São Paulo, segunda-feira, 01 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Programa de notícias falsas vira fenômeno de mídia nesta eleição

LUCIANA COELHO
DE NOVA YORK

Pode ser sintomático: o maior fenômeno do noticiário americano nesta cobertura eleitoral é um programa cujo slogan (numa paródia à CNN) é "o melhor lugar para notícias falsas".
Exibido no pequeno canal a cabo Comedy Central (o mesmo de "South Park"), o "Daily Show com Jon Stewart" acumula cinco prêmios Emmy (o Oscar da TV) em cinco anos de existência e, graças à sua cobertura eleitoral, acaba de ganhar do jornal "The Washington Post" o arriscado epíteto de "fenômeno cultural".
Seu apresentador virou astro solicitado pelos talk shows da concorrência, e uma pesquisa mostrou que, entre os diversos programas noturnos na TV americana, seus espectadores são os mais bem informados politicamente.
O que seria motivo para comemoração por qualquer equipe de notícias, para os redatores e o apresentador do "Daily Show" soou como excesso de responsabilidade. Mesmo com audiência, repercussão -e segundo alguns analistas, influência- crescente, eles seguem insistindo que sua prioridade não é informar a platéia, e sim fazê-la rir.
"Não é verdade que nossos espectadores tiram informações do nosso programa", desconversou Stewart, 41, em um recente colóquio sobre o livro da equipe. O nome do volume -que desde o lançamento, há quatro semanas, encabeça a lista dos mais vendidos do "New York Times"- deixa pouca dúvida sobre as intenções do grupo: "América (O Livro) - Guia do Cidadão para a Inação Democrática".
"Nós assumimos que quem nos assiste já é bem informado", afirmou. "Hoje você é inundado por informações o tempo todo. As pessoas as absorvem por osmose. Em Nova York, tem gente tirando sua informação política dos letreiros eletrônicos que ficam no topo dos táxis."
Pode ser um argumento. De qualquer forma, assustou saber que a sátira sobre o noticiário exibida de segunda à quinta está ajudando muita gente a formar opinião. "A gente não sabe como isso aconteceu, mas isso nos deixou alarmados e aborrecidos", disse à Folha Tim Carvell, 31, um dos redatores do programa.
As luzes amarelas ascenderam no meio do ano, quando uma pesquisa do Pew Research Center mostrou que 17% dos americanos com menos de 30 anos dependiam dos programas de humor e talk shows noturnos para se informar politicamente.
No mês passado, um estudo do Annenberg Public Policy Center, da Universidade da Pensilvânia, mostrou que, dentre esses dois tipos de programa, a platéia do "Daily Show" era muito mais bem informada que a de sua soporífera concorrência. O que faz crer que, no mar de lama que tomou a campanha presidencial dos EUA, o programa não precisa mais fazer ficção para fazer piada.


Texto Anterior: Para analista, região não é prioritária
Próximo Texto: "Bush dá mais material do que precisamos"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.