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São Paulo, domingo, 07 de dezembro de 2003

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Instrumentistas ganhavam US$ 12

DA REPORTAGEM LOCAL

Hisham Sharaf foi o único músico da Sinfônica do Iraque a ser ferido durante a rápida e violenta guerra que derrubou Saddam.
Um míssil atingiu sua casa, em Bagdá, espatifou as vidraças e deixou uma de suas mãos incrustada de cacos de vidro.
Clarinetista, ele é também o diretor administrativo da orquestra. Sharaf disse à Folha que a turnê aos EUA é artística e não política. Eis os principais trechos da entrevista, feita sexta-feira por telefone em Amã (Jordânia). (JBN)

Folha - Quantos músicos estarão se apresentando nos EUA?
Hisham Sharaf -
Da orquestra propriamente dita, 52, mas teremos dez outros que tocam instrumentos tradicionais iraquianos.

Folha - As fotografias do primeiro concerto em Bagdá, após a queda de Saddam, mostravam a falta de muitos instrumentos.
Sharaf -
Em 27 de junho, quando a orquestra se apresentou pela primeira vez depois da queda do regime, continuávamos a sofrer os efeitos de desfalques ocorridos com as guerras e com o embargo comercial. Mesmo assim, estávamos com cinco violoncelos.

Folha - O sr. poderia quantificar esses desfalques?
Sharaf -
Nos anos 90 perdemos entre dez e 15 músicos, que emigraram para a Jordânia, para a Síria e para outros países.

Folha - O que aconteceu com Abdel Razzak al Azzawi, regente titular da orquestra, que de uma hora para outra sumiu?
Sharaf -
Três meses antes que eclodisse a guerra ele conseguiu deixar o país e se encontra agora na Suécia. Mohammed Amin Ezzat era o seu assistente e é ele que estará dirigindo a orquestra em Washington.

Folha - Como está hoje a remuneração dos músicos, já que, nos últimos anos de Saddam, o salário era aparentemente simbólico?
Sharaf -
Sempre estivemos ligados ao Ministério da Cultura. Nos últimos tempos de Saddam o salário de um músico era em pouco inferior a US$ 12 por mês. E era, mesmo assim, mais do que recebiam muitos funcionários públicos. Milhares deles, pelo câmbio da época, ganhavam apenas US$ 3 mensais. Agora estamos recebendo US$ 120. Não é ainda um salário definitivo. É uma ajuda de custo nesse período de transição.

Folha - Os músicos tinham outros empregos para sobreviver?
Sharaf -
Eu tinha quatro outros empregos: professor de matemática, professor de clarineta, músico de câmara e assistente do diretor da Academia de Música.

Folha - Jornais americanos disseram que houve uma discussão aguda entre os músicos sobre a oportunidade de participar de uma turnê ao país que ocupa militarmente o Iraque.
Sharaf -
Essa discussão não ocorreu dentro da orquestra. Muita gente de fora dela acreditava que a turnê seria inoportuna, sob a alegação de que tocar para o público americano equivaleria a tocar para o Exército desse país. Não estamos embarcando para Washington em missão política. Nossa orquestra existe desde 1959. Temos uma cultura interna anterior a Saddam e às guerras.

Folha - A orquestra já recebeu outros convites do exterior?
Sharaf -
Aceitamos o convite dos Estados Unidos e também aceitamos propostas do Dubai, para janeiro, e da Alemanha e Holanda, para fevereiro. Somos como qualquer orquestra que gosta de se apresentar no exterior.



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