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São Paulo, quinta-feira, 05 de junho de 2003

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UMA VISÃO ISRAELENSE

Povos estão à frente de seus líderes, diz Oz

AMOS OZ

Pela primeira vez em cem anos de conflito, os dois povos, o judeu israelense e o árabe palestino, estão à frente de suas lideranças. Eles sabem que a terra que disputam precisa ser dividida em dois Estados nacionais.
A verdade básica dos fatos é muito simples. Um país que tem as dimensões aproximadas da Sicília hoje é habitado por 5,5 milhões de judeus e entre 3 milhões e 4 milhões de árabes. Eles não conseguem compartilhar a terra -por isso, precisam dividi-la em duas. Os tchecos e os eslovacos fizeram a mesma coisa não faz muito tempo, sem derramar uma gota de sangue sequer.
Depois de três anos de Intifada palestina sangrenta e de sangrenta opressão israelense, está claro para a maioria dos israelenses que a maior parte dos assentamentos judaicos na Cisjordânia e na faixa de Gaza terá que ser removida, ou não poderá existir um Estado palestino viável. Ao mesmo tempo, mais e mais palestinos estão se dando conta de que os refugiados de 1948 terão que ser reassentados na Palestina, não em Israel -ou não haverá Estado judeu viável.
Esse processo de adotar uma visão ponderada e sóbria das coisas é extremamente doloroso. Para ambos os lados, ela significa uma auto-imagem ferida, um senso de justiça comprometido, sonhos destruídos e um forte sentimento de perda. Quando a solução de dois Estados tiver sido implementada, ambos os lados vão se sentir como se uma parte deles tivesse sido amputada.
É hora de o resto do mundo oferecer a ambas as partes o máximo possível de ajuda, empatia e compreensão. É hora de indivíduos e governos bem intencionados apresentarem um Plano Marshall em miniatura para reassentar os refugiados palestinos no Estado da Palestina. Também é hora de oferecer a Israel as garantias de segurança de que o país precisará em troca da renúncia aos territórios ocupados.
É hora de compaixão, não de exigir uma prestação de contas históricas, nem de atribuir culpas. Nem Sharon nem Mazen devem se tornar um Nelson Mandela. Mas, quer gostem ou não, parece que suas mangas já ficaram presas nas engrenagens do processo de paz. Eles estão sendo arrastados para dentro desse processo, escoiceando, gritando e tentando acalmar os radicais que cada um deixou em casa. Mas, de agora em diante, será quase impossível para esses dois líderes se afastarem do processo de paz.
Não esperemos uma lua-de-mel repentina entre inimigos mortais. Esperemos e incentivemos um divórcio doloroso e a divisão da residência, que já era muito pequena, em dois apartamentos distintos, ainda menores. É chegada a hora.


Amos Oz, 64, escritor israelense, é autor, entre outros, de "O Mesmo Mar" (2001) e "A Caixa Preta" (1993)

Tradução de Clara Allain


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