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A MORTE DO PAPA
Tradição secular sepulta João Paulo 2º
Cerimônias que hoje marcam fim da era Karol Wojtyla exibem 700 anos de história e abrem período de espera pelo novo papa
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ROMA
Setecentos anos de história serão exibidos a partir das 10h de
hoje (5h em Brasília), quando começarão as cerimônias de sepultamento de Karol Wojtyla, cujo
corpo ficará a passos da inscrição
""Petrus hic est", que indica a sepultura de São Pedro, considerado o primeiro papa e, portanto,
portador de uma tradição muito
mais antiga, medida em milênios.
Mas cerimônias fúnebres que
duram nove dias foram estabelecidas pelo papa Gregório 10º
(1271-76). Antes, o papa era sepultado no mesmo dia da morte ou,
no máximo, no dia seguinte.
João Paulo 2º estará com a mesma roupa branca com o manto
vermelho, que, na tradição cristã,
rememora o martírio de Cristo.
Na cabeça, a mitra também
branca; ao peito, a cruz e o báculo
(de alumínio, que o papa passou a
usar faz cinco anos, por ser mais
leve, mais fácil de carregar).
O funeral é em latim, a "Missa
Poenitenzialis", a ser assistido por
cerca de 200 chefes de Estado ou
governo, entre eles Luiz Inácio
Lula da Silva, líderes religiosos,
Prêmios Nobel -como a guatemalteca Rigoberta Menchú e o ex-presidente Mikhail Gorbatchov- e outras autoridades.
O caixão ficará no átrio diante
da basílica e o público poderá
acompanhar todas as cerimônias,
previstas para durar quatro horas,
dos telões já instalados não só na
via Della Conciliazione, a principal via que leva à praça de São Pedro, mas também em diferentes
igrejas de Roma. Haverá telões até
na ala de embarque do aeroporto
internacional de Fiumicino.
Quem quiser comungar poderá
fazê-lo nas igrejas em que houver
telões. Depois da comunhão, o
cardeal Joseph Ratzinger, decano
do Colégio de Cardeais, lerá a "última recomendação e encomenda" da alma de Karol Wojtyla.
"Confiamos à suavíssima misericórdia de Deus a alma de nosso
papa João Paulo 2º, bispo da Igreja Católica, que confirmou os irmãos na fé da ressurreição", dirá.
Em seguida, o cardeal-vigário
de Roma, Camillo Ruini, lerá a
"Súplica da Igreja de Roma".
Terminada a missa, haverá o sepultamento na cripta da basílica
de São Pedro, na ala em que há 62
outros sepulcros, um deles deixado vazio pela transferência do
corpo do papa João 23 para as dependências em que ficam os santos e beatos (ele já foi beatificado).
Conforme o desejo do próprio
Wojtyla, seu caixão -tríplice caixa com uma de cipreste, posta em
uma de zinco e, por fim, em uma
de carvalho- será enterrado em
"terra nua". Significa que não haverá um mausoléu, mas só uma
lápide com a inscrição "Johannes
Paulus P. P. II", conforme relato
do jornalista Vittorio Zucconi, do
"La Repubblica", autorizado anteontem a visitar o local. O "P. P."
corresponde a papa pio.
Antes do funeral, o secretário
particular do papa, o arcebispo
polonês Stanislao Dziwisz, colocará um véu de seda branca sobre
o rosto de Karol Wojtyla.
O caixão conterá ainda duas
bolsas, uma com as medalhas de
prata e de bronze que foram cunhadas no pontificado do papa e
outra com uma breve biografia.
O camerlengo, cardeal Eduardo
Martínez Somalo, cuja função é
responder pela gerência da igreja
até a escolha do novo papa , pronunciará, então, uma oração em
que pede a "Deus onipresente e
eterno, Senhor da vida e da morte", que cuide da vida do "santo
padre João Paulo 2º".
O caixão do papa ficará em uma
abertura de 1m70 de profundidade, "perfeitamente retangular".
Na parede do fundo, "uma estupenda Nossa Senhora quatrocentista com a Criança e o anjo em
baixo-relevo", segundo Zucconi.
A capela em que ficará o túmulo
é ladeada pelas de duas mulheres:
Carlotta, rainha de Chipre, e Cristina, rainha dos Godos, Visigodos
e Suecos, que abdicou do luteranismo e se converteu ao catolicismo, o que lhe deu o direito de
ocupar a cripta do Vaticano.
Zucconi, admirador do papa,
fez questão de registrar que ele terá "duas mulheres a fazer de sentinelas, justo ele que foi acusado
de antifeminismo".
Encerra o sepultamento a reza
do pai-nosso pelo mestre das celebrações litúrgicas pontifícias, o
arcebispo Piero Marini. Depois,
fecha-se a lápide de mármore.
Mas não começa imediatamente uma nova era, e sim o período
de "Sede Vacante" ou o vazio no
trono de São Pedro. A capela Sistina, local em que os 116 cardeais
eleitores se trancarão até escolherem o novo papa, foi fechada ontem, para prepará-la para o voto.
Na manhã do dia 18, por volta
de 10h (5h em Brasília), os cardais
celebrarão a missa "Pro Eligendo
Papa". Depois do almoço, se encontrarão na capela Paulina, para
dali dirigir-se em solene procissão
à capela Sistina, invocando a presença do Criador e "a assistência
do Espírito Santo".
A primeira votação será na tarde do dia 18. Cada cardeal se aproxima da urna à frente do Juízo Final, o fantástico afresco de Michelangelo, com a cédula dobrada em
duas, o braço direito levantado
acima da cabeça e os olhos voltados para o Jesus da pintura.
Dirá então que chama "como
testemunha o Senhor, que me julgará", e completa: "Meu voto é
dado àquele que, segundo Deus,
acredito que deva ser eleito". O
nome não é pronunciado.
A partir do dia 19 (a menos que
o papa seja escolhido no dia 18),
serão duas votações de manhã e
outras duas à tarde. Após 30 votações, o colegiado pode optar por
eleger o papa por maioria simples. Ele pode ainda decidir que
concorrerão só os dois mais votados nas sessões anteriores.
Os votos são queimados na Sistina com soluções químicas que
tornam a fumaça negra, se não tiver o novo papa, ou branca, em
caso oposto. Nesse caso, tocam os
sinos de bronze da basílica de São
Pedro. E começa a nova era.
NA TV - Assista ao funeral do papa nas TVs Bandeirantes (a partir das 4h30) e Globo (a partir das 5h)
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