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COMENTÁRIO
Saddam inaugura nova "nova ordem mundial"
SÉRGIO MALBERGIER
EDITOR DE MUNDO
A questão de apoiar ou não a
iminente guerra de George W.
Bush contra Saddam Hussein não
será decidida com base em eventuais provas de que o ditador iraquiano está burlando as sanções
da ONU. Ele as viola desde 1991.
Os países no Conselho de Segurança e ao redor do mundo tomarão suas posições de acordo com
sua capacidade de resistir ao rolo
compressor americano, já que
apenas Israel e o Reino Unido
concordam com a urgência dos
EUA em depor Saddam.
A França e a Alemanha tentam
liderar a oposição a uma guerra e,
não menos importante, à hegemonia total dos EUA na política
internacional.
Mas, desde que marcaram sua
posição conjunta, no final de janeiro, o que se viu foi uma forte
reação de vários países europeus.
O eixo franco-alemão agora parece mais isolado no continente que
o premiê britânico, Tony Blair,
preposto de Bush na Europa.
Pesos pesados como a Rússia e a
China optarão por observar o
conflito, manifestando apenas
verbalmente a preferência por
uma solução pacífica, já que dependem economicamente dos
EUA e não querem ficar de fora
do butim iraquiano. Pelo butim, a
França pode também mudar de
lado e participar de um ataque.
Ao invadir o Kuait, em 1990,
Saddam colocou em ação mecanismos que sepultaram de vez a
Guerra Fria, levando o então presidente americano, George Bush,
a declarar o surgimento de uma
"nova ordem mundial". Nascida
com a ampla coalizão anti-Saddam, ela varreu do mapa a bipolaridade EUA-União Soviética.
Quase 13 anos depois, o ditador
iraquiano novamente expõe um
novo arranjo político mundial,
forjado pelos ataques terroristas
de 11 de setembro e também pelo
último salto econômico americano, que tornaram os EUA um império ainda mais hegemônico
econômica e militarmente.
Foi o terrorista Osama bin Laden quem despertou a besta adormecida do militarismo imperial.
Atingidos em seu coração, Bush
filho e seu gabinete povoado por
falcões da guerra colocaram em
ação a fantástica máquina militar
que atravessou o mundo para esmagar o desprezível regime do
Taleban no Afeganistão.
O entusiasmo gerado pela vitória ajudou a consolidar uma doutrina há muito defendida pelos
conservadores da linha dura republicana, a de que os EUA devem ter uma política de ataques
preventivos para impedir qualquer desafio a sua soberania.
A chamada Doutrina Bush, lançada, para espanto global, em setembro passado, é radical. Não
serve apenas para ditadores sanguinários como Saddam, mas
prevê que mesmo aliados como a
Europa sejam alvos caso ameacem a hegemonia dos EUA.
Saddam assim volta a ser um catalisador da história. Será nas
areias do deserto iraquiano que
uma nova "nova ordem mundial"
-marcada pela incapacidade
global de se opor aos EUA- dará
seus primeiros passos (ou suas
primeiras explosões).
Como disse na semana passada
uma colunista do "New York Times", Saddam é um "rato de laboratório" da Doutrina Bush. O clã
do Texas não poderia ter "rato"
melhor para testar sua doutrina.
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