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SUCESSÃO NOS EUA / O PASTOR E O CANDIDATO
Prévias-chave testam dano de reverendo à base de Obama
Eleitorado negro ameaça rachar ante polêmica de Jeremiah Wright e reação do senador
Resultado nas primárias em Indiana e Carolina do Norte, na terça, pode alimentar a idéia de que Hillary é mais viável mesmo estando atrás
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Até poucos dias atrás confortável na posição de favorito para a vaga de candidato de seu
partido na sucessão de George
W. Bush, o senador democrata
Barack Obama tem nesta terça
o teste mais sério desde sua disparada diante da ex-primeira-dama Hillary Clinton. Depois
de amanhã, os dois se enfrentam nas prévias eleitorais nos
dois maiores Estados em número de delegados partidários
dos sete que ainda faltam votar.
Em Indiana, 72 delegados em
jogo, a senadora lidera por 6,2
pontos percentuais na média,
segundo o site agregador de
pesquisas Real Clear Politics. O
único instituto a indicar empate entre os democratas é o
Zogby. Uma vitória acachapante nesse Estado de maioria
branca e operária poderia levar
o pêndulo para o lado de Hillary
-mesmo estando a senadora
bem atrás em número de delegados partidários conquistados- e dar impulso a seu argumento de que ela é mais elegível do que Obama ante a cúpula
do partido, que, em última instância, pode decidir a disputa.
Mas a Carolina do Norte é
mais simbólica. Com mais delegados em jogo (115) e um em cada três eleitores negro, o Estado sulista virou uma questão de
honra para o senador. Perder lá
seria a pá de cal. Nos últimos
dias, Obama viu sua vantagem
nas pesquisas locais passar de
mais de 20 pontos percentuais
para os atuais 8,2, segundo o
Real Clear Politics.
Pastor
O responsável pela incrível
encolha dos números tem nome e sobrenome: Jeremiah
Wright. Nem o pastor aposentado de 67 anos nem suas opiniões radicais são estranhos à
maioria do eleitorado negro, a
base primeira e sobre a qual a
candidatura de Obama se construiu anos atrás. É a reação do
senador à rodada mais recente
de exposição na mídia de seu
ex-conselheiro e amigo de vários anos que ameaça alienar
parte desse universo fiel.
Na terça passada, na mesma
Carolina do Norte, o democrata
deu declarações em que se distanciava inequivocamente do
líder religioso. Fez isso depois
de um fim de semana em que
Wright não falou nada de novo,
mas reafirmou suas posições
mais polêmicas, como a de que
a aids teria sido criada pelo governo norte-americano para
destruir a população negra.
Pelo ato, Obama foi aplaudido por muitos líderes negros,
mas criticado por outro tanto
também. Não há pesquisas no
Estado que determinem o estrago -ou a ajuda- decorrente
do imbróglio. Mas, dos 65 mil
novos eleitores negros que se
registraram para votar nos últimos 12 meses na Carolina do
Norte, dois terços o fizeram depois de 15 de março, no auge da
primeira exposição de Wright.
"O pastor Wright estava certo em reaparecer para limpar
seu nome", disse à Folha
Dwight Hopkins, da Universidade de Chicago, especializado
em teologia negra e teologia da
libertação negra, a mesma do
reverendo. "Nós é que estamos
errados em politizar um discurso que é eminentemente religioso." Para o acadêmico, o
problema está no divórcio entre o passado dos dois líderes.
"Obama defende um discurso tão multicultural quanto sua
biografia", disse Hopkins (leia
entrevista na pág. A21). "Já o
reverendo Wright é filho de um
pastor da geração de Martin
Luther King, na qual a palavra
de ordem era a luta por direitos
iguais. Por um capricho do destino também, se as biografias
dos dois não tivessem se cruzado, Obama não existiria."
Outro ponto de discussão é o
"timing" do religioso. Por que
voltar a falar agora, em que seu
apadrinhado está mais frágil,
depois da derrota na Pensilvânia, há duas semanas, e de acusações de que é elitista, iniciadas após um comentário pouco
feliz sobre os hábitos dos operários daquele Estado? "Erra
quem pensa que ele tem um
motivo secreto", disse à Folha
David Mendell, autor de "From
Promise to Power" (da promessa ao poder, 2007).
"Wright é um independente", defende o autor da biografia mais isenta de Obama até
agora. "Além disso, é bom que
isso tenha acontecido agora.
Imagine o estrago se seus discursos surgissem só em setembro ou se ele saísse em "media
tour" mais perto das eleições."
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