São Paulo, quinta-feira, 02 de setembro de 2004

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Putin chegou a impasse, diz analista

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Vladimir Putin está num beco sem saída. Desconhece o tamanho e a estrutura de organização do terrorismo tchetcheno que há anos quer destruir.
Quanto aos rebeldes, eles formam uma colcha de retalhos desprovida de um claro objetivo político. Com ações como o seqüestro de escolares na Ossétia do Norte, descredenciam-se para negociar uma saída à crise com Moscou.
É o diagnóstico pessimista de Oksana Antonenko, pesquisadora, em Londres, do IISS (Instituto Internacional para Estudos Estratégicos). Eis os principais trechos de sua entrevista.
 

Folha - Há alguma dúvida de que há uma escalada tchetchena?
Oksana Antonenko -
Os últimos atentados fazem parte de uma campanha coordenada. Os grupos tchetchenos continuam divididos e fragmentados. Mas conseguem demonstrar o quanto a Rússia é vulnerável.

Folha - As Brigadas Istambuli reivindicaram os explosivos nos Tupolev. Estariam atrás do seqüestro?
Antonenko -
Eles são um grupo minúsculo, com operações sobretudo no Paquistão e no Egito. Creio que só emprestaram o web site para que os tchetchenos reivindicassem a queda dos aviões.

Folha - Como se organiza o movimento rebelde tchetcheno?
Antonenko -
Eles formam uma colcha de retalhos, cujas peças e contornos são desconhecidos até da polícia russa, que está hoje impossibilitada de reprimi-los com chances de sucesso.

Folha - Eles estão unidos? Têm um projeto político coerente?
Antonenko -
As autoridades russas têm o interesse em divulgar que a organização está mais ou menos vinculada à Al Qaeda. Mas acredito que não estejamos diante de um 11 de Setembro. As células não têm uma clara demanda política, o que é ruim, porque as autoridades russas não têm como negociar. Para qualquer governante é inaceitável negociar a autonomia de uma região com quem seqüestra crianças.

Folha - Há como desmantelá-los?
Antonenko -
Não creio. E há ainda a insatisfação dos próprios russos com a política "dura" que Putin imprimiu. Putin é um homem poderoso. Mas os russos sabem que ele fracassou e que hoje vivem na insegurança.

Folha - Há um jeito de pôr fim à escalada?
Antonenko -
Putin e seu governo estão num impasse. Antes que ele chegasse ao poder, os grupos tchetchenos estavam muito mais consolidados e identificáveis. As iniciativas dos radicais são agora imprevisíveis.

Folha - E os moderados?
Antonenko -
Eles perderam espaço. O financiamento no mundo árabe favorece os radicais.

Folha - Quantos grupos poderíamos identificar?
Antonenko -
Ninguém sabe ao certo, nem mesmo os próprios tchetchenos com relação aos grupúsculos que atuam dentro da Rússia. Se os serviços de segurança russos tivessem uma resposta eles poderiam prevenir atentados.

Folha - Haveria uma solução política para a Tchetchênia?
Antonenko -
Estou pessimista. Mesmo que Putin decida abandonar sua diretriz repressiva, que não está funcionando, ele não disporia de uma alternativa com credibilidade. Os terroristas estão tão fragmentados que demoraria anos para que se costurasse algum esboço de acordo.

Folha - Há clareza quanto aos objetivos básicos desses grupos?
Antonenko -
Não. Há setores que querem a independência completa da Tchetchênia, outros que aceitam alguma forma de convivência com a Rússia.


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