São Paulo, quinta-feira, 02 de setembro de 2004

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Ambiente em Moscou é de medo e resignação

DAVID McHUGH
DA ASSOCIATED PRESS, EM MOSCOU

Na manhã seguinte à explosão suicida que deixou dez mortos diante de uma estação de metrô, a reportagem principal da TV controlada pelo governo foi a cobertura bem humorada do primeiro dia de aula do novo ano escolar.
Mas a reportagem em clima positivo assumiu um ar de ironia sombria quando, na metade da manhã, chegou a notícia da tomada de reféns numa escola.
Enquanto o governo afirma que a situação na rebelde Tchetchênia se está estabilizando, os cidadãos russos comuns, após uma semana de violência aparentemente ligada à causa tchetchena, não acreditam na versão oficial. O sentimento dominante é um misto de medo, desafio e fatalismo.
"É claro que sinto medo", disse Olga Gorbunova, 50 anos, vendedora de um quiosque pequeno na estação de metrô de Rizhskaya, a poucos metros de distância do asfalto queimado que marca o lugar onde a bomba explodiu.
Com ou sem medo, porém, ela compareceu ao trabalho. "Um ataque terrorista pode acontecer em qualquer lugar, numa estação, uma loja. Não podemos ter nossa segurança assegurada", explicou.
Esse misto de mal-estar e sentimento de impotência caracterizou comentários de muitos russos ontem, especialmente dos que paravam para um momento de contemplação no local da explosão, que foi recoberto de flores.
Poucos acreditam na versão governamental de que o período de dez anos de anarquia e choques na Tchetchênia teria chegado ao fim com a eleição, no domingo, do líder pró-Kremlin Alu Alkhanov para comandar a região.
Mas são também poucos os que culpam o governo de Vladimir Putin pelos problemas ou se propõem a fazer qualquer coisa que não seja enfrentar a situação com a obstinação e a resignação fomentadas por cinco anos de ataques terroristas que começaram com o bombardeio de edifícios de apartamentos em Moscou e outras cidades, em 1999, que deixaram mais de 300 mortos.
Os atos mais recentes de violência começaram na semana passada, com a queda simultânea de dois aviões comerciais.
"As primeiras explosões foram assustadoras, mas agora elas já não metem medo", comentou Tamara Khomko, 46 anos, dona de uma pequena quitanda. Ela mora tão perto de um dos locais das explosões de 1999 que seu prédio chegou a sacudir. "Eu sinto pelas pessoas, sofro por elas. Mas já nos acostumamos com isso.'"
"Vivendo numa cidade tão grande, uma megalópole, não sentimos medo, assim como os moradores de Nova York não têm medo", comentou Ivan Blynsky, 42, pintor de paisagens e retratos. "As pessoas se acostumam a enfrentar fatos lamentáveis. A causa está clara: é a Tchetchênia."
Diante da pergunta clássica na Rússia -de quem é a culpa?-, alguns criticam o governo e outros, os rebeldes tchetchenos. "Eu os odeio", disse um homem que se identificou apenas como oficial militar. "Eu os mataria com minhas próprias mãos."


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