São Paulo, sábado, 04 de dezembro de 2004

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EUROPA

Grupos rivais são de origem étnica multirracial

Violência de gangues suburbanas de Paris chega a Champs Elysées

JOHN LICHFIELD
DO "INDEPENDENT", EM PARIS

Zakaria Babamou, 18 anos, um rapaz de sorriso franco, morreu a poucos metros do muro do jardim da residência do presidente Jacques Chirac, depois de levar uma facada nas costas e golpes de barra de ferro na cabeça. Ainda não se sabe por que ele morreu, na noite de sábado, no Rond Point des Champs Elysées, ao lado da mais famosa avenida turística do mundo.
Um grupo de jovens vindos de um subúrbio pobre da zona oeste de Paris atacou outro grupo de jovens exatamente como eles, este vindo de outro subúrbio pobre a dois ou três quilômetros de distância. Uma briga eclodiu no meio da floresta de árvores de Natal brancas que, a cada mês de dezembro, é erguida na metade da avenida descrita como "a mais bela do mundo".
Zakaria, que era entregador de pizzas e vivia em Carrières-sous-Poissy, 32 quilômetros a oeste de Paris, morreu meia hora depois, de hemorragia cerebral. Na mesma noite houve um tiroteio diante de um clube de striptease de alta classe a algumas quadras dali.
Os dois incidentes chamaram a atenção pública para algo que a polícia e comerciantes dizem ser um aumento acentuado na tensão e na violência nos Champs Elysées nas noites de sexta-feira e, especialmente, de sábado. Grupos de jovens vindos da periferia pobre de Paris vêm para a capital francesa para andar a esmo pelos Champs Elysées e, com freqüência, atacar uns aos outros.
Diferentemente da impressão que às vezes se tem, não se tratam de gangues árabes ou negras em busca de alguma espécie de vingança contra a sociedade branca.Normalmente são grupos formados por jovens de origens raciais diversas, refletindo o mosaico racial da periferia parisiense. São de origem árabe, negra, do leste europeu e turca, além de alguns de origem francesa.
Os objetos do ódio deles são as gangues igualmente diversificadas vindas de outros subúrbios ou outros conjuntos habitacionais. As brigas entre gangues -que, muito mais do que gangues no sentido americano, são grupos pouco estruturados de rapazes que se conhecem- são comuns nos subúrbios. Nos últimos meses, o campo de batalha dessas gangues vem se deslocando para a região central de Paris.
Oficialmente, a polícia afirma que a avenida Champs Elysées é um dos lugares mais seguros da capital. Outras fontes, porém, discordam. "Eles têm vindo cada vez mais. Chegam de metrô, compram uma garrafa de uísque e vão ao jardim fumar maconha", disse um representante do sindicato policial. Já o prefeito assistente para assuntos de segurança de Paris disse que "a violência dos subúrbios está invadindo a capital".
Num primeiro momento a polícia achou que a morte de Zakaria tinha ocorrido durante uma batalha previamente combinada entre jovens da mesma área. Depois de interrogar testemunhas, ela passou a acreditar que deve ter explodido uma discussão provocada por um olhar ou um insulto, ou então apenas pelo fato de as duas gangues "serem fisicamente alérgicas uma à outra".
O assistente social Amar trabalha com rapazes num subúrbio semelhante de Paris. Ele afirmou: "Essa garotada possui um instinto tribal. Não são feitas distinções de raça no interior de cada grupo, mas eles sempre nos dizem: "Somos racistas. Odiamos o pessoal do conjunto habitacional ao lado". Se você analisar os meninos do outro grupo, eles têm a mesma mistura racial que o primeiro".
Um relatório oficial recente criticou o fato de a França não ter conseguido absorver os imigrantes na sociedade mais ampla. Embora a crítica se justifique, é fato que o país vem adotando uma política de impedir o surgimento do tipo de gueto monorracial visto nos centros urbanos pobres do Reino Unido e dos EUA. É isso que explica o caráter multirracial das gangues que se odeiam mutuamente. Se isso oferece alguma base para esperança já é uma questão totalmente diferente.


Tradução de Clara Allain


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