São Paulo, quinta-feira, 07 de outubro de 2004

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ANÁLISE

Texto diz que ditador destruiu armas para enganar o mundo

ANNE PENKETH
DO "INDEPENDENT"

Como um mantra, Charles Duelfer, chefe dos inspetores de armas americanos no Iraque, repete em todas as partes de seu relatório que não há "evidências" de que Saddam Hussein possuísse armas de destruição em massa.


Para relatório norte-americano, Saddam eliminou seu arsenal para forçar o fim das sanções da ONU e, então, retomar seu programa de armas proibidas


Mas ele insiste em que, se a ONU tivesse levantado o embargo que pesava sobre seu regime, o ditador iraquiano pretendia retomar seus programas de armas proibidas. O relatório é dividido em seis capítulos, cobrindo um período de junho de 2003 até setembro de 2004.
A introdução do texto apresenta uma visão histórica do regime de Saddam e descreve como o ex-ditador decidiu iniciar seus programas de armas proibidas que, mais tarde, levariam à sua deposição. "Saddam percebeu o valor das armas de destruição em massa."
Até 1991, "a experiência de Saddam com armas de destruição em massa tinha sido positiva", diz o texto, aludindo ao uso de gás contra os iranianos durante a guerra entre os dois países. "Os iraquianos crêem que a posse de armas de destruição em massa tenha contribuído para que os EUA não chegassem a Bagdá em 1991."
Mas, em 1991, Saddam "decidiu fazer uma retirada tática". "Ele resolveu eliminar os estoques de armas de destruição em massa, tendo como objetivo obter o levantamento das sanções impostas após a invasão do Kuait, em 1990."
De acordo com Duelfer, "virtualmente nenhum iraquiano acreditava que Saddam tivesse abandonado para sempre as armas de destruição em massa".
Na verdade, "evidências sugerem que, com o fim das sanções a entrada de dinheiro no país, haveria uma expansão da atividade militar com a intenção de reconstituir os programas de armas de destruição em massa".
Em 1998, com a descoberta de que o Iraque podia usar como arma o gás letal VX, Bagdá parece ter concluído que não era possível satisfazer as exigências dos inspetores da ONU.
A cooperação com seus esforços era vista como uma armadilha, não como um caminho para pôr fim às sanções.
Conforme o confronto com a ONU se intensificou durante o ano de 1998, o relatório sugere que uma resolução secreta foi adotada pelo regime: "Pôr fim ao respeito às resoluções da ONU".
A quebra de confiança levou à retirada da equipe da ONU do Iraque e a uma campanha de bombardeios realizada pelo reino Unido e pelos EUA.
Em 2000, Saddam parecia que conseguiria obter uma vitória, já que, na prática, as sanções estavam erodindo. Mas, em 11 de setembro de 2001, ocorreram os atentados contra os EUA. O relatório diz: "Saddam não entendeu que a situação tinha mudado". Segundo Duelfer, ele só compreendeu a gravidade da situação depois que Bush pôs o Iraque, ao lado da Coréia do Norte e do Irã, no que chamou de "eixo do mal", num discurso feito em janeiro de 2002.
Mais tarde, Saddam concordou em deixar que os inspetores voltassem ao país.
Duelfer diz que o Grupo de Pesquisa do Iraque, que ele liderou, descobriu planos iraquianos para três mísseis balísticos de longo alcance, numa contravenção às sanções da ONU. Mas "nenhum desses sistemas chegou à fase de produção, e somente um teria passado do estágio de projeto".
O Grupo de Pesquisa do Iraque "não descobriu evidências de que o país manteve versões de mísseis Scud". O relatório declara que houve investimentos no sentido de expandir programas de foguetes após a saída dos inspetores de armas da ONU em 1998.
Duelfer advertiu que, em sua opinião, "Saddam claramente tencionava reconstituir os sistemas de foguete de longo alcance e que esses sistemas potencialmente eram para armas de destruição em massa".
O Iraque jamais conseguiu construir uma arma nuclear, e a ONU teve sucesso ao encerrar o programa clandestino no meio dos anos 90.
O documento afirma que "embora um número pequeno de velhos e abandonados produtos químicos tenha sido descoberto, o Grupo de Pesquisa do Iraque acredita que o país tenha destruído seu arsenal não declarado de armas químicas em 1991".
O relatório também revela que o Grupo de Pesquisa do Iraque liberou a informação de que o serviço de inteligência do país manteve, de 1991 a 2003, "um conjunto de laboratórios clandestinos para a pesquisa e o teste de venenos químicos". Mas o relatório acrescenta que "não há evidência de que cientistas estivessem produzindo armas químicas e biológicas nesses laboratórios".
Ele diz ainda que "as armas anteriores a 1991 escaparam da destruição em 1991 ou sofreram danos apenas parciais. Mais podem ser encontrados nos meses e anos futuros". Mas o relatório deixa claro que está se referindo apenas a quantidades irrisórias.
O relatório não conseguiu comprovar a existência de unidades móveis para a produção de armas biológicas. Mas Duelfer escreve que, "embora tenhamos feito um inquérito extensivo e tenhamos pouquíssima informação concreta, há ainda alguma possibilidade de que essa capacidade chegou a existir".

Petróleo por Comida
O programa Petróleo por Comida foi estabelecido pela ONU por motivos humanitários, para aliviar os efeitos das sanções da ONU sobre os iraquianos. O programa "ampliou as oportunidades de corrupção", diz o relatório. O Iraque foi autorizado a vender uma quantidade limitada de petróleo, em troca de medicamentos e alimentos. Mas comissões eram pagas a todo e qualquer intermediário designado pelo Iraque para vender seu combustível. "Saddam cobrava comissões ilegais de cada barril exportado", diz o texto.
Duelfer detalha a maneira pela qual, para manter o apoio entre os poderosos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, "o regime deposto garantiu a empresas chinesas, francesas e russas, a exemplo de outras de países simpáticos ao Iraque, fossem privilegiadas em contratos de petróleo".


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