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SOCIEDADE
Hospital do país revela que já adota a prática em recém-nascidos sem condições de sobrevida; católicos protestam
Holanda discute liberar eutanásia em bebê
TOBY STERLING
DA ASSOCIATED PRESS, EM AMSTERDÃ
Intensificando discussão ética
dificílima, um hospital na Holanda, o primeiro país a autorizar a
eutanásia, propôs recentemente
que sejam traçadas diretrizes para
a realização de eutanásia em recém-nascidos doentes terminais.
O hospital revelou que já realiza
procedimentos desse tipo e os informa ao governo.
O anúncio foi feito no mês passado pelo Hospital Acadêmico
Groningen, em meio a uma discussão crescente na Holanda sobre a legalização da prática da eutanásia em pessoas incapazes de
decidir por conta própria se querem ou não pôr fim a suas vidas. A
perspectiva é vista com horror pelos adversários da eutanásia, mas
encarada como evolução natural
pelos defensores da prática.
Em agosto, a principal associação médica holandesa, KNMB,
exortou o Ministério da Saúde a
criar um conselho independente
para rever os casos de eutanásia
envolvendo doentes terminais
"destituídos de livre arbítrio", entre eles crianças, portadores de
deficiências mentais graves e pessoas em estado de coma irreversível em decorrência de acidentes.
Um porta-voz do Ministério da
Saúde disse que o ministério está
preparando uma resposta ao pedido da KNMB e que essa resposta pode sair já neste mês.
O Protocolo de Groningen, como as diretrizes passaram a ser
conhecidas, criaria um quadro legal dentro do qual médicos poderiam pôr fim à vida de neonatos
que sofressem dores semelhantes
por conta de doenças incuráveis
ou deformidades extremas.
Organizações católicas e o Vaticano reagiram com ultraje ao
anúncio do hospital de Groningen e os adversários americanos
da eutanásia afirmaram que a
proposta mostra que os holandeses perderam seu norte moral.
"Na Holanda, o declive escorregadio [de uma decisão moral difícil] já virou abismo vertical", declarou Wesley J. Smith, conhecido
crítico da eutanásia residente na
Califórnia, em e-mail enviado à
agência Associated Press. ""É desnecessário dizer que matar bebês
é errado. Isso é algo que costumava ser conhecido como uma verdade auto-evidente."
O hospital anunciou ter realizado quatro "mortes por misericórdia" desse tipo em 2003 e ter reportado todos os casos a promotores do governo. Mas nenhum
procedimento legal foi aberto
contra o hospital.
A eutanásia em crianças ainda é
ilegal em todo o mundo. Especialistas afirmam que, fora da Holanda, os médicos não informam as
autoridades desses casos, por temer serem alvos da justiça.
"Do jeito como as coisas estão,
as pessoas fazem isso secretamente, e isso é errado", disse Eduard
Verhagen, diretor da clínica infantil do Groningen. "Nós, na Holanda, queremos expor tudo, queremos que tudo seja sujeito a escrutínio e aprovação."
De acordo com o Ministério da
Justiça, quatro casos de eutanásia
infantil foram comunicados a
promotores em 2003. Dois foram
relatados em 2002, sete em 2001 e
cinco em 2000. O hospital Groningen estima que o protocolo seria aplicável em cerca de dez casos
por ano na Holanda, que tem 16
milhões de habitantes.
A Holanda já recorre a comitês
independentes para rever os casos
de eutanásia em adultos e submeter ao Ministério da Justiça os incidentes em que existe a possibilidade de atuação médica imprópria. Dos aproximadamente 5.700
casos de eutanásia adulta notificados desde 2001, quando entrou
em vigor a lei que autoriza a eutanásia, 32 foram encaminhados a
promotores. Desses 32, cinco resultaram em inquéritos criminais,
um dos quais levou a um processo
criminal que está em andamento.
O Protocolo de Groningen considera a eutanásia aceitável quando a equipe médica encarregada
de uma criança e médicos independentes consultados concordam que não há meios de aliviar a
dor do paciente e que, portanto,
não há perspectivas de melhora. É
necessário também que os pais
concordem com a eutanásia.
O hospital diz que "essas crianças, cuja dor é impossível de ser
aplacada, podem ser libertas de
sofrimento terrível e incurável".
Para o crítico Wesley Smith, no
entanto, "se chegarmos a acreditar que matar é resposta justificada ao sofrimento humano, então
teremos colocado de ponta-cabeça o conceito da igualdade e dos
direitos humanos universais".
Tradução de Clara Allain
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