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AMEAÇA
Carnivore, caixa preta instalada pelo FBI em provedores, já monitora informações na rede
Lei reforça vigilância na internet
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
DE SAN FRANCISCO
Uma caixa literalmente preta,
que pode ser instalada pelo FBI
em provedores de internet, está
no centro de uma polêmica entre
defensores de liberdades individuais e autoridades americanas.
A caixa se chama Carnivore
(pronuncia-se "carnivór", que em
inglês quer dizer carnívoro) e, segundo seu inventor, a polícia federal dos EUA, é apenas uma
"ferramenta de diagnóstico".
Mas, para seus inimigos, o Carnivore significa vigilância indiscriminada e potencialmente irresponsável do tráfego de informações na internet. O debate acirrou-se ainda mais após os atentados de 11 de setembro. Um projeto de lei que deve ser aprovado em
curtíssimo prazo pelo Congresso
americano amplia o poder policial de investigação eletrônica.
Pela lei atual, "grampos" de internet são permitidos só com ordem judicial que explicite os limites da espionagem. Além disso,
cada vez que se usa o Carnivore,
um novo mandado é necessário.
Se a nova lei for aprovada, uma
ordem judicial genérica já permitiria um grampo longo e abrangente. O projeto de lei é conhecido
por Patriot, que são as iniciais, em
inglês, da frase "fornecer as ferramentas apropriadas e necessárias
para interceptar e obstruir o terrorismo". Além de ampliar a cibervigilância, o Patriot facilita prisão de estrangeiros, ações contra
suspeitos de colaborar com o terror e congelamento de bens de organizações extremistas.
"O Carnivore é como um filtro
gigantesco, que, segundo o FBI,
deixa passar algumas informações e retém outras, que ficam
guardadas num arquivo para serem analisadas", disse à Folha a
professora de informática Coralee
Whitcomb, presidente da organização Profissionais da Computação pela Responsabilidade Social.
Com sede no Vale do Silício
(Califórnia), centro nervoso da
indústria de informática, a PCRS
combate com vigor o controle oficial sobre a comunicação. "Sou
contra espionar informações na
internet. Não é assim que iremos
capturar terroristas. No futuro, o
único resultado disso vai ser o uso
de nossas comunicações privadas
contra nós mesmos."
Se conectado à central de um
provedor de internet, o Carnivore
pode vasculhar tudo o que entra e
o que sai do computador de um
usuário: e-mails enviados e recebidos, sites mais visitados etc. O
FBI afirma que, no caso de e-mails, por exemplo, o Carnivore
se limita a investigar o cabeçalho,
não chegando a analisar o conteúdo das mensagens.
Mas especialistas em computação afirmam que isso é impossível. Para eles, o Carnivore pode,
sim, destrinchar conteúdo. Pior:
de todo o tráfego de um provedor.
O FBI contra-argumenta: mesmo que isso acontecesse, filtros
poderosos selecionariam só a informação requisitada pelo juiz.
Muita gente duvida. A principal
limitação técnica do Carnivore é
que ele não consegue invadir um
computador. Só analisa informação em trânsito -saindo ou entrando de uma máquina.
A descoberta
A existência do Carnivore foi revelada em julho de 2000 pelo jornal nova-iorquino "The Wall
Street Journal". O caso chegou à
imprensa devido à recusa de um
dos maiores provedores de internet dos EUA, a Earthlink, a colaborar com o FBI numa investigação que usaria o Carnivore.
Imediatamente, o Centro de Informações sobre Privacidade Eletrônica (Epic, sigla em inglês), entidade dos EUA de defesa de ciberliberdades, entrou na Justiça
exigindo que o FBI tornasse públicas todas as informações sobre
o Carnivore. "Não nos opomos à
vigilância na internet. O problema é que faltam ao Carnivore
proteções às liberdades individuais", disse à Folha Marc Rotenberg, diretor-executivo da Epic.
Desde então, o FBI vem tentando, à sua maneira, diminuir o segredo sobre a caixa preta. Mudou
o nome oficial para DCS100 (mais
neutro e menos assustador) e incentivou que uma auditoria independente a avaliasse.
Isso foi feito pelo Instituto de
Pesquisa e Tecnologia de Illinois.
O relatório final, ainda que positivo para o FBI, ressalva que, "se
configurado incorretamente, o
Carnivore pode gravar todo o tráfego que passa por ele", não apenas o que a Justiça permitir.
Quando o estudo começou, em
setembro de 2000, o FBI admitiu
que já havia usado o Carnivore
em 25 investigações.
Rotenberg, do Epic, assim como
Coralee Whitcomb, dos Profissionais da Computação pela Responsabilidade Social, acha que
aumentar a segurança em aeroportos é mais prioritário do que
espionar a internet. Ambos avaliam que, mesmo com o Carnivore 100% ativo, os atentados em
Nova York não seriam evitados.
Diante da pressão para que as
investigações antiterror caminhem rápido, a Earthlink, que havia se recusado a permitir a instalação, abriu seus computadores.
O mesmo foi feito pelo maior provedor dos EUA, a America Online. Nem foi preciso usar o Carnivore. As empresas abriram voluntariamente seus registros.
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