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ANÁLISE
Conflito testa a doutrina Rumsfeld
MICHAEL R. GORDON
DO "THE NEW YORK TIMES"
Desde o dia em que assumiu como secretário da Defesa, Donald
Rumsfeld vem tentando mudar a
natureza da defesa dos EUA. As
Forças Armadas que ele deseja
criar são mais móveis, capazes de
atacar com armas de precisão a
longa distância e tiram plena vantagem de sofisticados sistemas de
reconhecimento.
Mas cerca de duas semanas depois do início da guerra contra o
Iraque, um coro crescente de críticos acusa o fracasso dos princípios de Rumsfeld no Iraque. Os
céticos, que incluem alguns dos
principais comandantes do Exército, hoje na reserva, na última
guerra contra o Iraque, em 1991,
dizem que a força que os EUA
deslocaram não é grande o suficiente para começar uma batalha
decisiva por Bagdá enquanto protege as linhas de suprimento cada
vez mais longas e controla o território iraquiano ocupado.
"As suposições estavam erradas", diz o general Barry McCaffrey, reformado, que comandou a
24ª Divisão Mecanizada em seu
avanço pelo vale do Eufrates a fim
de combater a Guarda Republicana na Guerra do Golfo. "Há uma
idéia de que a natureza da guerra
mudou totalmente, que os números não importam mais, que blindados e artilharia não importam.
Entraram em combate com um
plano que colocava em ação uma
força aérea e marítima imensa,
mas dependia de uma força de
combate terrestre insuficiente".
O conflito com o Iraque também não tem por objetivo apenas
derrubar Saddam Hussein. Também pretende estabelecer uma
nova lição militar. O paradigma
que Rumsfeld defende se baseia
no poder aéreo e na agilidade das
forças especiais, mas prevê papel
menor para as divisões blindadas
pesadas do Exército.
Uma avaliação final da estratégia terá de esperar a batalha por
Bagdá. O que ninguém contesta é
que a força que hoje combate no
Iraque é fundamentalmente diferente da usada na Guerra do Golfo. A doutrina aplicada em 1991 se
baseava em força esmagadora.
Naquele conflito, o Pentágono enviou ao general Norman Schwarzkopf forças que ele nem sequer
solicitara. Uma das prioridades
era reduzir os riscos ao mínimo.
Quando chegou a guerra, ela começou com uma campanha de
bombardeio aéreo de 39 dias. Depois, uma força de combate terrestre de mais de 500 mil soldados
entrou em ação. A idéia era acumular poder de combate, derrotar
o inimigo e depois deixar o teatro
de guerra rapidamente, um conceito que veio a ser conhecido como Doutrina Powell, concebida
pelo general Colin M. Powell, então chefe do Estado-Maior Conjunto e hoje secretário de Estado.
Agora, no entanto, a força é
muito menor, cerca de 180 mil
soldados, mais da metade já no
interior do Iraque. E o ataque terrestre precedeu o principal ataque
aéreo, uma reversão estratégica
que os comandantes dizem ter sido necessária para manter a surpresa e capturar o campo petroleiro de Rumaila, mas que aumentou os riscos.
Quando a guerra começou, as
forças terrestres norte-americanas eram uma força modesta dada a natureza ambiciosa da missão norte-americana: abrir caminho até Bagdá, que é defendida
por cerca de seis divisões da Guarda Republicana, derrubar o regime de Saddam Hussein, enfrentar
as unidades paramilitares e outras
forças do regime nas cidades e aldeias e estabelecer a ordem.
A força também estava sendo
empregada de maneira muito diferente. Em lugar de primeiro
concentrar um poderio considerável e depois começar os combates, a invasão começou quando as
forças ainda estavam chegando
ao Kuait, um conceito conhecido
como "partida rolante".
A idéia era que se a guerra provasse ser mais difícil do que o esperado, as forças continuariam
chegando ao Kuait. Mas se o regime iraquiano fosse rapidamente
derrubado, os reforços seriam
cancelados. O Pentágono diz que
essa abordagem oferece o máximo de flexibilidade. Mas o tema
de uma escalada gradual representa um rompimento da doutrina militar posterior ao Vietnã.
A adoção desse conceito aconteceu após surgirem dificuldades
entre Rumsfeld e o comando do
Exército. Ele parece encarar o
Exército como a menos receptiva
a mudanças dentre as forças.
Vantagens
A abordagem de Rumsfeld, dizem seus defensores, tem vantagens. Foi concebida para tirar o
máximo de vantagem da superioridade aérea dos EUA e, ao evitar
uma concentração imensa, reduziu muito o tempo necessário a
enviar uma grande força ao Golfo.
Loren Thompson, analista de
defesa, concorda: "Creio que esse
seja o futuro. Acho que a guerra se
encaminha nessa direção. Não se
pode deslocar forças terrestres
com rapidez".
Alguns ex-comandantes do
Exército estão falando publicamente que jamais acreditaram
muito na idéia de "choque e pavor", os ataques aéreos para paralisar o governo iraquiano. Eles dizem que a força enviada ao Kuait
precisa de mais artilharia, tanques
e veículos de combate Bradley para enfrentar a Guarda Republicana. E alegam que mais forças facilitariam ao Exército proteger suas
longas linhas de suprimentos e
enfrentar os paramilitares ao sul.
Além de enfrentar a Guarda Republicana, o Exército está invadindo cidades no sul à procura de
unidades paramilitares. Está encarregado de proteger as linhas de
suprimentos. Tem de transportar
os suprimentos necessários aos
ataques contra Bagdá, tarefas que
exigem muitos soldados.
Ironia
A ironia, asseveram os críticos, é
que a força de Rumsfeld não é tão
ágil quanto ele sugere.
Ela pode ser deslocada rapidamente, dizem, mas é tão limitada
em número que precisa executar
as tarefas em fases, o que prolonga a guerra. Uma força maior, alegam, seria mais capaz de manter o
ritmo de ataque acelerado.
Na análise final, a guerra não é
só uma batalha para derrubar um
ditador. É uma experiência gigante para determinar que forças podem ser mais úteis no futuro.
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