São Paulo, quinta-feira, 08 de abril de 2004

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GUERRA SEM LIMITES

Tribunal considera que provas contra marroquino eram fracas; decisão irrita governo americano

Alemanha solta o único condenado pelo 11/9

CHRISTIN CHARISIUS
DA REUTERS, EM HAMBURGO

O único homem condenado por envolvimento nos ataques de 11 de setembro de 2001 contra os EUA foi libertado ontem da prisão, na Alemanha, com a perspectiva de ser inocentado num novo julgamento. A decisão irritou o governo americano e parentes das vítimas dos atentados.
O mesmo tribunal que, em 2003, havia sentenciado o marroquino Mounir El Motassadeq, 30, a 15 anos de prisão sob acusação de conspiração para realizar os atentados decidiu por sua libertação, por considerar fracas as provas que o haviam condenado.
Motassadeq saiu sorrindo da principal corte de Hamburgo, mas não deu declarações à imprensa. Ele foi levado embora num carro por quatro amigos que o aguardavam.
"O importante é que ele está livre e pode ficar com sua família", disse o advogado de Motassadeq, Josef Graessle-Muenscher, cujo cliente é casado e tem dois filhos. "Acho que vamos em direção a sua absolvição ou ao arquivamento do processo."
O caso de Motassadeq mostra as dificuldades que a guerra ao terrorismo enfrenta quando os acusados de participação em atentados são levados a tribunais comuns.
No mês passado, uma corte alemã de apelações cancelou a condenação do marroquino e ordenou um novo julgamento, em 16 de junho.
Segundo o tribunal, ele não teve um julgamento justo porque o governo dos EUA negou acesso a um amigo de Motassadeq, o iemenita Ramzi Binalshibh, que está sob custódia americana. Binalshibh seria o elo da Al Qaeda com a célula terrorista de Hamburgo, a que o marroquino foi acusado de pertencer e que teve papel central no 11 de Setembro.
A defesa alegou que Binalshibh podia testemunhar que Motassadeq não estava envolvido nos ataques ao Pentágono e ao World Trade Center.
A decisão judicial de ontem também levou em conta essa alegação, que, no mês passado, ajudou a libertar outro amigo de Motassadeq, o marroquino Abdelghani Mzoudi, também acusado de participar dos ataques.
A defesa de Motassadeq diz que a realização de um novo julgamento pode obrigar Washington a divulgar mais informações. "Acho que os EUA vão analisar o caso com cuidado. Eles precisam saber que a Alemanha não é Guantánamo. Precisam modificar sua tática", disse Graessle-Muenscher.
Um porta-voz do Departamento de Estado americano, Adam Ereli, disse que os EUA estão decepcionados com a libertação do marroquino. "Acreditamos que as provas contra ele são fortes e que ele é um elemento perigoso", declarou.
A decisão do tribunal enfureceu um porta-voz de parentes das vítimas dos atentados. "Não queremos que gente envolvida numa conspiração para matar nossos familiares saia livre", disse Stephen Push, cuja mulher estava no avião que atingiu o Pentágono. "Essas pessoas deveriam ficar na prisão."

"Elo vital"
Motassadeq também tinha sido considerado culpado de integrar célula terrorista de Hamburgo. A Promotoria o descrevera como o "elo vital" na conspiração do 11 de Setembro.
A corte de Hamburgo disse ontem que Motassadeq deixou de ser visto como "fortemente suspeito" de cumplicidade com homicídio, mas que ele ainda pode ter pertencido a uma organização terrorista.
O promotor Kay Nehm disse à Reuters que o fato de Motassadeq continuar sendo suspeito da segunda acusação significa que as chances de conseguir sua condenação continuam a ser boas.
"A questão agora é saber se, com sua participação no grupo, vamos poder comprovar que Motassadeq também ajudou a cometer homicídios", disse ele.
Os advogados de Motassadeq disseram que uma carta e um telefonema à Alemanha feito por outro suposto membro da célula de Hamburgo também vão ajudar em seus argumentos. Na correspondência, que veio à tona recentemente, Said Bahaji diz que os ataques surpreenderam tanto a Motassadeq quanto a ele.
Motassadeq insistiu não ter tido conhecimento prévio dos planos para o 11 de Setembro e afirma que não fez mais do que ajudar outros muçulmanos residentes no exterior, por exemplo pagando algumas de suas contas em sua ausência. Mas ele reconheceu que treinou num campo da Al Qaeda no Afeganistão.
Motassadeq não foi autorizado a deixar Hamburgo antes de seu novo julgamento e deverá apresentar-se regularmente à polícia. Seu passaporte foi confiscado e não lhe será devolvido.


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