São Paulo, domingo, 06 de fevereiro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

COMPORTAMENTO

Sociólogo francês que inverteu parâmetros de análise diz que maioria vê mulher como bem de consumo

Estudo decifra o perfil dos clientes de prostitutas

CONSTANÇA TATSCH
DA REDAÇÃO

Todas as soluções apontadas até hoje para o problema da prostituição têm como base a oferta e não a demanda. Um estudo francês lançado recentemente propõe uma nova abordagem do tema, ao desvendar quem são os clientes regulares e por quais motivos procuram por sexo pago.
As descobertas do sociólogo francês Saïd Bouamama derrubam preconceitos. Depois de realizar 95 entrevistas, ele concluiu que o cliente da prostituta é o marido, irmão ou filho da mais contemporânea das mulheres, ou seja, um homem comum, sem grupo econômico ou cultural que o diferencie. A maioria tem entre 30 e 50 anos e tem uma parceira fixa.
"Sobre questões como drogas e prostituição estudamos sempre a oferta e não a demanda. Acredito que esse seja um mecanismo que impede a compreensão da questão", disse Bouamama, em entrevista à Folha. Segundo o sociólogo, até hoje não havia uma pesquisa sobre o assunto em seu país.
Os motivos que levam um homem a recorrer ao sexo pago se, muitas vezes, parecem óbvios aos homens, intrigam grande parte das mulheres. A pesquisa apresenta cinco diferentes perfis de clientes.
Os "Isolados afetivos e sexuais" são pessoas com poucas relações sociais que têm dificuldade em conseguir encontros com o sexo oposto. Ao contrário do que se possa imaginar, essa é a categoria minoritária. Os "Descompassados com a igualdade" são homens insatisfeitos com as mulheres modernas. A partir deles, o sociólogo concluiu que a emancipação feminina foi interiorizada pelas mulheres, mas nem todos os homens estariam prontos para viver nessa sociedade. "Precisamos pensar em como preparar os meninos para relações igualitárias."
Um dos perfis mais intrigantes é o do "Consumidor de mercadoria": homens que vêem as mulheres como um bem de consumo. De acordo com a pesquisa, a maior parte desses homens conheceu o corpo feminino pela pornografia. "Mas a imagem pornográfica não é neutra, ela apresenta um modelo de relação onde o homem é dominante, a mulher é passiva, sem sentimentos e o que importa é o prazer masculino", disse o autor do estudo.
Os "Alérgicos ao envolvimento e à responsabilidade" buscam relações pagas depois de decepções amorosas. Para eles, o envolvimento "dá muito trabalho". Já os "Dependentes" começaram a se relacionar com prostitutas e agora não conseguem mais parar.
Um fato que chamou a atenção do sociólogo é que o discurso do "Consumidor de mercadoria" se repete em todos os perfis. "É inquietante essa imagem da mulher. Isso é fruto da educação, publicidade e pornografia."
Outro ponto curioso é o freqüente sentimento de insatisfação dos entrevistados. Cerca de 71% dos clientes dizem não terem sentido prazer. "Eles compram sexo e esperam uma relação afetiva." Essa suposta contradição seria uma das causas da violência contra as prostitutas. Homens que não sentem que seus desejos foram atendidos porque, muitas vezes, buscam atenção e carinho.
O sociólogo ressalta que, apesar de o estudo ter sido feito na França, suas conclusões podem servir para todos os países ocidentais. "O estudo é válido para todos os lugares onde o modo de vida é industrializado, moderno, midiatizado. Isso inclui o Brasil."

Combate à prostituição
Há três anos, o então ministro do Interior da França, Nicolas Sarkozy, criou uma lei bastante restritiva ao trabalho sexual, punindo com prisão e multa o proxeneta e as prostitutas. Apesar de Sarkozy comemorar o sucesso da legislação, Bernard Lemaitre, presidente da ONG Mouvement du Nid, que combate a prostituição na França, disse à Folha que não houve melhora na questão no país. Para ele, a medida "continua a culpar as prostitutas" e criou um clima de "caça às bruxas". "O medo se instalou na rua", afirmou.
Segundo Lemaitre, a lei teria sido feita não para combater a prostituição mas sim para lutar contra imigrantes ilegais. "Deixamos tranqüilos os franceses e a polícia se encarrega dos estrangeiros."

Texto Anterior: Negociador diz que críticas são "conspiração"
Próximo Texto: Ano do galo: Festa do Ano Novo pára trânsito na China
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.