovych e seus aliados.
Muitos dos revolucionários originais queriam que Kuchma, predecessor de Yushchenko, fosse
julgado por suposta corrupção.
Para Tymoshenko, Kuchma escapou porque o presidente permitiu. Ela também acusa o antigo
chefe de saber sobre corrupção de
assessores e nada fazer.
Notícias como a do filho de 19
anos de Yushchenko ostentando
riqueza e a do assassinato de
Georgiy Gongadze, repórter que
investigava a suposta corrupção
do governo Kuchma, também
abalaram a popularidade do governo. Quanto aos números negativos da economia, Yushchenko
culpa Tymoshenko, que tinha papel importante na administração.
Ela diz que os números parecem
ruins porque, no passado, todos
os dados eram falsificados.
O presidente acusa a ex-colega
de usar o cargo para cancelar uma
dívida de US$ 1,5 bilhão de empresa para a qual trabalhava antes. É tudo bem diferente de 2004,
quando os dois andaram de mãos
dadas. A popularidade de ambos
caiu e, segundo o instituto de opinião Razumkov, "se aproxima
dos níveis característicos dos dias
finais do governo do ex-presidente Leonid Kuchma".
Yushchenko pode ter conquistado o respeito internacional, mas
se quiser reconquistar a simpatia
popular perdida em nove meses à
frente do país, terá muito a fazer.
Tradução de Paulo Migliacci
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