São Paulo, sábado, 05 de março de 2005

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"Brasileiro" lidera oposição libanesa

GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO

Um libanês, que viveu mais de duas décadas em São Paulo, onde se formou em administração de empresas na Fundação Getúlio Vargas, é um dos principais líderes do movimento opositor do Líbano, que quer o fim da ocupação síria do país dos cedros.
Carlos Eddé, nascido em 1956, em Beirute, é herdeiro de um dos sobrenomes mais famosos da política libanesa. Seu avô é Emile Eddé, que foi presidente do Líbano (1936-41 e mais uma vez em 1943), sendo um dos pais da formação do Estado libanês.
Em maio de 2000, seu tio, Raymond Eddé, que era o líder do Bloco Nacional, morreu. "No dia seguinte, fui eleito à revelia presidente do partido", disse Eddé, que deixou o Líbano durante a guerra civil (1975-90).
Na época, Eddé, que é mestre em ciência política pela Universidade de Georgetown, trabalhava no banco americano Merrill Lynch. Candidato ao Parlamento na eleição de maio, ele afirma que não deseja se tornar presidente do Líbano. "Meu sonho é voltar para o Brasil", onde a mãe, brasileira de origem libanesa, ainda vive.
Na sua avaliação, a eleição de maio será "um referendo sobre a presença síria no Líbano", mas há uma desvantagem: "O assassinato de Hariri decapitou a organização, perdemos um líder".
Leia sua entrevista à Folha.

 

Folha - A Síria deve sair mesmo do Líbano? E o que vem a seguir?
Carlos Eddé -
Há várias etapas na nossa estratégia. A primeira delas, era a oposição se conscientizar de que a Síria precisa sair do Líbano, e eliminar o medo de pedir isso. Agora, é conseguir a retirada total ou parcial. Desse modo, aumenta a força da oposição na eleição parlamentar, que será um referendo sobre a presença síria. Com uma vitória, aliada ao apoio internacional, você consegue eliminar os sistemas de segurança aqui presentes. Mas não é suficiente para resolvermos todos os problemas.

Folha - Quais são os outros problemas, além da Síria?
Eddé -
O nosso PIB é de US$ 17 bilhões, e a dívida pública é de US$ 50 bilhões. Temos os campos palestinos, e não há condições de incorporar todos os refugiados. O Hizbollah ainda está armado. Muitos jovens talentos libaneses emigram. E a política do país deveria ser secular.

Folha - O sr. é a favor de negociar a paz com Israel?
Eddé -
O Líbano somente deve assinar a paz após os palestinos terem um acordo com Israel.

Folha - A oposição defende a manutenção de boas relações com a Síria após a retirada?
Eddé -
Queremos boas relações com a Síria, não com seu regime. Não são relações racionais. A nomenclatura síria tem um esquema de negócios. Há uma guarda pretoriana para defendê-los.

Folha - Hariri rachou com a Síria por ideologia ou por negócios?
Eddé -
Por negócios. Os sírios começaram a desconfiar de Hariri. Não podiam controlá-lo, pois ele tinha muitas relações internacionais. Novas pessoas queriam entrar no esquema e produziram um clima de desconfiança.

Folha - Os EUA estão se aproveitando do movimento opositor?
Eddé -
Sem os EUA, não teríamos esse vigor. E os americanos, junto com os franceses, levaram adiante a resolução 1559 [que prevê a retirada de tropas estrangeiras do Líbano].

Folha - E o Brasil?
Eddé -
O governo brasileiro precisa ter uma posição mais clara, apoiando a retirada.

Folha - Há condições de vencer as eleições?
Eddé -
O momento é único, temos o apoio externo. Mas tudo depende de outros fatores. O sistema eleitoral é péssimo. Há a intimidação em algumas partes do país. Sírios são naturalizados para votar. E o assassinato de Hariri trouxe uma desvantagem. Decapitaram a nossa organização, perdemos um líder. O atentado ocorreu quando perceberam que a oposição crescia.


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