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ANÁLISE
Inclusão de árabes sunitas na cena política é o real desafio
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
O governo de transição iraquiano terá quatro tarefas vitais: a escolha do gabinete, a redação da
nova Constituição, a realização do
plebiscito sobre a adoção da Carta
e a organização de eleições. Ao
menos as três últimas serão obstáculos consideráveis a transpor.
Embora não seja decisiva, a escolha do gabinete é importante
porque a inclusão de um número
razoável de árabes sunitas poderá
atrair uma parte significativa dessa comunidade ao processo político, dando credibilidade à futura
Constituição. Afinal, mesmo sendo cerca de 20% da população, os
árabes sunitas só têm 17 das 275
cadeiras do Parlamento por conta
do boicote à eleição de janeiro.
A redação da Constituição será
o primeiro real problema que o
governo terá de resolver. Por ora,
árabes xiitas e curdos trabalham
em relativa harmonia para dar
alento ao processo político. Ao
menos uma questão deverá pôr
fim a esse quadro: o controle de
Kirkuk, que se situa na divisa entre o Curdistão iraquiano e o restante do país -região com potencial para produzir até 1 milhão
de barris de petróleo por dia em
condições normais de segurança.
Para os curdos, cujo líder Jalal
Talabani se tornou presidente,
governar Kirkuk é essencial, pois
isso significaria gerir -pelo menos em parte- as receitas auferidas com a venda de petróleo. Isso
seria crucial para sustentar a autonomia que eles planejam conquistar com a nova Constituição
graças à forte votação obtida em
janeiro. Esta lhes valeu o status de
segunda força política do Iraque.
Embora estejam cientes dessa
aspiração curda, os árabes xiitas
não pretendem abrir mão do controle de Kirkuk pelo governo central, visto que, para eles, a cidade
"não faz parte do Curdistão iraquiano e não pode ser a capital de
uma região autônoma curda".
Ironicamente, a população local é
majoritariamente árabe-sunita.
O plebiscito também será uma
dura batalha para o governo. Sub-representados na Assembléia, os
árabes sunitas sabem que, se a
Carta lhes for desfavorável, poderão fazer campanha contra sua
adoção. Vale lembrar que, segundo as leis atuais, a futura Constituição não será aprovada se for rejeitada em ao menos 3 das 18 Províncias iraquianas e que os árabes
sunitas são majoritários em quatro delas, além de terem representação significativa numa quinta.
Finalmente, mesmo se a Carta
for adotada, nada garante que
uma parcela significativa da comunidade árabe-sunita não boicotará as eleições que deverão
ocorrer em dezembro. No caso,
ela ficaria sub-representada de
novo, o que abriria caminho para
mais violência e divisões sectárias.
Assim, é preciso ressaltar que a
inserção dos árabes sunitas na cena política iraquiana é imprescindível. Afinal, não haverá nem um
arremedo de sistema político democrático ou de paz no Iraque se
essa comunidade não participar
do processo. Trata-se, portanto,
do real desafio para o talento político dos novos dirigentes do país.
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