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ANÁLISE
O que quer o Brasil?
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O crescente isolamento de Bashar al Assad na comunidade internacional gera uma dúvida específica para o Brasil: por que o
governo brasileiro se aproximou
tanto da Síria e se mantém mudo
sobre a ocupação do Líbano?
Na verdade, para desespero do
Itamaraty lulista, pouco importa a
posição do Brasil. O país não tem
peso no principal ""hotspot" do
mundo, o Oriente Médio.
Ainda assim, o Brasil coleciona
gestos de amabilidade com o regime hereditário de Assad: Damasco já foi louvada como essencial à
estabilidade regional, e o ditador
local, citado como o ""grande líder
árabe" a ser contatado para tentar
descobrir o paradeiro do brasileiro seqüestrado no Iraque. E a Síria
nem sequer tem petróleo para
justificar cinicamente a proximidade, como ocorreu no caso da
agora palatável ditadura de
Muammar Gaddafi na Líbia.
Há sempre quem diga, como o
ministro Luiz Fernando Furlan
(Desenvolvimento), que os frutos
comerciais são inestimáveis, já
que o novo avião de Luiz Inácio
Lula da Silva ""foi pago" com o
acréscimo nas exportações à Síria.
Realmente, houve um salto: as exportações de commodities agrícolas quase triplicaram de 2003 a
2004 -mas para US$ 120 milhões, algo inexpressivo no geral
da balança comercial brasileira
(cerca de US$ 100 bilhões de março de 2004 a fevereiro de 2005).
Por fim, há a especificidade da
ocupação do Líbano. O país tem
mais descendentes no Brasil do
que habitantes em seu território,
com influência cultural e política,
e a grande parte elitizada dessa
comunidade é francamente contrária à presença síria. Não se trata
de orientar política externa para
grupos internos, mas a falta de
sensibilidade é flagrante.
Quando até Moscou pressiona
seu parceiro de décadas, fica quase impossível entender que exista
no Itamaraty alguma motivação
geopolítica palpável para justificar a não-posição sobre a Síria e a
ocupação do Líbano. Exceto uma:
a vontade quase pueril de mostrar-se independente dos EUA.
É argumentável que talvez seja
mais fácil ser antiamericano estando longe do problema do que,
por exemplo, o ser nas delicadas
relações com os interesses do Tio
Sam no verdadeiro quintal geopolítico do Brasil -a América do
Sul de Chávez, Uribe e Kirchner.
Mas essa ""independência" pode
ir para o escaninho de ""contas a
pagar" que a diplomacia de Celso
Amorim e Samuel Pinheiro Guimarães tem se ocupado para
manter recheado. É bom, é altivo?
Talvez sim, talvez não. Mas quando o Brasil se vê praticamente sozinho com o Irã como aliado da
Síria, a altivez corre risco de virar
piada, ou coisa pior.
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