|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Pressão européia não deverá evitar o conflito
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
A decisão da França, da Rússia e
da Alemanha de tomar uma posição conjunta contrária à guerra
coloca os EUA numa sinuca diplomática, mas não afeta sua determinação de lançar uma ofensiva militar contra o Iraque para depor o ditador Saddam Hussein.
Segundo especialistas ouvidos
pela Folha, em princípio, o governo dos EUA deverá manter a estratégia aplicada até agora na cena diplomática e, ao mesmo tempo,
intensificar os preparativos militares na região do golfo Pérsico.
Assim, além de pressionar Saddam a talvez cogitar a idéia de deixar o poder para evitar a guerra, Washington mostrará aos membros do Conselho de Segurança
ainda indecisos que a decisão européia não arrefeceu seu ímpeto.
"A estratégia americana é convencer 5 dos 6 indecisos da necessidade da guerra. Com isso, haveria os nove votos necessários para
a adoção da resolução, o que colocaria a Rússia e a França numa
posição difícil", analisou James
Lindsay, ex-diretor para questões
globais e assuntos multilaterais
do Conselho de Segurança Nacional dos EUA (1996-1997).
"Afinal, vetar uma decisão majoritária do CS não é algo muito
confortável diplomaticamente. A
estratégia será mantida até o ponto em que os EUA perceberem
que não terão chances de vencer a
votação no CS", acrescentou.
Os europeus contrários à guerra, por sua vez, podem também
ter feito a declaração conjunta para influenciar os indecisos.
"Em diplomacia, o efeito de um
anúncio gera consequências que,
às vezes, tornam a aplicação da
medida anunciada desnecessária,
pois o anúncio já surtiu o efeito
esperado. Assim, não podemos
dizer que a França e a Rússia realmente estejam determinadas a
aplicar o veto no CS", explicou
Chistian Lequesne, diretor do
Centro de Estudos e de Pesquisas
Internacionais (França).
Todavia, para Charles Kupchan,
pesquisador no Council on Foreign Relations (EUA), a "escalada da retórica diplomática poderá
compelir a Rússia e a França a tomar uma atitude drástica".
"Moscou e Paris só poderão
mudar de tom e não vetar a aprovação do texto se houver um fato
novo. Este poderia aparecer na
apresentação de Blix no CS, no
entanto tudo indica que ele dirá
que Bagdá intensificou sua colaboração com os inspetores da
ONU recentemente", afirmou
Kupchan, referindo-se ao chefe
dos inspetores da ONU, o sueco
Hans Blix, que fala amanhã no CS.
De fato, Saddam vem destruindo seus mísseis Al Samoud 2, que
são proibidos para o país, desde o
último sábado. Ademais, Bagdá
promete entregar à ONU, na próxima segunda, um relatório em
que revelará como e quando seus
estoques do gás dos nervos VX e
de antraz foram destruídos.
Todavia Washington poderá
nem apresentar o projeto de resolução para votação se não acreditar em sua aprovação. "Os EUA
não querem correr riscos, pois,
em tese, poderão dizer que a resolução 1441 já permite um ataque
ao Iraque [em caso de não-colaboração com a ONU] e que Saddam não desativou seus programas de armas", declarou Lindsay.
A Justiça internacional não contradiz essa visão. "Creio que os
EUA tenham um argumento forte. À luz de resoluções anteriores,
a ação militar poderia ser justificada. Porém, se o restante do planeta disser que isso não é verdade,
a questão se tornará uma disputa
política. E o CS é um órgão político, não legal", expôs Allan Ryan,
professor de direito internacional
na Universidade Harvard (EUA).
Assim, se complica as coisas para Washington na cena político-diplomática, a posição conjunta
dos europeus não mina a determinação dos EUA de depor Saddam. Na verdade, para George W.
Bush e para seus principais assessores, a recusa do Parlamento turco a permitir a passagem de militares americanos por seu território talvez seja um problema bem
mais grave, visto que poderá atrasar a invasão do Iraque.
Texto Anterior: Lula sugere a Blair cúpula sobre Iraque Próximo Texto: Divisão na ONU ajuda Saddam, diz Powell Índice
|