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Árabes de Israel se aliam aos palestinos
PHIL REEVES
DO "THE INDEPENDENT", EM UM AL FAHEM
Além de seu nome, há duas coisas que chamam a atenção imediatamente em Nakad Nakad. A
primeira é seu jeito de ser caloroso. A segunda, a vontade de falar
sobre seu ferimento. Mal acabáramos de apertar as mãos, e ele já erguia a calça para me mostrar um
ferimento feio na panturrilha.
"Foi uma bala de borracha da
polícia", explica. "Não estávamos
fazendo nada, apenas estávamos
parados na rua, quando, de repente, a polícia ficou maluca e
bam-bam-bam!" Nakad me descreveu o acontecido num tom de
voz extremamente prosaico. Não
é a primeira vez em que é ferido
por policiais israelenses. Mas admite que sua perna dói muito.
Nakad é um árabe israelense,
ou, como a maioria prefere ser
descrita, palestino com cidadania
israelense. Eles são 1,1 milhão dos
6,2 milhões de habitantes de Israel, uma minoria problemática
que não deve ser confundida com
os palestinos da faixa de Gaza ou
da Cisjordânia.
Os primeiros vivem dentro das
fronteiras de Israel, têm passaportes e direito ao voto. Os últimos
travam uma luta interminável para convencer os israelenses a devolver uma parte suficientemente
grande de seu território -ocupado desde 1967- para que possam
criar um Estado próprio.
Nakad é líder do ramo estudantil do partido árabe Hadash e
exerce papel ativo na política. A
mídia israelense vem dizendo que
a população árabe está cada vez
mais irada e militante.
A violência em Gaza e Cisjordânia transbordou para fora dos territórios ocupados e chegou às cidades e vilas árabes em Israel,
com consequências fatais. Os tumultos chegaram até mesmo à cidade costeira de Haifa, que há
muito se gaba da convivência pacífica de árabes e judeus.
Pela primeira vez desde 1976,
quando seis árabes israelenses
morreram em protestos por questões fundiárias, tropas de segurança israelenses colocaram munição real em suas armas e mataram cidadãos árabes de seu próprio país.
Uma das áreas mais atingidas
pela violência foi Um al Fahem,
cidade de cerca de 35 mil árabes
situada ao lado da fronteira israelense pré-1967, onde vários milhares de jovens atiraram pedras e
bombas de gasolina, enquanto
policiais israelenses abriam fogo.
Com os preparativos para o enterro de uma vítima da violência
começando num estádio de futebol visível de sua janela e bandeiras negras tremulando nos telhados vizinhos, o jornalista Mohammed Ahmad Jabarin, 24, oferece uma explicação sombria para
a explosão de violência.
"O problema principal é que
sentimos que, na condição de árabes, não temos status no Estado
judaico. Nos últimos quatro anos,
confiscaram nossas terras e demoliram nossas casas, que, alegam, foram construídas sem alvarás. Mas não sabemos onde nos
situamos sob a lei judaica. O estranho é que falamos o hebraico
melhor do que a maioria dos judeus, especialmente os russos."
Parece que muitos árabes israelenses também não sabem muito
bem como se situam em relação
aos palestinos dos territórios ocupados. Eles se ressentem do preconceito que dizem sofrer em Israel e se queixam de que têm seu
acesso negado aos melhores empregos, às melhores terras e aos
serviços de saúde. Alguns já foram acusados por Israel de colaboração com os palestinos responsáveis por atentados -em alguns casos, com razão.
Apesar disso, sabem que seus
direitos civis, os benefícios sociais
que recebem do governo e a influência política que exercem
-têm dez deputados no Parlamento- poderiam ser ainda menores sob o governo autocrático
de Iasser Arafat. O mesmo se aplica a suas contas bancárias. Os salários e padrões de vida em Israel
são muito melhores do que em
Gaza ou na Cisjordânia. Existe
muita preocupação sobre como
os árabes de Israel serão tratados
se o país algum dia fechar um
acordo com Arafat.
Mas a questão em jogo neste
momento não é dinheiro. É identidade, dignidade e etnia. A maioria dos árabes israelenses é formada por muçulmanos. Na semana
passada, quando o líder do Likud
(oposição), Ariel Sharon, pisou
nos locais sagrados muçulmanos
na Esplanada das Mesquitas, em
Jerusalém Oriental, desencadeou
forças cujas raízes estão fincadas
muito fundo na história e na religião. Os acontecimentos acabaram por radicalizar alguns árabes
israelenses, como Mohammed,
homem na casa dos 30 anos de
Um al Fahem, cuja mão estava enfaixada -foi ferida por uma bala
de borracha. "Não temos medo
de morrer. Não temos medo dos
israelenses. Se um de nós morrer,
saberá que morreu pelos locais sagrados e que sua mulheres gerará
filhos que tomarão nossos lugares."
Tradução de Clara Allain
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