São Paulo, sexta-feira, 07 de maio de 2004

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JUSTIÇA

Acusadas de contaminar 426 crianças, as enfermeiras dizem ter confessado sob tortura; EUA e Europa criticam sentença

Líbia quer fuzilar búlgaras acusadas de espalhar Aids

DA REDAÇÃO

Um tribunal da Líbia condenou ontem à morte por um pelotão de fuzilamento cinco enfermeiras búlgaras e um médico palestino sob a acusação de deliberadamente terem infectado 426 crianças com o HIV (vírus da Aids).
Segundo a Promotoria, os acusados, que estão presos há cinco anos, cometeram "assassinatos com o objetivo de desestabilizar o país, deliberadamente para dar início a uma epidemia, e conspiraram para intencionalmente infectar crianças com o vírus".
Em 2001, o ditador líbio, Muammar Gaddafi, disse que as crianças haviam sido contaminadas como parte de um experimento ordenado pelo serviço secreto dos EUA ou pelo de Israel. De acordo com o governo líbio, mais de 40 crianças morreram devido à contaminação.
A Bulgária disse que os veredictos são "injustos e absurdos" e teve o apoio dos EUA e da União Européia (UE). A Comissão Européia (o Executivo da UE) afirmou que estava "profundamente desapontada". O Departamento de Estado dos EUA classificou como "inaceitável" a sentença. Em 2003, os EUA fizeram 65 execuções de condenados à morte.
Algumas organizações de defesa dos direitos humanos afirmam que a Líbia inventou a versão de que as contaminações foram resultado de experimentos médicos realizados na cidade de Benghazi para encobrir as condições precárias de seus hospitais.

Confissões sob tortura
O governo búlgaro sustenta que as confissões foram obtidas sob tortura. Os acusados negam a culpa e dizem que levaram choques e foram espancados. Duas das enfermeiras alegam terem sido estupradas. Segundo Luc Montagnier, o médico francês co-responsável pela descoberta do HIV, a causa mais provável da contaminação das crianças são as más condições higiênicas do hospital de Benghazi. Montagnier calcula que as infecções tenham acontecido em 1997 -mais de um ano antes de os acusados terem sido contratados pelo hospital.
Um sexto búlgaro, um médico, também foi julgado, mas escapou da sentença de morte. Ele foi condenado a quatro anos de prisão por trocar dinheiro no mercado negro -apesar de ter sido levado a julgamento pela acusação de infectar pacientes com Aids.
"Eu não estou contente no momento. Não posso me sentir livre porque deixei para trás seis pessoas inocente", disse Zdravko Georgiev, que é casado com uma das enfermeiras condenadas e que foi solto por já ter passado mais de quatro anos preso.
Nove funcionários líbios do hospital foram inocentados da acusação de negligência.
O presidente do Parlamento búlgaro, Ognyan Gerdzhikov, afirmou ter confiança de que as sentenças não serão levadas a cabo: "Primeiro, cabe apelação. Segundo, a Líbia não executa sentenças de morte há nove anos. Terceiro, acredito que Gaddafi irá agir como um humanitário, para conquistar algum crédito político, que ele precisa, perante a opinião pública mundial".
Antes considerado um pária pela comunidade mundial, Gaddafi começou a se reabilitar em 2003, quando concordou em indenizar as famílias das vítimas do atentado de Lockerbie (Escócia), em 1988 -uma bomba colocada por agentes do serviço secreto líbio derrubou um jato de PanAm e causou a morte de 270 pessoas. Depois, em dezembro, anunciou que seu país desistia de levar adiante seus programas de produção de armas de destruição em massa. Desde então, já teve encontros com o premiê Tony Blair e com líderes da UE.


Com agências internacionais


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