São Paulo, domingo, 04 de janeiro de 2004

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Escolas também são meio para controle político

ESPECIAL PARA A FOLHA

Ao lado da saúde, a educação é uma das glórias do regime castrista: quase toda a população sabe ler e escrever, e todas as crianças vão à escola, que é obrigatória até o final do ensino médio. Se a massificação do ensino em todos os níveis atesta a integração de setores sociais outrora excluídos, a escola também se tornou um terreno privilegiado para a formação do chamado "homem novo".
A cada manhã, os pioneiros (alunos do ensino fundamental) exclamam, com a mão no coração: "Pioneiros do comunismo, nós seremos como Che". E, não importa que idade tenham, as "mobilizações" -trabalho "voluntário" na agricultura, treinamento de combate- se tornaram tão importantes quanto a formação teórica.
O decreto-lei 43, de março de 1980, ameaça de expulsão aqueles que "difamarem ou criticarem a Revolução". O sistema escolar serve de vetor das diretrizes oficiais e é uma forma de controle da população. Os governantes usam os professores para afastar os alunos de uma eventual influência "contra-revolucionária" dos seus pais. Estigmatizam em classe a fé religiosa e fazem perguntas sobre os mais recentes discursos de Fidel.
A "ficha cumulativa do estudante" contém comentários dos professores sobre as notas obtidas, mas também sobre a personalidade e, sobretudo, sobre a "educação ideológica, política e moral".
A escolha da carreira fica sujeita à conduta política. Aos "verdadeiros" revolucionários é facilitado o acesso ao direito, às ciências políticas e sociais ou ao jornalismo; aos revolucionários "médios", são destinadas a agronomia e a engenharia mecânica, e aos "apáticos", a menos que tenham parentes ou amigos importantes, fica vedada a universidade.
No momento, o interesse dos jovens revolucionários do "pátria ou morte" se dirige principalmente aos setores dolarizados da economia, porque as carreiras preferidas pelo regime perderam importância depois da instauração do "período especial" (crise após o colapso da URSS), em 1990.
Os professores sofreram grande queda em seu nível de vida e, cansados de lutar, optaram em massa por mudar de área, com a migração para o turismo ou venda de presentes no mercado negro. A maioria dos professores universitários mais conhecidos se expatriou.
Paralelamente, as escolas passaram por severa degradação nos últimos 15 anos. As reformas feitas nas férias de verão de 2002 e 2003 mal dissimulam a decadência das construções.
Professores "emergentes" formados às pressas estão dando aulas. Lola, professora "de história universal" aos 18 anos, improvisa algumas explicações sobre o Alcorão, "que Moisés pregou, muito tempo atrás". Quanto a Félix, 19, professor de português, ele no máximo fala muito bem o portunhol.
Fidel Castro optou por demonstrar ainda uma vez que o regime assegura educação e dignidade para seu povo, e uma de suas obsessões atuais é criar cursos "remunerados" (pelo equivalente a US$ 6 mensais), os primeiros dos quais foram instalados em 2002 -para todos os cubanos inativos, delinquentes ou donas-de-casa. Os "professores emergentes" têm futuro. (VB)


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