São Paulo, sexta-feira, 04 de junho de 2004

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EUA

Bush aceita renúncia de George Tenet, criticado pela ausência de armas de destruição em massa no Iraque e pelo 11 de Setembro

Sob ataque, diretor da CIA deixa o cargo

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Sob forte pressão e de modo inesperado, o diretor-geral da CIA (o serviço secreto dos EUA), George Tenet, pediu demissão do cargo ontem alegando razões pessoais. O pedido foi aceito imediatamente pelo presidente americano, George W. Bush.
Tenet, 51, estava no centro de uma série de controvérsias que vêm minando a popularidade de Bush a cinco meses da eleição presidencial, em novembro.
Ele é o primeiro funcionário de alto escalão do governo Bush a deixar o cargo por falhas relacionadas à campanha no Iraque e aos atentados do 11 de Setembro.
Sua saída foi interpretada como um sinal de fortalecimento da área mais moderada do governo Bush, em especial do secretário de Estado, Colin Powell, no momento em que os EUA buscam o apoio das Nações Unidas para uma nova resolução que amplie a ajuda internacional no Iraque.
Seguindo seu estilo de total lealdade a colaboradores, Bush elogiou Tenet e procurou diminuir o impacto da notícia, que pegou de surpresa os principais políticos e analistas de Washington.
"Tenet sai por razões pessoais. Sinto por sua partida, pois ele fez um trabalho surpreendente em benefício do povo americano, com forte liderança na guerra contra o terrorismo", disse Bush.
"É uma decisão pessoal e tem apenas um motivo: o bem-estar da minha família", disse Tenet.
Ele será substituído interinamente pelo diretor-adjunto do órgão, John McLaughlin, que poderá ficar na função até depois da eleição, em novembro. Se reeleito, é esperado que Bush faça uma grande reestruturação na área de inteligência dos EUA.
Tenet já havia manifestado desejo de deixar o posto, mas sua saída agora foi interpretada como uma estratégia de Bush para tentar reconquistar a credibilidade perdida e reordenar as forças dentro de seu próprio governo.
"A decisão é bem-vinda e mostra uma forte necessidade de apontar responsáveis pelo modo como as coisas ficaram no Iraque. E essa responsabilidade está no topo", disse à Folha Frederick Barton, analista do Centro Internacional de Estudos Estratégicos.
Tenet foi o principal responsável por "montar" o caso dos EUA contra Saddam Hussein para justificar a Guerra do Iraque.
Em fevereiro de 2003, ele apareceu sentado atrás de Colin Powell na ONU enquanto o secretário mostrava "evidências" (fotos, vídeos e gravações) de que Saddam possuía as armas de destruição em massa que até hoje não foram encontradas no Iraque.
Há alguns dias, Powell afirmou que as informações passadas pela CIA eram "erradas, não-confirmadas e, em alguns casos, deliberadamente enganosas". "Estou desapontado e me arrependo [de tê-las usado]", declarou.
Em abril, na fase mais quente dos trabalhos da comissão especial que investiga os atentados do 11 de Setembro, o senador democrata Ted Kennedy pediu a cabeça de Tenet por, entre outras coisas, "falhar no Iraque" e por ""não ter a menor idéia" de onde se encontra o líder da rede Al Qaeda, Osama Bin Laden.
John Kerry, virtual adversário de Bush em novembro, também já havia pedido sua demissão. Ontem, afirmou: "Desejo tudo de bom para Tenet, mas o governo Bush tem de assumir a responsabilidade por falhas significativas em seus serviços de inteligência".
Mais recentemente, Tenet estava no centro de uma nova polêmica contra o próprio Pentágono, quando o iraquiano Ahmad Chalabi, um protegido do secretário Donald Rumsfeld (Defesa), apontou a CIA como responsável por acusá-lo de passar informações secretas ao Irã.
Jon Alterman, especialista de defesa, diz ser "notável" que Tenet tenha "durado tanto tempo". "A saída é uma indicação do nível de queixas contra ele, especialmente de Powell."


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