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Avanços tecnológicos desafiam Convenções de Genebra
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Após 13 dias de guerra, uma
constatação já pode ser feita: as
Convenções de Genebra, criadas
em 1949 para evitar que os horrores das grandes guerras se repetissem, não estão adaptadas aos
avanços da tecnologia contemporânea, que permitem que a mídia
mostre ao vivo cenas do front.
Imagens de militares americanos sendo exibidos às câmeras da
TV iraquiana depois de sua captura em combate e de soldados
iraquianos forçados, pelo Exército inimigo, a ajoelhar-se após sua
rendição intensificaram as discussões sobre as leis internacionais de guerra. Já há até quem diga que as tão propaladas convenções deveriam ser modificadas
para adaptar-se ao contexto atual.
"Talvez as convenções pudessem sofrer pequenas alterações
para evitar controvérsias. Afinal,
se o rosto dos prisioneiros de
guerra não fosse mostrado e eles
fossem tratados de modo humano, as imagens de sua prisão por
forças inimigas poderiam não gerar tantas críticas", opinou Christopher Joyner, especialista em direito internacional da Universidade de Georgetown (EUA).
Todavia, para Allan Ryan, da
Universidade Harvard (EUA), as
Convenções de Genebra não precisam ser modificadas. "A mídia
mostra hoje cenas que não eram
vistas no passado. No entanto isso
não significa que as leis de guerra
devam adaptar-se aos avanços
tecnológicos, passando a permitir
certos abusos", afirmou Ryan.
As quatro convenções são relativas aos direitos dos civis em zonas de conflito, aos dos prisioneiros capturados em combate e às
obrigações das autoridades militares. A controvérsia foi gerada
pela Terceira Convenção de Genebra, já que um de seus artigos
diz que os prisioneiros de guerra
não devem ser "alvo de violência
ou de intimidação" e precisam ser
protegidos "de insultos e da curiosidade pública".
O Comitê Internacional da Cruz
Vermelha mostra-se inflexível
quanto aos direitos do presos. "As
Convenções de Genebra proíbem
a publicação de imagens de prisioneiros de guerra. Elas se aplicam a todas as partes envolvidas
no conflito atual", declarou Tamara al Rifai, porta-voz do CICV.
O presidente George W. Bush,
por sua vez, afirmou que considerará criminosos de guerra aqueles
que maltratarem militares americanos detidos. Mas os especialistas ouvidos pela Folha ressaltaram que só as violações verdadeiramente graves podem ser classificadas de "crimes de guerra".
Para Joyner, o espírito das Convenções de Genebra visa sobretudo resguardar a dignidade dos
prisioneiros. "É por isso que digo
que uma pequena alteração permitiria que os presos fossem exibidos desde que estivessem sendo
bem tratados. Os avanços tecnológicos devem ser levados em
conta pela Justiça internacional."
Organizações de defesa dos direitos humanos acusam os EUA
de violar leis internacionais ao
não aplicar as convenções aos
combatentes do Taleban ou da rede Al Qaeda detidos durante a
campanha militar no Afeganistão. Washington argumenta que
elas não se aplicam aos presos
porque eles não faziam parte do
Exército regular do Afeganistão.
Outra preocupação dos analistas diz respeito às forças irregulares iraquianas. "Como se trata de
um conflito clássico, que opõe um
Estado a outros, esses homens deverão ser considerados prisioneiros de guerra. Mas, quando portam roupas civis e atacam o inimigo, eles cometem uma violação às
leis de guerra", apontou Joyner.
De qualquer modo, como lembrou Charles Tilly, da Universidade Columbia (EUA), "o debate é
positivo". "No passado, ocorriam
violações às Convenções de Genebra, porém longe das TVs."
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