São Paulo, domingo, 07 de outubro de 2001

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FRANÇA

Para entidades, revista de carros e pessoas é atentado contra liberdade

Maior controle provoca grita

ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

Pioneira na defesa dos direitos do homem, a França entrou em crise depois que o governo divulgou medidas de vigilância, inclusive do ciberespaço, que restringem as liberdades individuais em nome de uma maior segurança contra o terrorismo.
As medidas foram anunciadas pelo primeiro-ministro Lionel Jospin (centro-esquerda) na última semana e provocaram imediatamente a ira de organizações de direitos humanos e um grande debate dentro da sociedade francesa. A razão da grita é simples: a França, com a Revolução Francesa (1789), estabeleceu limites para a ação do Estado.
Policiais e agentes ganham mais poderes com as novas medidas. Eles são autorizados a fazer revista interna de veículos e a realizar o controle de pessoas em áreas de segurança pública.
Além disso, autorizam os juízes a solicitar mensagens eletrônicas de pessoas suspeitas e a pedir a identificação dos autores de sites da internet.
O controle de pessoas, que consiste em pedir a identificação e verificar os seus objetos e roupas, poderá ser realizado nas áreas de portos e aeroportos ou em todo lugar acessível ao público, "em caso de ameaça grave à segurança", segundo Jospin.
A revista de veículos pela polícia, considerada inconstitucional desde 1995, será permitida desde o início de uma investigação, uma vez que seja autorizada pelo Ministério Público. Nas ruas de Paris, ela já está em prática.
Quanto à internet, o governo espera aprovar no Parlamento um projeto de lei que obriga os provedores de acesso a ajudarem na tradução de mensagens criptografadas (em código) e a conservarem vestígios das conexões feitas pelos usuários por um período de um ano.

Apoio político
O presidente Jacques Chirac (centro-direita), rival político de Jospin, endossou as medidas, que receberam também o apoio da maioria dos parlamentares.
A direita defendeu que elas tivessem caráter permanente, mas Jospin garantiu que seriam "excepcionais" e com duração determinada. Mas ninguém definiu qual a duração delas.
Para o presidente da Liga dos Direitos Humanos, Michel Tubiana, a França está adotando leis de exceção. "Isso é inaceitável", declarou.
O Sindicato da Magistratura anunciou que as medidas eram "atentatórias" às liberdades fundamentais e que elas vão "pesar" na vida cotidiana dos cidadãos, "em particular daqueles que são objeto de repetidos controles por causa de sua aparência ou sua origem". Quer dizer, imigrantes, pobres, árabes e negros.
As medidas ampliam o plano Vigipirate (Vigia Pirata), dispositivo de segurança nacional criado em 1978 e que tem sido utilizado pelo governo francês sempre que o país é ou pode ser atingido por um ataque terrorista. O plano tem duas fases: alerta simples (fase 1) e alerta reforçado (fase 2), que envolve as Forças Armadas.
Depois dos atentados nos EUA, o governo acionou imediatamente a fase 2 e colocou de prontidão 5.000 policiais e militares.
O Vigipirate reforçado também significa a intensificação do patrulhamento nas ruas, o controle firme das fronteiras e das entradas e saídas dos estabelecimentos públicos e privados considerados "sensíveis".
Segundo o Movimento contra o Racismo e pela Amizade entre os Povos, desde a ativação do plano Vigipirate reforçado, o número de detenções de imigrantes em situação irregular aumentou de maneira "significativa" no país.
A eficácia dos métodos franceses contra o terrorismo está fazendo com que eles ganhem adeptos. A edição européia do "The Wall Street Journal" chegou a sugerir que o plano da França servisse de inspiração para os EUA.


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