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TRAGÉDIA NOS EUA
Suspeitas de desvio de fundos e de favorecimento de grupos ligados ao governo pesam sobre reconstrução
Contratos pós-Katrina são contestados
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Suspeitas de desvio de fundos,
de favorecimento de grupos ligados a influentes personalidades
políticas e de fraude têm-se multiplicado nas últimas semanas em
acalorados debates, até mesmo no
Congresso dos EUA, sobre contratos fechados com empresas
privadas para ajudar os sobreviventes ao furacão Katrina, que devastou uma grande área do sul do
país e matou mais de mil pessoas.
Autoridades defendem-se das
acusações e afirmam que, em situações emergenciais, a lei permite que contratos sem licitação pública sejam fechados -para atenuar os efeitos das catástrofes- e
que controlarão estritamente o
modo como o dinheiro previsto
nos contratos será despendido.
Organizações de defesa dos direitos civis e de monitoração de
ações governamentais sustentam,
contudo, que, embora não seja
ilegal, a prática de atribuir contratos sem licitação pública é contrária a padrões adotados pelo governo federal em qualquer caso.
"É verdade que a concessão de
contratos em situação de emergência pode ser efetuada sem base
em licitações abertas, de natureza
competitiva. No entanto há um
padrão que foi adotado há muito
tempo pelo governo federal que
prevê que qualquer contrato deve
passar por uma disputa transparente entre as empresas interessadas em obtê-lo", explicou à Folha
Alex Knott, do Centro por Integridade Pública, entidade sediada
em Washington que monitora
gastos governamentais nos EUA.
"Essa exigência tácita existe por
duas razões básicas. Primeiro, ela
assegura que o Estado conseguirá
o preço mais justo pelos produtos
ou pelos serviços que pretende
adquirir. Segundo, ela permite
que o governo e os cidadãos por
ele beneficiados recebam os melhores produtos possíveis de seus
fornecedores", acrescentou.
Segundo o diário "The New
York Times", cerca de 80% dos
contratos concedidos pela Fema
(Agência Federal de Administração de Emergências) desde 29 de
agosto, dia em que o Katrina chegou a Nova Orleans como um furacão de categoria quatro, foram
atribuídos sem licitação ou com
um número limitado de ofertas. O
valor total desses contratos gira
em torno de US$ 1,5 bilhão.
Na última quarta-feira, o "Washington Post" deu destaque a um
contrato de US$ 239 milhões firmado com a empresa Carnival
Cruise Lines para alojar desabrigados durante seis meses em três
de seus navios de cruzeiro.
Estes estão hoje, de acordo com
o jornal, com metade de sua capacidade ociosa. Mesmo que estivessem cheios, porém, a situação
ainda seria grave. Afinal, o preço
semanal pago pelo governo federal seria de US$ 1.275 por pessoa,
enquanto um cruzeiro de uma semana pela região custa menos de
US$ 600, segundo a mesma fonte.
"Não sei se se trata de algo imoral. Com certeza, todavia, não é o
método apropriado de fazer esse
tipo de negociação num país democrático. Normalmente, os contratos devem ser firmados com
base no que é melhor para o interesse público, e a ausência de licitações não é o melhor método.
Assim, tudo indica que parte dos
contratos foi atribuída de modo
questionável", afirmou Knott.
Entre as empresas favorecidas
está a AshBritt, que é ligada ao governador do Mississippi, o republicano Haley Barbour. Ela recebeu um contrato de US$ 568 milhões para fazer a limpeza de áreas
atingidas pelo Katrina. O valor é
considerado excessivo por especialistas do setor ambiental.
Outras acusações de favorecimento pesam sobre duas empresas que já respondem por vultosos contratos para a reconstrução
do Iraque: a Halliburton, que teve
o vice-presidente Dick Cheney
em seu comando de 1995 a 2000, e
a Bechtel, que conta com o ex-secretário de Estado George Shultz
em seu conselho de diretores.
A Kellog, Brown & Root, subsidiária da Halliburton já acusada
de superfaturar serviços no Iraque, recebeu um contrato (com licitação) de US$ 16 milhões para
drenar regiões alagadas, mas seu
valor é considerado excessivo.
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