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ANÁLISE
Na diplomacia, Iraque joga com habilidade
MICHAEL R. GORDON
DO ""THE NEW YORK TIMES"
A decisão iraquiana de readmitir os inspetores da ONU intensificou as divergências entre os
EUA e seus aliados e complicou a
tentativa do governo Bush de
conquistar a aprovação do Conselho de Segurança (CS) para uma
resolução contundente.
Buscando reconquistar a iniciativa, Bush anunciou, anteontem,
ter chegado a um acordo com as
lideranças da Câmara quanto a
uma resolução que o autorize a
recorrer à força se Saddam Hussein se recusar a se desarmar.
A iniciativa parece ter tido como objetivo mostrar à ONU que o
presidente conta com o apoio de
muitos parlamentares americanos e está disposto a tomar uma
iniciativa militar por conta própria, se o CS relutar em agir.
Mas o Iraque escolheu uma carta fraca e a vem jogando com habilidade. Sua decisão, na terça-feira, de aceitar a inspeção de armas
funcionou como golpe diplomático preventivo, para tentar afastar
a ameaça de uma campanha militar preventiva lançada pelos EUA.
Na verdade, o objetivo do Iraque parece ser o de assegurar que
os arranjos envolvendo a inspeção de armas sejam os mais indefinidos possíveis.
Para Bagdá, os inspetores de armas da ONU são os novos ""escudos humanos". Enquanto eles estiverem trabalhando ativamente
em território iraquiano, será difícil ou mesmo impossível para a
administração Bush dar início a
sua campanha militar.
""O plano de jogo iraquiano é diluir ao máximo a resolução do
CS", disse Gary Samore, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos e ex-assessor do governo Clinton.
"Em última análise, há uma
chance muito boa de que o Iraque
aceite qualquer resolução que o
CS venha a aprovar, porque ele
sabe que a alternativa é a guerra.
Uma vez que aceitos os inspetores, os iraquianos farão justamente o mínimo necessário para evitar violar a resolução abertamente. Ou seja, vão fazer hora, procurando ganhar tempo."
Washington, por outro lado,
quer resolver a questão da concordância do Iraque com as inspeções o mais rapidamente possível para que, se for o caso de iniciar uma guerra, a ação militar
possa ser empreendida ainda neste inverno. Se as inspeções atolarem, como a Casa Branca prevê,
os EUA poderão atacar quando o
tempo mais frio facilitar o trabalho dos soldados. Com esse objetivo em mente, o governo Bush
redigiu um esboço de resolução
que, em essência, faz uma lista de
duras exigências ao Iraque.
O anúncio feito pelo Iraque de
que planeja o retorno dos inspetores fortaleceu a posição do país
sob vários aspectos. A iniciativa
visou assinalar que o Iraque está
disposto a cooperar com os procedimentos de inspeção já existentes da ONU e, assim, pareceu
ter o objetivo de fortalecer a oposição francesa e russa à iniciativa
americana. Além disso, colocou
Washington na posição difícil de
ter de explicar por que razão não
aceita o "sim" iraquiano.
A inspiração do Iraque veio das
divisões existentes no interior da
administração Bush. Durante todo o verão americano, houve divergências profundas quanto a se
o país deveria seguir adiante com
uma campanha militar para derrubar Saddam ou se, antes disso,
deveria emitir um ultimato quanto à readmissão dos inspetores da
ONU. Meses se passaram sem
uma resposta clara.
A longo prazo, a posição de Saddam não é nada invejável. A não
ser que o caráter de seu governo
mude de maneira significativa, será difícil o Iraque aceitar as inspeções ""profundas", o que proporcionará à administração Bush a
provocação que ela procura.
A curto prazo, porém, a administração Bush precisa mobilizar
o apoio do CS para tornar as inspeções as mais completas possíveis, e as iniciativas recentes do Iraque deixaram isso mais complicado.
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