São Paulo, quarta-feira, 03 de julho de 2002

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ESTUDO

Metade das mulheres árabes não são alfabetizadas

Falta de liberdade imobiliza países árabes, afirma relatório da ONU

DO "THE NEW YORK TIMES"

Um relatório encomendado pela ONU e redigido por intelectuais árabes avisa que as sociedades árabes estão sendo imobilizadas por causa da ausência de liberdade política, da opressão sobre as mulheres e do isolamento do mundo das idéias, todos fatores que sufocam a criatividade.
Intitulado Relatório de Desenvolvimento Humano Árabe 2002, o documento foi divulgado ontem no Cairo. Ele nota que, embora a renda com o petróleo tenha modificado as paisagens de alguns países árabes, a região permanece ""mais rica do que é desenvolvida". Nos últimos 20 anos, a renda per capita caiu para um nível pouco superior ao da África subsaariana. A produtividade está em queda. O setor de pesquisas e desenvolvimento é fraco ou inexistente. A ciência e a tecnologia estão dormentes.
Os intelectuais fogem do ambiente político e social estagnado, quando não repressivo, diz o relatório. As mulheres árabes teriam seu progresso negado em quase todos os países. Metade delas ainda não sabe ler ou escrever. O índice de mortalidade materna é duas vezes maior que o latino-americano e quatro vezes superior ao da Ásia oriental. ""Infelizmente, a maior parte do mundo árabe se priva da criatividade e produtividade de metade de seus cidadãos", concluiu o relatório.
O planejamento para o relatório começou há mais de um ano, ""quando sentimos que existe um problema sério de desenvolvimento nos países árabes", disse Rima Khalaf Hunaidi, diretora do departamento árabe do Programa de Desenvolvimento da ONU. ""Havia sinais muito assustadores que eram específicos dos árabes."
Primeiro relatório do Programa de Desenvolvimento da ONU dedicado a uma única região, ele foi redigido por intelectuais árabes que não atribuem a outros a culpa pelo que vêem como sendo ""déficits" da cultura árabe contemporânea, disse Khalaf Hunaidi, ex-vice-premiê da Jordânia. Ela disse que pediu aos autores que estudassem a pergunta: ""Por que a cultura e os países árabes estão ficando para trás?". Há 280 milhões de pessoas nos 22 países árabes cobertos pelo relatório, co-patrocinado pela Liga Árabe. A previsão é de que o número de árabes atinja entre 410 milhões e 459 milhões até o ano 2020.
O relatório não tece críticas diretas à militância islâmica extremista e aos efeitos dela sobre o crescimento intelectual e econômico, mas Khalaf Hunaidi disse que essa crítica está implícita nos trechos que fazem referência ao ambiente social menos tolerante.
O uso da internet é pequeno nos países árabes. O cinema parece estar encolhendo. Os autores do relatório falam de uma ""escassez acentuada" de novos textos e de obras estrangeiras traduzidas. ""Só cerca de 330 livros do mundo externo são traduzidos anualmente em todo o mundo árabe -um quinto do número traduzido na Grécia", diz o relatório.
Fouad Ajami, diretor de Estudos do Oriente Médio na Universidade Johns Hopkins, disse, em entrevista, que existe uma percepção generalizada de que a vida no mundo árabe é reprimida, tanto pelo Estado quanto pelos guardiães da moral religiosa. ""Os árabes se sentem vigiados", disse ele, atribuindo a ausência cada vez maior de liberdade intelectual ao crescente poder de uma classe média baixa cujos integrantes são alfabetizados, mas pouco instruídos. Este grupo, diz ele, ""manifesta sua falta de tolerância com qualquer pessoa ou setor de espírito livre, qualquer dissidência, qualquer diferença". Para Ajami, a única opção que restou para muitos intelectuais foi o exílio.



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